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Camellia -Crimson Line-

3 participantes

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Camellia -Crimson Line- Empty Camellia -Crimson Line-

Mensagem por Talita Qui Jan 19, 2012 7:02 pm

Camellia -Crimson Line- Metade2
Nome da fanfic: Camellia -Crimson Line- (Volume 01)
Classificação: +14
Tipo: Terror, Suspense, Fantasia, Romance
Restrições: Nenhuma
Resumo: Camellia Victoire é uma garota "aparentemente" normal. Tem dois pais vivos, uma casa para morar e, principalmente, muito dinheiro. Mas nem esse último item a deixa ser, digamos, popular na escola. O fato é que ela não é muito "normal". Além de ter as maiores notas da escola, é muito branca - quase transparente, na realidade -, os seus olhos são escarlates e seus cabelos de igual cor - carmesim. Camellia não é muito sociável com as pessoas, acima de tudo. Para ela, não importa se tem amigos ou não, se está sozinha ou não.
Não é só isso - ela não tem algo que os humanos chamam de "sentimentos". Amor, ódio, felicidade ou tristeza. Ela simplesmente não consegue sentí-los. Mas, é claro, sempre manteve isso em segredo, tentando descobrir quem realmente é. Porém, em um dia de inverno, seus pais são cruelmente assassinados e, como não tem emoções, não consegue demonstrar "tristeza", por isso é culpada do crime, o que a leva a abandonar sua vida "ordinária" e tentar uma nova vida na vila em que nasceu, Santiago, uma pequena ilha localizada no meio do Pacífico - que não consta no mapa.
Será que Camellia poderá descobrir qual a verdade por trás da mentira - e finalmente encarar o seu destino?
Talita
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Camellia -Crimson Line- Empty Prólogo

Mensagem por Talita Qui Jan 19, 2012 7:02 pm

Tudo o que sobe, um dia tem que cair. Porém, quanto mais alto estiver, maior será a queda e o impacto.
Por isso, eu sempre me mantenho embaixo, para evitar cair. Assim, não me machuco. Aliás, aqui o chão é mais largo, então não me preocupo com movimentos bruscos.
De um jeito ou outro, devagar se vai ao longe. Subindo pouquinho por pouquinho, conseguirei chegar ao topo. E quando chegar, não haverá mais tempo para cair.

O dia que mudou minha vida - o dia em que morri.
Mas acontece que ninguém notou. Ninguém sentiu minha falta.
Ah, e se eu cair? Quem irá... me ajudar a levantar?

O largo chão agora é uma pequena faixa. Não há nada ao redor, a não ser escuridão. Sombras. Tristeza. Dor. Solidão.

As memórias esquecidas agora vêm a tona. Os sonhos perdidos se tornam pesadelos e nos assombram.
Qual o seu passado? Você se lembra?
Não? Você quer se lembrar?
Tem certeza?
Você realmente quer voltar ao passado?
Pois bem. Te contarei uma história. Talvez um terrível conto, ou talvez uma bela comédia. Não sei, o que acha?
Ouça - mas somente isso. Ou se arrependerá.

Era uma vez, no mundo onde o passado e o futuro se encontram. Onde não há verdade ou mentira, não há vida ou morte. Mas há dor. Há tristeza. Há escuridão.
Sim, o mundo em que estou agora. Aprisionada.
Isso é um aviso. Não faça o mesmo que eu. Nunca, em hipótese alguma, vá atrás da verdade. Ou tente passar pela mentira.
A mentira é uma barreira fortíssima. É uma maldição que - como tudo no mundo - um dia acaba ou se desfaz. Nada pode atravessá-la. Só resta esperar. O que há de sobra, pelo menos para mim - não posso dizer o mesmo para meros mortais -, é o tempo.

Não se renda aos seus pecados. Cumpra suas promessas. Tenha coragem.
A vida é ligada por uma frágil linha carmesim chamada "Destino". É uma ligação tão pequena e delicada que, com um movimento brusco, pode arrebentar facilmente. Tenha cuidado para não ser pego ou acorrentado por ela - como eu fui.

Suba esta grande escada com um passo de cada vez. Não tenha pressa. Porque, se cair, terá que subir novamente, ou poderá acabar num abismo.
Tome cuidado. Eu cai várias e várias vezes. Esta é a última. Eu vejo o poço, o beco sem saída. Não há mais volta - é tão fundo que não poderei subir.
Mas, meu querido, eu te deixo essa missão: me salve. Tire-me desse desespero.

Morte - o que há após ela?
Morte - por que há tanto mistério ao seu redor?
Morte - quem és tu?
Morte - algo que persegue a humanidade desde o início do mundo.
Guiando os seres - todos eles - para um beco sem saída, para um poço sem fim. Para o abismo do desespero - o medo que acerca a todos.
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Camellia -Crimson Line- Empty Capítulo 01 - Entre o fim e um novo começo

Mensagem por Talita Qui Jan 19, 2012 7:03 pm

Aqui estou eu - com minha melhor roupa -, em frente ao meu pesadelo.
Já se fazem alguns anos desde que entrei nesta escola, New York High School. Um colégio bem no subúrbio de Nova Iorque. Eu, como moro aqui perto, sempre venho de bicicleta estudar, observando os carrões de dar inveja.
Continuando, talvez eu seja a mais impopular neste lugar.

Vou começar me apresentando. Sou Camellia Victoire, tenho 15 anos e estou no primeiro colegial. As pessoas me chamam de "estranha" pelo fato de ter olhos vermelhos e cabelos de mesma cor, e eu ser muito, mas muito branca - sou albina, prazer -, e ter um estilo meio gótico.
Sempre, em toda a minha vida, as pessoas nunca chegavam perto de mim e me ignoravam. Quando podem, me batiam ou me humilhavam.
Por isso, quero mudar. E pretendo mudar. Hoje, eu me livrei desse estilo gótico que tinha. Parada, em frente a escola, aqui estou eu, com minha mini-saia rosada, uma blusa de gola em V branca, sapatilhas pretas e uma meia sete-oitavos creme. Comprei, há alguns dias atrás, uma lente de contato azul escuro, para cobrir minha vermelhidão dos olhos. Os cabelos, contudo, deixei da mesma cor, por falta de coragem de tintar meu - admito - lindo cabelo ruivo.
Dei meu primeiro passo rumo à solidão - e, muito provavelmente, humilhação. Logo no meu primeiro passo dentro desta velha construção, cercada de alucinógenas janelas e portas - sim, com fractais desenhados, o pior que possa pensar. Acontece que, a única coisa que quero no momento, é voltar para casa. Não, sair deste inferno de lugar e começar uma nova vida no centro de uma cidade grande, com muitos amigos, festas, e tudo mais.
Voltando ao ponto de partida - dei meu primeiro passo dentro do colégio. No mesmo momento, todos olharam para mim, como se pensassem "Quem é essa idiota?", "Outra pessoa para humilhar" ou até "Mais gente para matar! Eba!", e então começaram a cochichar. Passei direto, sem nem querer me importar ou observar estas pessoas.
Me destinei diretamente à sala que iria estudar meu primeiro turno, matemática. Era uma nova sala, novos alunos, novo professor. Aliás, estou rezando para que o professor seja outro. O meu antigo, quando não dormia no meio da "explicação", começava a cutucar o nariz e falar coisas meio, err... Loucas.
Mas, bem isso não importa.
Sentei-me na terceira carteira da quinta fileira - sendo que, no total, há 7 fileiras de 6 carteiras cada, totalizando o limite de 42 alunos. Já que são apenas 3 salas para cada ano do ensino médio, normalmente todas as carteiras são preenchidas. Nós alternamos entre elas para mudarmos o horário das aulas, o que muitas vezes acaba causando confusão. Foi então que uma garota veio até mim.
- Oi - disse ela. Sentou na carteira do meu lado e começou a me encarar.
Realmente me assustei, era a única na sala. Acho que estava tão perdida nos pensamentos que não há vi lá ou, se não estava, não há vi entrar.
- Olá. - cumprimentei-a. Não com um aperto de mão, ficamos somente nos encarando. Sempre fui acostumada a ser mais formal, então acabei dizendo "olá", e não "oi", como pessoas normais diriam. - Sou Camellia Victoire, prazer.
- Ah, não precisa ser tão culta, Camellia. Posso de chamar de Cam? - ela parou, reparando que não tinha se apresentado. - Desculpa, não falei meu nome. Sou Allison Madline. Só não repara no sobrenome.
Comecei a rir. Tipo, rir muito alto. Madline. Linha da loucura. Ela bem que parece ser bem louca - só espero que não tenho se confundido com o nome Madeline - afinal, quem esquece de falar seu próprio nome?
- Anh, chega de rir! Eu sei que sou desajeitada, mas pára! - reclamou.
- Certo, certo - falei num tom apreensivo. Mas, ah, que felicidade! Minha primeira amiga. Quer dizer, colega que me suporta. Acabamos de começar a conversar. Mas já é um avanço. As pessoas, quando nem paravam para olhar para minha cara, me humilhavam sem falar nem "oi" nem "tchau". - Mas, bem, é nova aqui?
- Sou. Entrei esse ano. Me mudei para cá semana passada, então não conheço nada aqui. Tem algo que deveria saber?
- Tem. Primeiro, nunca fale com Mellissa Ricchezza. Ela é uma vadia, nem tente falar com ela. Vai estragar sua vida. Principalmente se ela te ver falando comigo.
- Por quê, com você?
- Err, bem... Ela não gosta muito de mim. Tudo começou quando cheguei nessa escola, ela olhou para minha cara e disse: "Vou ferrar com a sua vida, monstra". - e foi assim que Mellissa decidiu acabar com minha vida e, sinceramente, conseguiu.
- Só por isso? Cara, que idiota. Odeio pessoas assim. Me pergunto por que ela te chamou de monstra.
- É uma longa história.
- Hum, certo, então depois você me conta. Quando tivermos mais tempo, o professor já chegou. Que tal no almoço? - me virei para a porta e dei de cara com o professor. Era um homem bonito. Gato. Cabelos loiros e olhos azul-céu. E, como todo cara bonito nesta escola, rodeado de vadias.
- Ah. O professor. Ele é outro. - murmurei.
- O que disse? - ela perguntou, sem ouvir o que falei.
- Nada. É só que o professor mudou.

Aquela aula, mesmo sendo só 50 minutos, pareceram um dia. Uma eternidade. E ainda tinha mais cinco aulas pela frente. A próxima era de química.
- Allison. Que aula tem agora? - perguntei.
- Hmm, deixa eu ver... - olhou para o papel dos horários com indignação. - Inglês, na sala 304, alí do lado. E você?
- Química. Não sei se você sabe, Allison, mas...
- Alli. Pode me chamar de Alli. - ela me cortou.
- Certo, Alli. Temos um intervalo de 5 minutos entre todas as aulas. O horário do almoço é meio-dia e quarenta e cinco. Termina às duas. Nos vemos no pátio, não sei se teremos outra aula juntas.
- Claro. Vamos indo, ou iremos nos atrasar.

O laboratório de química é, diferentemente das outras salas, dividido em 3 fileiras de 4 duplas. Vinte e quatro alunos por sala. Podemos escolher nossos lugares, então sentei logo na última do lado da porta. Coloquei meus fones de ouvido, para não ouvir aquela aula maçante. Antes, sempre colocava meu capuz, mas esqueci por um momento que vim sem o meu casaco. Liguei o meu celular no último volume deitei minha cabeça na carteira, para esconder o fone.
Estava ansiosa para saber quem iria sentar do meu lado. Em algum tempo, todos - pelo menos, acho eu - entraram e a sala se encheu. Todos os lugares estavam ocupados, menos o do meu lado.
Já tinham se passado mais ou menos 15 minutos da aula quando um atrasado abriu a porta com tudo, assustando a todos. Fez Mellissa - que, por azar, estava na mesma sala do que eu, mas acho que estava tão diferente que ela nem me reconheceu, ou talvez nem quis implicar comigo - pular de susto. Quem tinha aberto a porta não era ninguém mais do que Richard Chalford, namorado de Mellissa. Como só tinha uma escolha, sentou do meu lado. Eu me afastei.
O que me surpreendeu foi que ele começou a conversar comigo.
- Não me diga que você é Camellia.
- Sim, sou eu. Quem mais seria?
- Caramba, você "tá" diferente. Está uma gata.
- Ah, obrigada.
- Sério. O que aconteceu com os seus olhos?
- São lentes.
- Por que não fez isso antes? Aí Mel teria parado de implicar com você.
- Ela não me deu uma chance. E, sendo a mais popular da escola, ninguém me deu uma.
- Hmm. Só o seu cabelo que não mudou.
- E deveria mudar?
- Não, não. Ele é bonito. Eu gosto. Ruivo.
- Está pretendendo trair Mellissa?
- Haha. Pensei que soubesse. Eu e Mel tivemos uma briga daquelas e terminamos.
- Bom para vocês. Ou melhor, para você. Ela não presta. Será que foi só agora que percebeu isso? - ele começou a rir. E, para não ser seu graça, dei um meio sorriso. Não um convincente, mas foi um.
- Demorei um pouco, mas consegui. Você mudou e muito, "sra. Victoire" - essa entonação dessas últimas palavras foi divertida, brincalhona.
- Cam. Por favor, Cam. E o que aconteceu com a Mellissa?
- Ahn, foi algo meio pessoal. Apesar de toda a escola saber sobre isso, com exceção de você.
- Haha. Boa piada.
- Obrigado.
E passamos a conversar o resto do horário.
O que eram 50 minutos pareceram segundos e logo a aula acabou. Agora, tenho aula de educação física e preciso descer dois andares para chegar à quadra. Que, por sua vez, é do tamanho de uma quadra de vôlei. Ou seja, muito pequena. Mais um motivo que me faz odiar essa matéria. Aliás, não deveria se chamar "matéria". Educação física não deveria fazer parte do currículo e muito menos ser obrigatório. E sim, algo que só se faz se quiser.
Foi na hora em que sentei na arquibancada que Mellissa Ricchezza veio falar comigo - uma curiosidade: Ricchezza significa "riqueza" do italiano.
- Ei aí, monstra?
Engoli em seco e me mantive em silêncio. Percebendo minha ignorância, ela começou a apelar.
- Ah, Cam. Flertando com o meu namorado, é? Só pode ser uma vadia, mesmo.
- Desculpa, mas não sou sua mãe - retruquei. - E nem você, aliás.
Ela não hesitou em dar um soco na minha cara. Ótimo, começou. Estava demorando. - Sabe com quem está falando?
- Sei. Mellissa Ricchezza. Pelo menos, é até a tarde.
Todos no local começaram a uivar, pelo fora que dei nela. "Mel" não demorou para me socar, e depois me espancar completamente. Foram alguns segundos até o breu surgir e eu acordar na enfermaria. Só teve uma única palavra que pude ouvir, no meio de tantas.
- Fraca.

Abri meus olhos, saindo da escuridão. "Ótimo", pensei. Meu dia só tinha acabado de começar e já fui espancada. Minha esperança de ser feliz na escola, Allison, e talvez Richard, provavelmente não falariam comigo de novo. Mas mantive a esperança.

Depois de uma longa conversa com a diretora e a enfermeira, e um bom tempo segurando um gelo na minha cara, que queimava a minha pele, resolvi matar o resto do dia e ir para casa depois do almoço. Sempre temos mais aulas depois deste, normalmente uma ou duas, algumas - raras - vezes três.
Tenho quase uma hora até o almoço, para finalmente encontrar Allison e depois finalmente ir para casa. Não realmente para casa. Odeio aquele lugar. Por isso, quando pulo as aulas sempre vou para um parque lá perto. Me divirto vendo os pássaros, crianças brincando, lembrando do passado. Que, quando paro para pensar, nunca lembro totalmente. São poucas as coisas que lembro.
E foi o que fiz. Cheguei no parque e sentei nos bancos de sempre. Todos lá me conhecem. Tem uma garota - Lucy -, uma menininha que me faz sorrir. Ou chorar. Será que, quando pequena, eu era tão inocente e fofinha assim? Quando penso nisso, relaxo. Me sinto bem, de alguma forma.
Só que terei dó desta menina, quando ela se tornar mulher. Está sempre sozinha, como eu. Ninguém a nota ou conversa com ela, como eu. E ela está sempre lá. Como se tivesse algo com aquele lugar. Algo inexplicável, que a faz ser assim. Será?
As horas parecem ser segundos quando nos divertimos. Quando olhei no meu relógio, me espantei por já ser meio dia e meia. Fui correndo para o colégio.

Cheguei no pátio dois minutos antes do sinal para o almoço ressoar por toda escola.
Allison veio correndo, sozinha, em minha direção, quando me viu. Pegamos nossa bandeja e fomos para onde serviam aquelas comidas nojentas que só faltavam andar.
- Mas, e ai? Me conta. Sabe, aquela história da Mellissa. Temos tempo e de sobra agora.
- Hmm... Agora não. Quando sentarmos. Mas como foi o primeiro dia, Alli? - parei para receber no prato um pouco de arroz e feijão.
- Metade dele, quer dizer? - ela riu. Pegamos a sobremesa que queríamos e fomos para a mesa. - Bem. E o que houve? Era para ficarmos na mesma sala de física, mas por que não apareceu lá?
- Aconteceram algumas coisas. Que sempre acontecem. É isso o que vou te falar. - sentei na cadeira da ponta. A mesa que sentamos tem quatro lugares, ou seja, vamos dividir com alguém mais.
Alli sentou do meu lado. - E o que é?
- Bem, desde que entrei nesta escola, Mellissa não para de me provocar. Ela só olhou uma vez na minha cara. E desde então tem me importunado. Hoje mesmo, ela foi discutir comigo. Eu respondi, acabei saindo com um olho roxo e alguns minutos na enfermaria. Foi isso. - recebi um olhar chateado. - Sério! Foi porque eu conversei com o seu ex-namorado na aula de química.
- Mas por que ela faz isso?
- Err, bem... Não importa. Sério. Nada é por nada.
- Não acho que uma pessoa espancaria outra até deixá-la inconsciente por nada.
- Não gosto de falar sobre esse assunto.
E ficamos o resto do almoço em silêncio.
Acabei de comer e fui levar os restos para o lixo.
- Desculpa. - Allison tocou no assunto.
- Não foi nada. Eu vou para casa agora.
- Tudo bem. Mas você me desculpa?
- Sim, claro. Agora, adeus.
- Tchau.
Me despedi usando "adeus", como se esse fosse o último dia em que a veria. Para todo o sempre. Mas, talvez? Quem sabe o que poderia acontecer.

Peguei a chave e destranquei a porta de casa. Nem cheguei a abrí-la e pude ouvir gritos. Eram os meus pais brigando de novo. Entrei.
- Cheguei. - avisei para o nada. Mesmo que diga isso todos os dias, as pessoas que chamo de pais nunca se importam. Mas dessa fez foi diferente.
- Se arrume. Vamos todos nós para uma visita ao colégio. - meu pai.
- Por quê?
- Pensamos que as aulas iam até às quatro. E soubemos que acabou por se envolver numa briga. - foi a vez da minha mãe. - Vamos. Agora.
Não tive escolha a não ser dar meia volta e ir em direção ao carro da família. O único da casa. Abri a porta e sentei no banco de passageiro. Meu pai iria dirigir.
Saimos da garagem e tomamos a estrada. Certo, não estrada. Uma ruela. E também não via o porquê dos meus pais pegarem o carro para algo que poderia ser feito em meia hora a pé - cinco minutos de carro.
- Quando você vai mudar, Camellia? - minha mãe começou com a conversa de sempre. - Não é a primeira vez. O que aconteceu?
- Eu não fiz nada. Ela que chegou me socando.
- As pessoas não fazem isso por nada, filha - meu pai chegou na mesma conclusão do que Allison.
- Foi o que sempre pensei. Até conhecer essa garota, Mellissa.
- Você não está entendendo...
- É você quem não está - cortei minha mãe. - Você não me entende! É sempre assim! Vocês não podem ser chamados de pais! Eu odeio isso! Odeio vocês!
Meu pai se virou para me dar um tapa. Só que ele se esqueceu de algo: ele estava dirigindo. Estava. Porque logo batemos num muro a 110km/h. Algo rápido demais para um subúrbio. Que não estava adaptado para essa velocidade. E o muro caiu em cima de nós.
E eu só vi o sangue escorrendo do banco da frente. Junto com o cheiro da morte.
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Camellia -Crimson Line- Empty Capítulo 02 - Até que a morte nos separe

Mensagem por Talita Qui Jan 19, 2012 7:03 pm

Apesar da enorme vontade, não consegui gritar. A única coisa que fiz foi ficar encarando a cena. Mal reparei que minhas pernas estavam quebradas e minha cabeça estava jorrando sangue.
Não estava pensando. Olhei para mim mesma. Vi o meu estado. Imagine um zumbi sem os braços, com metade do cérebro aparecendo, o torso perfurado e as pernas quebradas. Mas que, por algum motivo muito estranho, consegue se mover como uma pessoa sadia desfrutando do seu dia.
Pois então, esta sou eu no momento.
Que tipo de monstro eu sou? Era para estar morta! Por que eu não morri?
Não como se quisesse morrer. Mas também não quero viver. Odeio viver neste inferno.
Abri a porta do carro, que estava emperrada. Porém, eu consegui abrir com a maior facilidade. Corri. Corri o mais rápido que pude. Não procurei ajuda. Estou num subúrbio, ninguém passa nas ruas. Estes seres desprezíveis já estão mortos mesmo.
Fui em direção a minha casa. Peguei a chave, destranquei a porta e a abri correndo. Subi as escadas e corri para o meu quarto. Fechei a porta e olhei o espelho, que ficava nesta, na parte de trás.
Vi algo horrível. Os ossos da minha perna, que antes estavam apenas quebrados, agora saiam da minha pele. Eca. Que nojo. Fratura exposta. Estava sem uma parte do meu braço esquerdo. Meu torso estava perfurado por uma parte do carro. Só que acontece que isso é o que via. O que o espelho mostrava era diferente. Era “eu” totalmente normal. Viva. Sadia.
Toquei minha cabeça e senti parte do meu cérebro. No espelho, estava tocando meus cabelos ruivos, e minhas lentes azuis tinham sumido.
Minha roupa estava arrumada, o sangue que pensei ter vomitado quando fui perfurada tinha desaparecido.
O que diabos? O que diabos aconteceu comigo? Como um mero muro pode fazer tudo isso? Matar meus pais, acabar comigo e, principalmente... Me fazer parecer diferente no espelho.
Fiquei alguns minutos – que pareceram segundos, como sempre – na frente do espelho. Avoada. Se estiver sonhando, desejo acordar deste pesadelo. Não que algo fosse melhorar ou mudar, mas pelo menos deixava a agonia – mais aflição, na verdade, já que naquela altura não estava sentindo dor alguma – e levaria uma vida praticamente normal. Se isso fosse realidade... Bem, não há jeito disto ser realidade. Se estiver morta, me pergunto se isso é o inferno. Porque tenho certeza de que isso não é o paraíso.
Aliás, nunca acreditei nesse negócio de Deus; para mim não há como um ser que se diz “superior” criar tudo o que há neste universo, ser tão injusto para dar tudo para alguns e nada para outros. Se realmente existir, não ligo; se não existir, não fará diferença. Simples assim.
Me joguei na cama. Se o espelho mostra o que é real, então estou alucinando. O sangue não sujará minha cama; os machucados não doerão – o que já é verdade. Fechei meus olhos, desejando acordar. Abri-os. O que parecia ser um sonho desapareceu; a imagem do acidente sumiu do meu ponto de vista. Levantei e fui à frente do espelho novamente.
Me espantei em notar que a imagem refletida permanecia a mesma; porém o que estava refletindo era diferente. É como se me curasse de repente de um acidente que devia ter me matado. Bem, supostamente foi isso. Só que aconteceu num sonho.
Abri a porta e desci as escadas, procurando os meus pais. Sim, aqueles que odeio. Se isso foi um sonho, então não me lembro de ter dormido, e os meus pais ainda estavam vivos. É só uma prova. Nada mais.
Prefiro não pensar na possibilidade de ter desmaiado com o acidente e dormido, pois então eles estariam mortos. Vou ser positiva. Ou tentar. Já é um começo.
Fui até a cozinha. Passei pelo banheiro, a suíte principal, a sala de jantar e estar. Fui até a varanda. Depois segui até a lavanderia. Até o porão. Nada. Passei por todos os cômodos da casa. Talvez estivessem trabalhando.
Decidir ir até o local do “acidente”. Se não foi um sonho e realmente aconteceu, então o carro ainda deve estar lá.
Peguei minha bicicleta e segui alguns metros a frente da casa, onde supostamente havíamos batido.
Pedalei o mais rápido o possível. Rápido o bastante para tombar na virada da rua. Ah, ótimo. Esfolei os meus dois joelhos. Droga. Agora não consigo mais pedalar.
Desisti de tentar e deixei minha bicicleta ali mesmo. Fui andando. Eram só alguns metros, nada de mais.
Percebi que todos olham para mim, assustados. Todos. Até mesmo meus vizinhos que, apesar de eu não conversar muito com eles, meus pais adoravam.
Depois de muito esforço para correr com aquele joelho ralado, finalmente cheguei ao carro. Ele está do contrário, coberto com tijolos. O sangue escorre. A morte está impregnada em todo lugar.
Me ajoelhei e cobri meu rosto com minhas mãos. Minha perna estava tão trêmula que nem consegui me manter de pé.
Mesmo eu os odiando... Eles eram os meus pais. Pessoas que, normalmente, você ama. Amor... Algo desconhecido para mim. Mas, por um momento, eu o senti. Eu senti o amor que meus pais me davam e não recebiam de volta. Eu senti medo. Tristeza. Arrependimento. E o mais triste disso é saber que não se pode fazer nada a respeito. Só aceitar a verdade. Aceitar o passado e o futuro. Pois nós não podemos muda-los.
Por toda a minha vida... Eu sempre pensei que não houvesse porque amar e ser amado; dar e receber. Isso nunca fez sentido para mim. Quantas coisas eu já não dei – e não recebi nada em troca?
Deve ter sido por isso que desisti de sentir as coisas. Sim, Mellissa está certa. Eu sou uma fraca que só consegue desistir de tudo. E foi por eu ter desistido que o vazio tomou conta de mim. Acho eu.
Mas é impossível não sentir nada. Os sentimentos são humanos, e todos os têm. Não somente os seres humanos, mas também os animais. Tenho certeza disso. E talvez seja por isso que sou estranha. Eu simplesmente não consigo sentir.
Porém, mesmo assim, é triste. Mesmo não conseguindo sentir a tristeza, é triste. É triste olhar para o seu interior e perceber o vazio. É tão... estranho e amedrontador que dá vontade de chorar. Aí, eu me lembro que simplesmente não posso chorar.
Isso sempre me tortura.
E, quando estava perdida nestes pensamentos estranhos e insanos, um policial chegou por trás de mim.
- A senhorita é Camellia Victoire? – questionou.
- Sim, sou eu.
Foi o tempo de eu responder e me perguntar o que estava acontecendo. Tempo o suficiente. Esse homem pegou suas algemas e prendeu minhas mãos. Eu o olhei, confusa.
- O quê...?
- Camellia Victoire, você está presa. – disse ele. – Tem o direito de permanecer calada. Tudo o que disser pode ser usado contra você no tribunal.
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Camellia -Crimson Line- Empty Capítulo 03 - A frágil linha da justiça

Mensagem por Talita Qui Jan 19, 2012 7:04 pm

- Quando foi a última vez em que viu os seus pais? – um dos policiais perguntou. – Você foi vista no mesmo lugar do “acidente”, correndo.
É comum haver dois policiais: um fazendo o papel do advogado do diabo – aquele que normalmente é ruim com você e te faz perguntas bizarras, e se não responde, ganha um belo soco ou é humilhado – e outro o Promotor da Fé – que usa argumentos a seu favor. Ambos foram usados primeiramente pela Igreja, e depois foi usado em qualquer caso policial. Não me pergunte como sei disso.
Pelo o que parecia, esse policial que me perguntou é o tal Advogado do Diabo. Ah, meu. Então, isso aqui realmente é o inferno? Eu na verdade morri e não sei?
- Sim. Eu estava no carro, junto com eles. – abaixei a cabeça.
- Certo. Me pergunto como não morreu, já que todo o carro foi destruído. – esse mesmo policial me encarou da cabeça aos pés, me examinando. – E, pelo o que parece, está sem nenhum arranhão. É meio impossível, não?
- Mas eu estava. Nós íamos para o colégio onde estudo para conversar com a diretora.
- E alguém consegue provar isso?
Fiquei em silêncio. Não. Ninguém pode provar. Ótimo. Estou mais ferrada ainda.
- Não, ninguém, senhor.
- Como pensava. – parou para chegar a outro assunto. Pensou bastante. Para saber como destruir a minha “vida” mais ainda. Passou algum tempo. Tipo, uns dois minutos. Até que ele falou algo. – E é meio estranho, não acha? Quero dizer, os seus pais morreram. Não parece que caiu uma única lágrima dos seus olhos.
- Ah. O carro. Olhem o carro. Deve ter alguma prova que estava lá. – me lembrei dos meus fones de ouvido que deixei quando sai correndo. – Os meus fones de ouvido. Eu sempre os levo para a escola. Estava ouvindo hoje, na aula de química. Pode perguntar para Richard Chalford, que estava do meu lado. Acontece que, quando saí correndo, com medo, depois do acidente, os deixei no carro.
- Está falando destes? – ele pegou um saquinho plástico com meus fones dentro.
- Sim, são eles.
- Eles foram encontrados no banco de trás. Estão meio quebrados, como pode ver. Então, acho que não será de nenhuma utilidade. – nesta parte, ele está com razão. Estão tão quebrados que não servem para mais nada. – Acho que não se importaria de eu ficar com eles, não é?
- Não, pode jogá-los fora, depois.
O policial – ou detetive, como quiser chamar – saiu. O outro permaneceu.
- Você será presa, provavelmente. Mas não ainda. Então, procure ficar por perto, ou em algum lugar onde possa ser encontrada. – ele me disse e depois se levantou para sair.
- Espere! – ele parou, ainda na porta. – Não podem me acusar sem provas!
- E o que pode fazer?
- Eu quero um advogado. É o meu direito, e eu o exijo! Agora!
- Você sabe quem é o nosso chefe, garota?
Eu parei. Não, não sei. Foi o que senti vontade de falar. Mas não consegui. As palavras já não saem mais da minha boca. É como se... não houvesse ar para transportar minhas palavras.
- Pois então, ele se chama Erik Ricchezza. Pai de Mellissa Ricchezza. Acho que a conhece, e muito bem, não é? – me espantei. Arregalei os olhos por alguns segundos. Pensei que meu coração tinha parado de bater, mais logo percebi que estava batendo, e até mais forte. – Nós fazemos o que ele quiser. Sendo justo ou não.
Parece que o mundo já não é mais tão simples. Na verdade, nunca foi e nunca será. O que falta é as pessoas perceberem isso.
Posso ter apenas quinze anos. Posso ser apenas uma aluna qualquer. Mas já perdi meus pais, tenho uma irmã natimorta e meu ex-namorado morreu num acidente de carro. Prefiro não pensar sobre isso.
Como dizem, “seja a mudança que você deseja ver no mundo.” Então, eu irei mudar este mundo cruel e injusto, com minhas próprias mãos.
Farei a minha parte. Pois só vivemos na mentira quando não aceitamos a verdade. E não quero isso. Quero que todos enxerguem a verdade, e percebam que podem muda-la.
Me levantei da cadeira e segui o policial até a saída do prédio. Desci as escadas que me levaram da portaria até a calçada.
Reparei que estava na Avenida Snyder, Brooklyn. O bairro onde morro. Brooklyn. Andei alguns quarteirões e entrei na rua 34, da minha casa.
Como de costume, peguei o jornal da caixa de correio. Junto, tinham duas cartas. Uma delas, do colégio para mim. Outra, que não prestei muita atenção. Deixei-as de lado.
Abri o jornal e me assustei com a manchete principal.

“Jovem estudante da New York High School é presa, acusada de matar os seus pais.”
A notícia do acidente que chocou a todos ainda nesta tarde.

Amassei o jornal e o joguei no lixo.
Peguei a primeira carta, enviada para mim.
“Prezada aluna Camellia Victoire.
Provavelmente todos nesta pequena parte do bairro já sabem do acontecido. É algo totalmente inaceitável uma aluna ter matado os próprios pais.
Por causa deste fato, você será suspensa durante uma semana, começando por depois de amanhã.

Sinceramente,
Direção do colégio New York High School.”

Certo. Algo que não faz sentido. Me pergunto como irei encarar o colégio inteiro amanhã. Culpada por algo que não fiz.
Fui abrir a outra carta e percebi o remetente: meus pais.
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Camellia -Crimson Line- Empty Capítulo 04 - Não existem coincidências nesse mundo

Mensagem por Talita Qui Jan 19, 2012 7:05 pm

Caminhei pelos longos e estreitos corredores do colégio New York High School.
Percebi os olhares com que todos estavam me observando. “Assassina”, dava para ver nos seus olhos.
Desde pequena, tenho um certo dom. Sempre que olho diretamente nos olhos de outra pessoa, profundamente, consigo ver o que ela pensa, sente ou vê. Não sei explicar direito.
Mas acontece que é exatamente isso o que está acontecendo. E não preciso ver profundamente para notar.
Apressei o passo, e me destinei à sala 310, onde teria aula de história. Assim como na sala onde tenho aula de matemática, provavelmente todos sentariam no mesmo lugar, já que a sala é a mesma.
Ótimo. Agora, como irei encarar a minha mais nova amiga, Allison, ou o cara-que-supostamente-está-dando-em-cima-de-mim, Richard?
Parei na frente da porta da sala. Estava quase dando meia volta para matar as aulas de hoje quando uma mão tocou o meu ombro. Me virei e a vi. Allison.
- Cam? – perguntou, assustada. – É você?
- Não, eu sou aquela menina ali – apontei para qualquer garota que vi na minha frente. Essa pessoa me olhou como se fosse matá-la. – É claro que sim.
- Ah, estava preocupada e pensei que não viesse hoje – percebi a sinceridade com que falava. – Tenho que falar com você. É sério.
O que mais me espantou foi o fato dela me puxar pelo braço, apesar de faltarem dois minutos para começar as aulas. Não parece típico de Allison pular as aulas.
Subimos até o terraço, onde todos os burros matam as aulas que lhe apetecem. Mas, incrivelmente, hoje não tem ninguém aqui. Talvez porque ainda seja começo de ano.
Nós sentamos nas beiradas da escola, que por algum acaso não tem nenhuma proteção. Para alguém morrer – ou ser morto – aqui deve ser extremamente fácil. Se tem alguém que queira matar, este é o lugar onde deve fazê-lo. O lugar onde não haveria nenhuma prova.
Deixando isso de lado, a fresca brisa do outono batia em nossa pele. Daqui podemos ver o limpo céu azul em que não conseguimos olhar de nenhum outro lugar. As nuvens estão tampando o quase inexistente sol.
- Daqui a pouco já será o inverno – comentei. – Só mais alguns dias e poderemos ver a neve.
- Você gosta da neve? – ela finalmente disse alguma coisa.
- Amo. É tão melancólico... – eu ri. Se houvesse algo supostamente feliz na minha vida, para sentir melancolia. – E prefiro muito mais o frio. Inverno é a melhor estação que pode existir.
- Não realmente. No verão, podemos viajar para a praia. – complementou.
- Não gosto do mar. Ele é bonito, claro. Só que, sei lá...
- Tem medo? – certo. Agora ela tirou as palavras da minha boca.
- Sim. – admiti.
Ela riu. Não foi uma risada baixa e tímida, como Alli costuma ser. E sim uma risada bem alta e extravagante.
- Mas, por quê? Já se afogou ou algo assim?
- Hum, talvez. – como explico para ela que não lembro de nada sobre minha vida? – Não me lembro. Provavelmente é só um trauma, ou algo sem explicação.
- Só um trauma? – ela sorriu. – Você me faz rir. Mas, tipo, já ouviu falar que medos sem explicação podem ser resultados de algum acidente numa vida passada?
- E você acredita nisso?
- É, algo assim. Acredito em espíritos. Mas não em reencarnação.
- Eu não acredito em Deus, espíritos, anjos, demônios.
- Por quê? – agora, ela perguntou como se isso fosse algo realmente importante, que decidiria toda a minha vida.
- É injusto e imoral.
- Certo. Vamos sair do assunto.
Ficamos em silêncio. Por um grande tempo.
Observei as nuvens em formato estranho. Olhei para baixo, vendo a grande altura em que estamos. Alto o suficiente para matar alguém que cair – são oito andares. Mas eu já não tenho mais medo de altura. Não mais. Aliás, pressinto que já tive, algum dia.
- Você recebeu alguma carta dos seus pais ontem? – Allison começou.
- Como você sabe...? – perguntei, curiosa.
- Por nada. – isso certamente é mentira. – Mais importante, você a abriu?
- Não tive coragem. - abaixei a cabeça. Fiquei pensativa por algum tempo. – Sou uma covarde, não sou?
Ela riu baixo. – Claro que não. Se fosse eu, faria o mesmo. Não é sempre que recebemos uma carta de alguém morto, não é?
Isso me animou. Começamos a rir, nós duas. Como se só existissem nós duas no mundo, somente. E, mesmo neste apocalipse, conseguíssemos rir como se nada estivesse acontecendo.
- Você me anima – falei. Apesar disso, estava precisando ir descansar. – Vou para casa. Quando chegar, abrirei a carta.
- Acho que também irei. Na verdade, vou viajar hoje ou amanhã. – completou. – Para a minha terra natal.
- Eh? Acho que ainda não perguntei, mas... Aonde você nasceu?
- Isso realmente importa?
- Não, desculpa. – me arrependi.
- Não precisa se desculpar. – me avisou. – Eu não gosto muito da minha família, e tudo mais... Sempre fico com raiva quando lembro que tenho de voltar para onde nasci. E, desculpe, me esqueci de que você não sabia e que não tem nada a ver com isso...
- Você não parece se importar com isso.
- E não me importo. Aliás, você é a primeira pessoa que me diz isso. Como sabia?
- Por nada. – contra-ataquei. – Não é assim como diria?
- Pois é. É sim. - riu. – Bem, tchau. Estou indo para casa. Deveria ir também.
- Como disse, é o que vou fazer. – a acompanhei enquanto descíamos os oito andares de escadas. Finalmente chegamos ao portão de saída daquele inferno. – Tchau.
Desta vez, não disse “adeus”. Mas era o que deveria ter feito.

Peguei a minha bicicleta e pedalei em direção à minha casa; Tolerei os xingamentos de “Assassina” por quase todo o pequeno caminho. Mas sempre tem alguma hora em que não conseguimos mais aguentar o que não queremos.
Parei e desci da bicicleta; Caminhei em direção a um garoto que estava me importunando. O segurei pela blusa e lhe dei um belo soco. Um soco tão forte que ele começou a sangrar.
Eu o encarei. Ferozmente. O garotinho começou a chorar e correu a casa em que estava na frente, e entrou. Voltei para minha bicicleta e me pus a pedalar novamente.
Só parei de novo na frente da minha casa. A porta estava destrancada. Foi quando me lembrei de que a esqueci aberta, pois saí com tanta pressa e ansiedade esta manhã.
Atualmente, no bairro, está tendo várias notícias de assaltos e assassinatos, em que as vítimas deixas as portas abertas.
Ignorei o fato de que poderia ter alguém na casa e entrei. Fui até a mesa da sala de estar, onde a carta supostamente está. Me surpreendi em ver que a mesma não estava lá; procurei por todos os cantos da casa até chegar ao meu quarto. A encontrei na primeira gaveta da escrivaninha.
Me pergunto o que estava fazendo ali.
Segurei a carta. Estou preparada.
Preparada para dar um passo a frente em direção ao meu destino.
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Camellia -Crimson Line- Empty Capítulo 05 - A verdade oculta

Mensagem por Talita Qui Jan 19, 2012 7:06 pm

Ainda estava assustada pelo conteúdo da carta quando ouvi um barulho no porão.
Deixei a carta no lugar em que a encontrei; na escrivaninha do meu quarto. Desci as escadas, que me levaram à sala de estar, em frente à porta de entrada. Virei-me para a porta que ficava embaixo da mesma. É de lá que o barulho está vindo.
Abri a porta silenciosamente e com cuidado. Desci novamente esse lance de escadas. Me encontrei num lugar escuro, vazio e frio.
Pelo fato de minha mãe sempre pedir para eu não ir até este lugar desde criança, a obedeci e nunca vim. Meu pai, por sua vez, dizia que tinham monstros lá embaixo. Quando acabava a luz, ou estava sozinha, parecia ouvir sons vindos desta porta. E o medo me preenchia.
E é isto o que está acontecendo agora. O medo me domina. Está tomando conta de mim. Fechei os olhos, desejando que isso passasse logo. O que não passou.
Fiquei na ponta dos pés e me inclinei um pouco, ainda no último degrau da escada, para encontrar o “interruptor” – que, na verdade, é um fiozinho. Fiz isso e liguei a luz.
O lugar estava vazio, como pensava. Nele, só havia uma caixa, bem no centro.
Engoli em seco e me dirigi até esta. Caminhei vagarosamente sobre as velhas tábuas de madeira do piso – que estalavam a cada passo. Olhei em cima desta caixa e vi a carta que havia deixado no meu quarto.
Tomei coragem e abri novamente.
“Até o momento em que o destino lhe levar à verdade, estaremos com você.
Para todo o sempre.”
Ainda me pergunto o significado destas palavras.
Retirei o durex que selava a caixa com muito cuidado, para não danificar nada. Levantei as abas cautelosamente e espiei dentro dela.
Havia um monte de palha e, no meio – bem no fundo, escondido -, estava um retrato.
Era um retrato de nós três. Quatro, aliás. Eram meu pai, eu – com mais ou menos 2 anos – e minha mãe – aparentemente grávida da minha irmã natimorta.
Virei o porta-retratos e o abri; retirei com cuidado a foto. Atrás dela estava escrito: “Camellia 13 meses, Lina 40 semanas”.
Lina era o nome de minha irmã que morreu antes de nascer.

Na caixa também havia um pequeno papel com alguns números escritos. 16-04-15.
Encontrei mais um papelzinho e outra carta; no papel havia o nome de um lugar. “Santiago, Ilha Pinzón, Pacífico.”
Nem mesmo tentei entender o que estava escrito.
Peguei o envelope e o rasguei sem ter o mínimo de cautela ou coisa parecida; Retirei a carta e a li. “Esses números são o código. O lugar é o espelho do banheiro da suíte.”
Segui as “coordenadas” e fui até a suíte principal – o quarto dos meus pais. Entrei no enorme banheiro – com a banheira com hidromassagem que sempre quis para mim – e virei-me para o grande espelho. Que, aliás, se localiza numa parte isolada do “cômodo”. Entre o closet – que fica ligado ao mesmo – e o quarto. Não, no banheiro mesmo não há nenhum espelho.
Com cuidado o bastante para não quebrá-lo – não tanto assim -, removi-o da parede e o coloquei no chão. Já que o espelho é pequeno, consigo carregá-lo a mão livre e sozinha sem problemas.
Me surpreendi quando vi o tão falado cofre – e percebi que não era mentira ou ilusão, e sim a verdade; talvez um jogo. Girei o disco do cadeado até conseguir a combinação certa do segredo. 16-04-15. O dia em que nasci – dezesseis de abril – e a minha idade.
Abri a porta do cofre e peguei as quatro folhas de papel que estavam dentro. Duas certidões de nascimento e dois atestados de óbito.
Um atestado em nome de Lillian Victoire. Morreu antes de nascer. Dia 29 de fevereiro, há treze anos.
Outro no nome de Lina Victoire. Morreu exatamente um ano depois de nascer. Dia 16 de abril, há quatorze anos.
As duas certidões de nascimento em nome de Lina e Camellia Victoire. Nascidas no mesmo dia. A primeira morreu um ano depois de nascer.
Encarei aqueles papéis. Sim. Isso significa que mentiram para mim.
Não.
Não.
Não pode ser.
Não fariam isso comigo.
A minha irmã que supostamente achava que era natimorta é minha irmã gêmea. E morreu exatamente um ano após nascer. E minha irmã que realmente é natimorta – e nem sabia sobre sua existência – se chama Lillian.
Olhei no papel de novo e

Liguei a fonte do meu computador – que quase nunca uso – na tomada. E o liguei.
Entrei no Google e pesquisei “Ilha Pinzón”. Certo. Uma ilha no meio do pacífico. Nada mal.
É certo que se quiser saber mais sobre mim – e sobre meu passado, sobre tudo -, tenho que ir até este lugar.
Pesquisei horários de voos de avião até esta. Já como é uma ilha que não aparece no mapa, e necessário ir de balsa até ela.
Para isso, iria até o equador.
Já está decidido. Aproveitando essa semana que tenho de folga da escola, vou viajar.
Não. Melhor. Vou morar lá. Na minha cidade natal, sem ninguém me aporrinhar ou algo assim. Espero.
Entrei no site de um dos aeroportos aqui perto – o mais perto primeiro – e não havia nenhum voo disponível para amanhã, com destino ao Equador. O mais perto que tem deste lugar é para a cidade de São Paulo, Brasil.
De lá, poderei ir pegar um outro voo com destino ao Peru. Então, pegarei um transporte – que deve ter neste país -, e irei até o Equador. E então, subirei na balsa que me levará até a maldita ilha.
Comprei as passagens com o dinheiro no cartão dos meus pais – já que ficou muito caro -, e tenho certeza que ainda sobrará créditos.
Só notei que horas eram quando o relógio da sala deu altas doze badaladas – anunciando a meia-noite.

Acordei ansiosa para a viagem. Desde o momento em que comprei as passagens já estava, na verdade. O bastante para esquecer de fazer as malas.
Mas acho que não preciso me importar com isso. Tenho bastante tenho até o voo – que só é às 3 horas da tarde, sendo agora 8 horas da manhã.
Porém, só tenho que me preocupar em conseguir aguentar dois voos seguidos de 10 horas cada um. Certo, não são seguidos. Vou parar para descansar um dia em algum hotel em São Paulo. Apesar de ter medo sobre o que vou encontrar por lá.
Comecei a arrumar as malas. Fiz uma listinha com o que preciso levar e o que preciso deixar – costumo levar coisas até demais. Coisas como escova e pasta de dentes, escova e pente de cabelo, xampu e condicionador, perfume, roupas de verão e inverno, e parecidos.
Ao acabar de arrumar, tudo o que quero levar coube em cinco grandes e gordas malas. Fiquei me perguntando que tipo de monstro eu sou por trazer tudo isso para uma viagem. Aliás, nem sei por quanto tempo vou ficar lá. Nem o tempo que vai estar, o que vou precisar, e tudo mais.
Peguei meu celular e o seu carregador, o fone de ouvido, alguns livros para ler e meu computador pequeno e coloquei numa bolsa nem tão pequena assim.
O único e solitário gongo do relógio novamente me avisou que já preciso ir ao aeroporto.
Chamei pelo telefone da casa – que, por sua vez, se encontra na sala de estar – um taxi. Este demorou meia hora para chegar – provavelmente por conta do trânsito, que pensei que não existiria. Isso só me deixou mais nervosa e ansiosa pela chance de não poder chegar a tempo.

E dei mais um passo ao meu destino; e cheguei mais perto da verdade.
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Camellia -Crimson Line- Empty Capítulo 06 - Sonho sem fim

Mensagem por Talita Qui Jan 19, 2012 7:06 pm

O voo atrasou duas horas. Na sala de embarque, haviam dois homens – não definitivamente “homens”, pelo jeito -, que vieram me cumprimentar. Perguntaram pelas horas e, percebendo minha ignorância – em todos os sentidos possíveis -, desistiram e foram embora – se isso quer dizer “dar em cima de outros HOMENS”.
E esse é só um fato. Enquanto me preparava para uma longa viagem, me arrumando no banheiro – e conversando com outras mulheres -, um maluco entrou e começou a dançar. Depois, do nada, chutou cada porta das “cabines” – como se não bastasse ter dançado hula hula no meio do banheiro feminino.
Me pergunto se é sempre assim. Já que esta é a primeira vez que viajo de avião.
Fazem apenas 40 minutos desde que o este decolou. Sentei na poltrona 9-C – do lado da janela e, infelizmente, do lado da turbina, que faz um barulho extremamente irritante -, ao lado de uma garota e o que parecia ser seu namorado.
Preferi não puxar conversa e ficar na minha. Mas não deu muito certo – já que os dois começaram.
- Oi – a garota me cumprimentou. – Sou Sthepanie. E esse é o meu namorado, Matt – ela apontou para ele, que acenou.
Mas, bem, já sabia que são namorados. Quer dizer, pela aliança.
- Ah. – me surpreendi por terem sido eles que não conseguem ficar vendo uma (não tão) simpática menina vestida totalmente de preto num dia quente e de estilo punk sem falar nada. – Me chamo Camellia.
- Camelia. Que nome diferente. – ela notou minha face de desapontamento e corrigiu. – Mas é bonito. De que língua?
- Latim. – respondi, sem muita animação.
- É, de certa forma, bonito e diferente. – o namorado completou o comentário de Stephanie. – Gostei. É legal.
A garota riu. - Bem, pode me chamar de Steph.
- Hmm. Cam. – disse. Mas acho que me empolguei e falei alto o suficiente para todos no avião ouvirem.
- Certo, Cam. – foi a vez de Matt. – E por que está indo para São Paulo?
- Vou para minha cidade natal. São Paulo fica no caminho. – percebi que, mesmo tendo nos conhecido há nem cinco minutos, já estávamos falando como se fossemos bem próximos. Acho. – E vocês?
- Eu nasci nessa cidade e estou indo visitar meus parentes. – ela disse e logo depois completou, quando notou minha cara de dúvida em saber porque Matt está indo junto. – Ele só está me acompanhando.
Aliás, Matt é um cara simplesmente gato demais – não tanto quanto Richard, claro – para sair com uma mulher feia como Steph. Não, não “feia do tipo bonitinha”, e sim “feia do tipo horrível”. Mas não tanto como eu, acho – apesar de algumas pessoas dizerem que sou incrivelmente bonita. Isso é, meus falecidos pais, alguns vizinhos e Richard. Porém, se Richard disse, então é como ele falou.
Depois disso, ficamos em silêncio. Peguei meu computador e comecei a jogar Solitaire. Fechei quinze jogos e, depois de um tempo, a bateria acabou. Peguei meu Smartphone e joguei mais alguns. Depois de algumas partidas, a maldita bateria ficou no vermelho e tive que desligar, para ter mais um pouco restante.
Acabara de guardar os dois aparelhos quando começaram a passar com os lanches. Quer dizer, gordura total – já que estes são horríveis, gordurosos e provavelmente mortais (certo, não mortais, mas quase).
Me servi com um lanche natural – foi o que disseram, pelo menos, apesar de não parecer -, algumas bolachinhas de água e sal e um chá gelado de limão. Devorei tudo no que pareceram segundos. Esperei a aeromoça – como preferem ser chamados, comissários de bordo – olhando as nuvens com os mais estranhos formatos. Notei uma com o formato de um sorvete e vi outra com o formato de um celular.
Demorou um tempo para a mulher passar; mas quando passou, joguei todo o meu lixo fora rapidamente e peguei meu iPad, pronta para jogar Angry Birds. Foi quando olhei a hora e me surpreendi.
Já haviam se passado 5 horas, sendo, portanto, 22h no momento, contando com os atrasos. A previsão é para chegarmos ao destino às duas horas da manhã.
Aproveitei o tempo para colocar meu celular para carregar no iPad. Hoje fora um dia cheio, portanto estou cansada.
Esperei o sinal de “ocupado” do banheiro estar apagado e fui até ele; ignorei o fedor do local e a água avermelhada na privada. Me aliviei, lavei as mãos e voltei para a poltrona.
Avisei para Matt e Stephanie que ia descansar um pouco e pedi para que eles me acordassem quando estivéssemos quase chegando. Eles concordaram.
Com o iPad e o meu celular no meu colo, ambos desligados – me pergunto como o celular carrega com o iPad desligado, mas enfim -, virei minha cabeça para o lado da janela e, em poucos minutos, adormeci.

Caindo. Estava caindo...
Quando fechei meus olhos...
Fui levada a um lugar escuro e vazio... Faz muito frio aqui. Sinto minha pele se arrepiar...
Aqui, só consigo ver uma escada... Uma escada aparentemente sem fim. Parece ter vários degraus... E levar a um lugar bem mais alto...
Olhei para os meus lados. Só vi o vazio e a escuridão... E um abismo. O que parecia ser um, pelo menos.
Caminhei para frente, em direção a enorme escadaria. Ao chegar a sua frente, parei. E fiquei olhando, pensando.
O que há depois dela?
O que há antes dela?
Tentei dar um passo para subir um degrau, sem sucesso.
Distante.
Ela está muito distante.
Não.
Mentira.
Não pode ser.
Ela está na minha frente.
De repente, uma onda de pensamentos veio a minha mente. Tudo o que eu lembro... Veio à tona...
Em vão?
Será?
Estou confusa...
Estou solitária...
Estou com medo...
Mas... Medo do quê?
E por quê?
Tentei novamente dar um passo para frente. Consegui. Subi o primeiro degrau. E vagarosamente, fui subindo o resto.
Até que... cheguei em frente a uma porta. Tentei abrí-la. Mas não deu certo.
Nesse local, a enorme escadaria agora é uma fina corda de circo, um difícil trapézio...
Me desequilibrei e cai.
Em direção ao abismo.
Mas uma mão me segurou.
Quem?
O quê?
Como?
Não tinha mais ninguém aqui.
Não. Não tem mais ninguém aqui.
De repente, uma brisa fria atravessou meu corpo. Me deu calafrios.
E eu cai, novamente.
Mas, dessa vez, foi definitivo.
Até que eu vi aquele fio vermelho.
Aquela linha carmesim...
E a agarrei.
Tudo isso pareceu um sonho.
Talita
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Camellia -Crimson Line- Empty Capítulo 07 - Lágrimas de sangue

Mensagem por Talita Qui Jan 19, 2012 7:07 pm

- Camellia! – pude ouvir uma voz conhecida ressoando desesperadamente. – Camellia, acorda!
Franzi meus olhos e os abri devagar. Percebi que esta “voz conhecida” era a voz de ninguém mais que Stephanie. Notei que ainda estava no avião; talvez aquilo tenha sido um pesadelo.
Sim.
Um pesadelo.
Vou pensar assim.
- Você está bem? Parecia estar sofrendo – Matt me informou. – Teve um pesadelo?
- Sim – respondi, sem preocupação alguma, ao contrário do que eles pareciam mostrar. – Isso é frequente.
- Podia ter nos dito antes. Assim, não ficaríamos tão preocupados. – Steph completou, seus longos e cacheados cabelos estavam brilhando com a fraca luz do avião. – Venha, se arrume. Em mais ou menos meia hora o avião irá pousar. – ela me ajudou a me sentar direito na poltrona.
- Obrigada, Steph. – dormi um pouco mais de quatro horas. Deve ter sido o suficiente para descansar bem. Assim, não ficaria tão cansada ao chegar à cidade. – Mas não precisa se preocupar.
Na realidade, estou realmente surpresa por saber que dormi todo esse tempo. No sonho, pareceram alguns minutos.
Mas, também estou com medo. Sabe, de saber como é São Paulo. Nunca saí do país antes. Melhor, da cidade. E agora faltam apenas trinta minutos. Talvez tenha sido esse o motivo do pesadelo. Prefiro pensar assim.
Esses minutos passaram rapidamente e logo o avião pousou no aeroporto de Congonhas da grande São Paulo – como chamam a capital de São Paulo -, e não demoramos ou custamos a desembarcar.
Para atravessarmos o enorme aeroporto e chegarmos à área de desembarque, tivemos que pegar um ônibus. Quando entramos, só tinham dois lugares disponíveis. Sentaram Steph e Matt juntos, e eu fiquei em pé na frente deles.
No momento, está chovendo. Muito. Acho que é primavera aqui. Me pergunto se as flores crescem bonitas como em Nova Iorque. Mas não encontrei nenhum flor ou árvore para responder minha pergunta.
Na sala de desembarque, esperei minha mala passar pela minha frente na esteira – ou sei lá como os brasileiros chamam isso, é algo em que as bagagens ficam “passeando”, não sei como dizer -, e estava pronta para sair quando Steph me chamou.
- Espere nós dois – ela pediu. – Nossa mala já está vindo.
- Certo. – concordei.
Realmente não demorou muito para as malas e tudo mais deles aparecer. Pegamos um carrinho para ajudar-nos a carregar tudo o que temos e fomos em frente. Saimos por uma porta automática – que, como esperado, abriu quando ficamos na frente -, e me diverti com ela. Começamos a brincar, ficando na frente e, quando abria, saiamos. Eu sei que não é certo. Mas é divertido.
Nessa hora, o aeroporto está vazio. Por isso, podemos nos divertir assim, sem ninguém reclamar.
Steph e Matt foram encontrar seus parentes – que os esperavam -, e nos separamos.
- Então, nós vamos por aqui. Até algum dia, talvez. – Steph me deu um abraço e pegou um papel, onde anotou alguns números. Matt me deu um beijo na bochecha e um aperto na mão. – Esse é o meu número do celular. Me liga, viu?
Eu ri. – Certo, eu ligo. – disse, com meus vermelhos olhos brilhando. Foi então que percebi que os dois nem reagiram a sua cor. Atualmente, parece que o mundo está me ajudando. Ou parece, pelo menos. – Até mais. – me despedi e me pus a andar.
Caminhei pelos longos corredores, passando pelas mais diversas lojas. Vi uma de “lembranças da viagem” – ou o que parecia ser, não sei falar português, mas foi o que pareceu –, e decidi comprar uma.
Cumprimentei a balconista com um sorriso, o que a fez olhar assustada. Ah, bem. Parece que o mundo não está tão ao meu favor assim.
Escolhi um chaveiro e uma bonequinha bonitinha – de pano, tão fofa – e fui em direção à mulher. E fiquei sem saber o que fazer.
- Você entende minha língua? – perguntei.
- Não sei falar muito bem. – ela respondeu, com um sotaque engraçado, que me deu vontade de rir. Mas eu me segurei. Por pouco.
Foi quando notei que ainda não tinha trocado a moeda.
- Ah, droga. Esqueci de trocar o dinheiro. – abri minha bolsa e peguei minha carteira vermelha e de corações. Fiquei encarando o dinheiro. – Desculpe, vou trocar no Câmbio e já volto. – me virei para a porta e caminhei em direção a ela, pronta para sair.
- Não precisa. – disse. – Nós podemos trocar depois. – explicou.
- Certo. E, mais uma vez desculpe. – dei o dinheiro equivalente. Já como sou muito boa em contas (na matemática em geral), e sei o valor do dólar no Brasil, foi bem fácil. A balconista me olhou assustada novamente.
- Veio de onde? – a mulher perguntou, enquanto conferia a quantia e se batia com o valor brasileiro.
- Nova Iorque. – respondi. Ela já estava imprimindo a nota fiscal. Algo que não pode faltar para os brasileiros.
- Legal. Boa sorte. – olhou para mim, com cara de dúvida. – Quer que embrulhe para presente? E quer uma sacola?
- Pode ser. – respondi, sem entender muito bem o que quis dizer com “embrulhar para presente”. Do mesmo jeito.
Fiquei em silêncio enquanto a observava embrulhando os dois itens com um papel amarelo. E depois, colocou um adesivo com alguma coisa escrita. Provavelmente o nome da loja. Ela me deu esse “embrulho” numa sacola. E eu sai da loja, em silêncio, com a cabeça baixa.
Continuei andando pelo corredor do aeroporto, e me deparei com um Câmbio na minha frente. Aproveitei para trocar o dinheiro.

Saindo do grande local, vi uma placa escrito “taxi”. Isso eu pude notar porque se escreve igual ao inglês. Entrei numa enorme fila – provavelmente para conseguir chamar um taxi -, e esperei. Tinham apenas duas pessoas na minha frente, que depois de algum tempo saíram, juntas.
Esperei um taxi parar na minha frente e entrei no carro. Peguei o endereço em que precisava ir e lhe falei.
- Você fala inglês? – primeiramente, perguntei.
- Sim.
- O endereço é esse. – entreguei um papel, onde está escrito “Avenida Roque Petroni Junior, 1000 – Morumbi - Blue Tree Premium Morumbi”.
O motorista confirmou com a cabeça e começou a dirigir. Demorou uma hora e alguns minutos para chegamos. Demorados minutos ouvindo Britney Spears, um cantora que, honestamente, eu odeio.
Ele parou em frente à fachada do hotel. Me disse o valor para pagar, e eu lhe dei a quantia exata. O homem tirou a minha bagagem do porta-malas e foi embora.
Que mal educado. Nem disse “tenha um bom dia” ou algo assim.
Deixei isso de lado. Entrei na grande construção e fui em direção à recepção. Uma mulher baixinha me surpreendeu com um “o que deseja?”.
- Eu fiz uma reserva ontem de noite. – disse, em inglês mesmo, desejando que a mulher entendesse. – Você entende inglês, não é?
- Sim, entendo. – ela me deu uma chave com um chaveiro escrito “504”. – O seu quarto é o 504, no 5º andar. É só subir pelo elevador, à direita. Qualquer dúvida é só ligar pelo telefone do quarto.
Parece que todos aqui são mal educados de noite. Credo. Me deu até calafrios.
Mas fiz como a recepcionista disse e fui em direção ao elevador. Subi até o quinto andar e comecei a procurar pelo meu quarto. Demorou um pouco para eu perceber que todos os quartos pares ficam à direita e os ímpares à esquerda.
Coloquei a chave na fechadura da porta, quando localizei meu quarto. Empurrei-a e a mesma abriu. Dei de cara com um apartamento pequeno, com uma cama de solteiro bem na entrada e um frigobar ao lado, em baixo de uma bancada. Uma mesinha de centro entre a TV - localizada no alto do quarto, à minha direita – e a cama. Uma porta – provavelmente ligada ao banheiro – embaixo da televisão. Sem guarda-roupas. Acho que tenho que deixar a mala no chão, mesmo.
Apesar de ser três horas da manhã, não devo me preocupar tanto. Quer dizer, o voo é só amanhã – amanhã mesmo, sendo que já passa da meia-noite. E é noturno. Tenho um dia aqui, nesta cidade, para aproveitar tudo o que tenho direito. Digo – quase nada. Nunca fui de comer muito, então não posso correr atrás de comida estrangeira; nunca me importei com o que visto, então comprar roupas não me importa; nunca me gostei de lembrancinhas, além disso não tenho ninguém para comprar uma.
Pensei na Allison. Ela é a única pessoa que eu tenho para comprar algo. Na verdade, nem tanto. Não depois do que aconteceu.
Foi quando eu percebi que estou simplesmente ignorando o fato de ter perdidos os meus pais num acidente – um acidente que eu supostamente devia ter morrido. Estou encarrando isso como se não fosse nada demais. O que é o contrário. É muito grave.
Deixando isso de lado. O que eu realmente preciso é dormir. Mal estou conseguindo me manter em pé.
Deitei a mala no chão e a abri. Peguei minha roupa que vou usar para dormir, e a separei. Peguei também minha toalha, uma escova de cabelo – e de dentes, com pasta de dentes junto -, xampu e condicionador e me dirigi ao banheiro.
Quando a abaixei a maçaneta e empurrei a porta, não fiquei muito surpresa – por causa do quarto. Não tem nada de sensacional, somente uma privada, uma pia e um chuveiro. Do contrário do meu quarto – que tem uma banheira com hidromassagem incluída.
Pendurei a minha toalha rosa com sapinhos (verdes, é claro) no box – o que normalmente faço quando vou tomar banho. Coloquei meu sabonete e coisas assim no chão, dentro do chuveiro – para ser mais fácil de pegá-los, sem molhar todo o chão do banheiro.
A água estava cruelmente gelada, então não demorei tanto assim no banho. Foi quase o meu recorde – tirando uma vez que eu tinha dez anos, num acampamento.
Bem, vamos explicar sobre essa triste fato que ocorreu. Quando tinha dez anos, como toda a escola normal, a New York High School também fez um. Para um acampamento – detalhe, com crianças de DEZ anos. E, como sempre, em viagens escolares algo dá errado. Desta vez, acabou chovendo todos os dias. E não podíamos fazer nada – sim, nada, a não ser ficar dentro da barraca. Só sair para comer e ir no banheiro.
Só que o banheiro público – que fica fedendo a uns metros do local, ainda por cima -, não nos deixava dormir. Por causa do cheiro, óbvio. Quando íamos ao “dito cujo”, tínhamos que segurar a respiração. Além do fato que, para chegarmos até lá, era necessário um banho de chuva FRIA.
Sem falar do fato de eu – sem nenhum amigo - tive que ficar sentada no canto da barraca – ou fingir que estava dormindo -, para ninguém me encher. E realmente não me encheram.
E o chuveiro, a mesma coisa que o banheiro. A diferença é que não fedia. Mas não tinha aquecedor – nem elétrico, nem a gás. E tomávamos banhos frios mesmo. Consegui bater meu recorde de três minutos, lavando o cabelo e tudo.
Vamos voltar à realidade. Acabei de tomar um banho nada relaxante – só me estressou mais ainda. Me sequei e fui até o quarto e me vesti. Coloquei meu pijama preto com listras cinza e me joguei na cama. Não, não sequei o cabelo. Não que me importe com isso.
Estava quase caindo no sono quando escutei alguém bater na porta. Mas quando a abri, não vi ninguém. Pelo menos, não na frente da porta. Dei um passo para fora do quarto, com cuidado – talvez para ninguém notar o meu pijama (?) -, e olhei para os dois lados do grande corredor. Havia um menino – um menininho, bem pequeno. Só que, bem, não era exatamente uma pessoa. Ele - além de estar rindo histericamente com aquele riso maldoso – estava com seus olhos vermelhos, brilhando.
E tinha algo estranho quando olhei para ele. Tinham lágrimas caindo de seus olhos. Mas não lágrimas normais. Lágrimas de sangue.
Senti um calafrio percorrer todo o meu corpo. Senti o medo me dominar. De repente, meu corpo parou. Era como se não houvesse mais nada ao meu redor.
O menino começou a se aproximar de mim. Tentei me mexer, correr, gritar. Mas tudo sem sucesso. É como se algo estivesse segundo o meu corpo.
Rapidamente, ele conseguiu chegar até mim. E me tocou. Sim. Ele tocou o meu rosto. Não de um jeito psicopata. Mas sim, de um jeito mais... romântico. Certo, eu sei que doentio e sem noção alguma, mas foi o que senti.
E ele se desvaneceu. Não desapareceu lentamente, mas sim em algumas fitas. Vermelhas. Como o sangue. Como o seus olhos.
Eu peguei uma daquelas fitas, que estavam voando. Não sei porque, mais me deu um pouco de... nostalgia. Enquanto as outras fitas viraram pó no ar, esta não. Foi diferente. Ela começou a pingar. Como sangue. E não demorou muito para ter virado uma pequena poça.
Fiquei algum tempo – não consegui saber quanto, já que tudo parece ter desaparecido do nada – parada, olhando para aquela poça e aquele sangue escorrendo pelos meus dedos. Algum sussurro saiu pelos meus lábios, inconscientemente, mas não pude descobrir o que foi. Algo como “destino”. Algo assim.
Corri para o meu quarto e me joguei na cama. Nem sequer me lembrei de lavar as mãos, e sujei toda a cama. Já era tarde demais quando notei. E decidi deixa-las assim mesmo.
De algum jeito, lágrimas caíram dos meus olhos. E lavaram o sangue que pingava da minha mão.
Em pouco tempo eu adormeci. E tive aquele mesmo sonho.
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Camellia -Crimson Line- Empty Capítulo 08 - Um passeio para o inferno

Mensagem por Talita Qui Jan 19, 2012 7:08 pm

Já passava das dez horas da manhã quando acordei. O restaurante do hotel – para eu tomar meu café da manhã – já estava fechado, portanto me enchi com as caras guloseimas do frigobar.
Por algum motivo, me esqueci totalmente do que ocorrera ontem. Na verdade, decidi ignorar. Mas aquilo me assustou. Mesmo. Não é sempre que vemos uma (possível) alucinação de um garotinho rindo por aí, não é?
Depois de jogar todos os papéis de balas, bombons, amendoins e afins no lixo, peguei minha toalha para tomar mais um (cruel) banho. O que me fez ficar mais irritada do que já estava.
Ao acabar de tomar banho e me vestir, sentei no sofá e liguei a TV. Procurei na lista de canais a HBO para assistir alguma coisa que preste. Mas foi quando lembrei que no Brasil os horários são diferentes e passa tudo em português – ou seja, não seria de boa ajuda.
Desliguei a televisão e coloquei o meu tênis – preparada para sair. Abri a porta, pensando que não encontraria nada no corredor para me assustar – e realmente não encontrei.
Me pergunto o que posso fazer aqui, nesse lugar.
Desci os cinco lances de escada e me dirigi até a recepção. Pedi por um guia. Acho que fiz um papel de idiota, porque havia um folheto – um guia – bem na minha frente.
Mas não tive pressa em chamar um taxi, afinal. Antes de fazê-lo, abri o guia na primeira página e fui folheando as – quase nulas – seguintes. Parei no primeiro lugar que me chamou a atenção. Algum nomeado “MASP”, ou algo assim. Graças a Deus, o guia também estava escrito em inglês. E pude ler que é algo como um museu de arte.
Quando o taxi finalmente chegou – demorou bastante tempo, aliás -, mostrei a imagem ao motorista. O mesmo afirmou com a cabeça e começou a dirigir.
Não sei quanto tempo demorou para irmos até lá – o trânsito estava um inferno e parecia meio longe, também.
Enquanto estava no carro, notei as grandes e antigas construções aos arredores do centro “velho” – como chamam o “bairro”.
Ao o parar do automóvel, paguei a quantia necessária para o homem – que não disse nada, só ficou me encarando com seus olhos assustados – e desci com muita pressa. Não foi nesse momento que eu percebi, mas deixei minha bolsa com minha carteira lá dentro.
Me virei para a grande construção com traços vermelhos e brancos. E altas paredes de vidros – aqueles de janela mesmo.
Tive sorte de hoje ser terça-feira e a entrada gratuita. Quando me dirigi até a porta para entrar, procurando o dinheiro para pagar, percebi a falta da minha bolsa. Ótimo.
Subi com mais algumas pessoas pelo elevador panorâmico – único no local – até pararmos no primeiro andar.
Dei de cara com um corredor escuro, com algumas fracas luzes vermelhas ligadas. Estava cercada de quadros. Fui olhando um por um. Olhando as belos, mas confusas, pinturas. Algumas maravilhosas e incrivelmente realistas, outras já esquisitamente abstratas.
Mas eu parei mesmo num quadro de um garotinho. Parecido com aquele que vi no hotel. Parecia que só eu estava o vendo. Parecia que este não existia para as outras pessoas. Parecia que... ah, bem, vamos deixar isso quieto.
Acho que fiquei tempo demais encarando essa maldita pintura que as já não havia ninguém ao meu redor. Somente eu e as obras, naquele corredor escuro – e, devo dizer, assustador.
Comecei a andar, desesperada, por todo o local. Ou seja, reto. Mas, enfim.
Estava bem devagar. Até que ouvi um barulho atrás de mim. Esperançosa para ser alguém por aí. Mas lembrei que não tinha como ela ter subido, uma vez que a próxima visita seria somente daqui a uma hora.
Quando me virei, vi o menino. Aquele do hotel. E, realmente. Era o mesmo da pintura.
Não pensei duas vezes, comecei a correr o mais rápido o possível. Vi um corredor para a esquerda – o que eu estou continua reto -, e não tive cuidado ao entrar nele. Acabei derrubando uma obra e o alarme soou. Ah, que bom! Algo que somente eu posso fazer.
Porém, mesmo assim, não parei de correr. Virei para outros corredores o máximo que pude. Mas não fez diferença.
Pois ele estava lá.
Na minha frente.
O garoto.
Só que tinha algo de diferente nele. Não estava chorando como no hotel, ou gritando como no quadro. Estava... sorrindo. Um sorriso tão belo e bonito que também me deu vontade de sorrir. Mas me segurei.
Arregalei meus olhos, assustada, e fui andando para trás. Estava para me virar e começar a correr novamente, quando o menino apareceu na minha frente. De novo.
Ele estava com a minha bolsa em suas mãos. E as levantou para me entrega-la.
Engoli em seco. Ainda hesitando, me forcei a pegar minha bolsa e sair correndo para a saída – que não sabia onde estava.
Não demorou muito para o alarme parar de tocar e eu ouvir a voz dos guardas conversando, bem perto. Algo que não entendi. Mas deviam estar achando que ninguém tentou roubar nada, e sim derrubou sem querer.
Ou alguém que tentou roubar, mas deixou cair quando o alarme soou.
Cometi o erro de ir em direção as vozes. Quando apareci na frente deles, logo apontaram uma arma para mim. Foi fácil enganá-los. Só disse que tinha me perdido da guia e estava procurando a saída.
Eles disseram que iam me levar até ela. Segui-os. Me mantive quieta durante todo o “percurso”. Tentei não tocar no assunto do quadro.
Sai do lugar com os guardas, que me deixaram sozinha no mesmo lugar onde o taxi parou.
Estava me preparando para ligar para algum taxi. Vi as horas. Era apenas meio-dia mas já estava morrendo de fome. Ia comer alguma coisa no hotel.
Disquei o número e coloquei o celular na orelha. Foi quando eu vi o vulto de alguém. Alguém conhecido.
Não me rendi ao medo e cancelei a ligação. Comecei a seguir a pessoa – mesmo que, com tudo o que aconteceu agora, possa não ser uma pessoa – até parar num beco sem saída.
Estava escuro e vazio. Não havia nada nem ninguém além de mim; nenhuma casa, nenhum prédio, nenhuma pessoa. Me deu um arrepio.
Ia voltar para a frente do museu, mas não consegui, por dois motivos. Um, não sabia onde estava. Dois, apareceram três caras armados na minha frente.
Dei alguns passos para trás. O que não adiantou muito, pois logo cheguei até a parede final do beco. O mais alto dos garotos apontou a arma para a minha cabeça e disse algo que não consegui entender.
Tentei falar, ou gritar, mas não obtive sucesso.
Até que ouvi o barulho de três tiros. Senti o gosto do sangue espirrando na minha boca. Mas não, não o meu sangue. O sangue deles.
Sim. Eles tinham levado um tiro. De quem? Não sei. Mas levaram.
Dessa vez, eu consegui. Alguma coisa aguda e irritante saiu de minha garganta. Um grito.
E eu vi, novamente, o vulto. A pessoa jogou a arma que estava em suas mãos ao chão. E voltou a andar.
Eu a segui novamente, com passos lentos e incrivelmente assustados. Estava tremendo.
Depois de alguns metros. Cheguei numa rua, onde já conseguia avistar o museu. Me virei para agradecer a pessoa, mas vi que já tinha sumido de minha vista.
Porém, deixou alguma coisa caída. Um laço – aqueles que colocamos no cabelo.
Um laço vermelho.
O mesmo laço que Allison estava usando no cabelo no último dia em que nos falamos.
A única coisa que pode sair pelos meus lábios foi uma palavra.
Um nome.
- Allison?
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Camellia -Crimson Line- Empty Capítulo 09 - O fogo que queima mas não mata

Mensagem por Talita Qui Jan 19, 2012 7:08 pm

Não demorou muito para eu sair correndo logo após aquilo. E também não demorou muito para eu ligar as pressas para um taxi vir me buscar.
Não segui aquele vulto ou algo parecido. Sério, não ia agir como uma protagonista de filme de terror que, ao invés de fugir, fica parada e anda na direção do monstro. Aliás, nem sei se aquela era a Allison. Porque Alli está nos Estados Unidos no momento.
E também não demorou tanto assim para logo chegar ao hotel. Exatamente uma hora da tarde.
Hoje, o dia passou bem rápido.
Logo depois de me empanturrar com macarrão e almôndegas – com um prato de salada separado -, fiquei sem nada para fazer. E quando digo nada, quero dizer nada mesmo.
Acabei por ir até o salão de jogos para apostar com cartas ou algo assim. Foi aí que lembrei que estava no Brasil, e aqui apostas não são permitidas. Está certo, no Brooklyn também não, mas enfim.
Depois de ficar algumas horas conversando com outras pessoas que por algum acaso também vieram dos EUA, resolvi ir para meu quarto tomar mais um banho gelado.
Foi o que fiz. Tomei um bem rápido – como já disse, por causa da maldita água fria. Me vesti e me assustei ao olhar para o relógio e saber que já passavam das sete da noite.
Me disparei para o restaurante pedir mais uma porção de almôndegas. Decidi mudar o prato e optei por um hambúrguer e algumas fritas.
Teria ficado tudo bem o dia inteiro se o garçom não tivesse começado a dar em cima de mim. Mas tipo, com cantadas muito velhas – como “você vem sempre aqui?”, o que me fez dar um fora terrível. Ele aparentava ter 16 ou 17 anos. Era bonito, alto e musculoso. O tipo de cara perfeito. Mas eu o ignorei completamente – realmente não sei por que -, e disse que precisava fazer algo importante no quarto. O cara finalmente me deixou em paz e consegui subir.
Chegando no quarto, peguei meu celular e chequei as mensagens. Vendo que não tinha nada na caixa de entrada – claro, quem mandaria uma mensagem para mim? – coloquei-o para carregar. Tenho que fazer isso todos os dias, ou a bateria não aguenta 24 horas. Nem 12 horas, falando nisso.
Abri o meu notebook e comecei a escrever um texto. É o meu hobby, escrever histórias quando não tenho nada para fazer. Ainda acho que um dia vou publicar um livro.
Não sei quanto tempo se passou quando estava me divertindo escrevendo. Várias horas. Mas só notei o tempo quando vi que já se passava da uma da manhã.
O sono estava fazendo minhas pálpebras ficarem pesadas.
Peguei minha escova de dentes – e a pasta, claro – e me arrumei para ir dormir.
Desta vez, não demorou muito para eu pegar no sono.
Foi só fechar o olho e pronto.
Como sempre, eu tive um sonho estranho.
Mas aquele foi diferente.

Não sei bem aonde estava.
Parecia uma floresta, algo assim. Tinham muitas árvores altas e fechadas em cima, fazendo do clima gélido e úmido.
Estava correndo. Não sei porque, ou do que ou de quem estava correndo. Mas estava.
Já tinha perdido o meu fôlego. Mas continuava seguindo em frente, sem parar para descansar ou respirar um pouco. Parecia estar realmente assustada.
Foi um pouco depois que percebi o fogo. Ele estava me cercando. Seja para qual lado eu olhava, ele estava lá. Ao meu redor.
Na frente. Aos lados. Atrás.
Por algum motivo, me deu vontade de me virar. Acho que para ver se aquela pessoa – ou aquela coisa – ainda me perseguia.
As árvores que uma hora foram verdes e sadias, agora estavam perdendo suas folhas e morrendo. Eu pude ver isso. As belas árvores pela qual algum momento passara, se transformaram em feias e sem vida.
E eu perdi o equilíbrio.
E eu caí.
E torci o tornozelo.
Aquela dor aguda de ter torcido alguma parte do corpo me invadiu. Eu gritei, mas ninguém parecia me escutar. Nem nada, nem ninguém. Provavelmente por não ter uma única pessoa ou animal por lá.
A essa altura, já estava desesperada.
Senti o fogo me alcançando. Senti o fogo queimando minha pele. Senti o fogo tomando o meu corpo inteiro.
E senti uma dor maior ainda. Senti a dor de ser queimada até a morte.
Pelo que dizem, esse é o pior jeito de morrer.
E foi quando eu lembrei que era somente um sonho.
E foi quando eu acordei aos berros no delicado quarto do hotel.
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Camellia -Crimson Line- Empty Re: Camellia -Crimson Line-

Mensagem por Nanda Sáb Jan 21, 2012 3:38 pm

Nossa muito perfeito Talita.
Cada palavrinha fez a Fanfics se tornar maravilhosa.
Amei.
Teremos mais em breve?
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Mensagem por miaDamphyr Seg Jan 23, 2012 2:11 pm

Olá Talita, bem, em primeiro lugar dizer que tens aí uma história um tanto curiosa. Digámos até boa, pela parte em que nos deixa num suspense, e com a vontade de saber o que se segue ou o porquê. Mas em contra partida tenho algumas críticas, que não sei se estarás disposta a ouvir, daí surge a pergunta. Caso não, não faz mal. Mas também não gosto de estar a dar a minha opinião sobre o trabalho das pessoas, e ser mal recebida. Beijos
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