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O Filho dos Mares

2 participantes

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O Filho dos Mares Empty O Filho dos Mares

Mensagem por Lieh Dom Dez 11, 2011 6:04 pm

O Filho dos Mares Capa

Olá para todos! Eu comecei a postar essa fic em outros sites, então eu vou postar aqui também. Hum, comentários são importantes, óbvios. Eu posto um capítulo por semana. Minha primeira fic de Percy Jackson e espero sinceramente que gostem. Ela tem um Tumlr também.

Informações:

Shipper: Annabeth Chase & Percy Jackson

Censura: K+ (13 anos)

Sinopse: Annabeth recebe uma missão. Grover encontra um semideus filho de um dos Três Grandes, e tem como tarefa levá-lo em segurança ao acampamento. No entanto algo dá errado. No meio da jornada, o semideus é seqüestrado por um pirata lendário pelo simples fato dele ser O Filho dos Mares.

Observações: A fanfic é baseada nos filmes “Piratas do Caribe”, no livro do escritor escocês Robert Louis Stevenson, “A Ilha do Tesouro” e em lendas e pesquisas da autora, além claro da série “Percy Jackson & Os Olimpianos”. Contém spoilers da série, principalmente do livro “O Mar de Monstros”. A fic também seria um "universo alternativo" para o primeiro volume da série, "O Ladrão de Raios".


Trailer


Última edição por Lieh em Qua Dez 14, 2011 5:28 pm, editado 1 vez(es)
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O Filho dos Mares Empty Prólogo

Mensagem por Lieh Dom Dez 11, 2011 6:14 pm

O monstruoso navio singrava as águas brilhantes do oceano em algum lugar próximo ao canal do Panamá. A noite estava tempestuosa, rajadas de ventos balançavam os mastros do “Queen Anne’s Revenge*”, uma sombra fantasmagórica e sinistra, assim como o seu capitão.

Velas negras decoravam a embarcação, uma delas, a maior, exibia uma caveira de olhos vermelhos cor de sangue, ornamentada com raios de fogo a sua volta, enquanto esqueletos decoravam a proa do navio denotando a ameaça que aquela embarcação era.

Não só a tempestade agitava o “Queen Anne’s Revenge” naquela noite. O mar também estava trabalhando furiosamente contra o navio, fazendo-o balançar descontroladamente para todos os lados. A tripulação tentava de todas as maneiras controlarem a embarcação, mas os esforços só estavam indo de mal a pior.

Na cabine do capitão, o ocupante estava sentado numa mesa de carvalho, nela espalhada vários mapas para todos os lados. Seu nome: Edward Teach ou Barba Negra, o temido pirata, filho de Ares, o deus da guerra. Possuía uma enorme cabeleira oleosa negra, assim como sua barba. As vestes eram antiquadas como se ainda vivesse no século XVIII: botas de couro, calças pretas presa com um grande cinto em onde ficava em um lado a pistola e no outro uma bela espada, a Espada de Tritão, roubada do próprio, e um casaco de pregas de mangas longas. Era robusto de um olhar feroz, fazendo jus ao termo intimidador.

Não havia nada no mundo que abalasse aquele pirata, pois não era à toa que era temido por todos os marinheiros que cruzasse seu caminho, porém naquela noite era diferente. Barba Negra estava preocupado, não com a agitação das águas, aquilo era um problema menor em comparação com o fato de seus dias estarem contados. Nada poderia ser pior do que ter como inimigo o Deus do Mar.

Poseidon deixou claro na última conversa nada agradável que tiveram que sabia sobre os planos do pirata em se aliar a um antigo inimigo dos deuses do Olimpo, o titã Cronos. Na verdade, Poseidon já foi muito condescende com o “Queen Anne’s Revenge” deixando-o intacto por anos para evitar um conflito com Ares, mas aconteceu que Barba Negra já saiu dos limites da paciência do Deus do Mar há muito tempo, com a imprudência do capitão, as guerras constantes com outros navios e as maldições lançadas por aí a esmo, em que uma delas ironicamente caiu sobre a tripulação do “Queen Anne’s Revenge”, sem mencionar a visita de um traidor dos deuses que só piorou a situação do pirata quando o tema daquela conversa chegou aos ouvidos de Poseidon.

Barba Negra levantou-se cambaleante pelos movimentos bruscos do navio e pelo excesso de rum no sangue. Ainda segurando uma garrafa quase vazia da bebida, fitou uma pequena janela do fundo da cabine que mostrava de forma lateral a proa, em que um tripulante tentava puxar um dos mastros que balançava furiosamente ao vento. Parecia que Zeus também estava zangado com ele. Tomou um enorme gole de rum, a bebida escorrendo pela barba imunda, soltando um grande arroto.

Por mais que tentasse, a conversa que teve com o Deus do Mar num bar em Tortuga o atormentava.

Barba Negra estava sentado numa mesa de bar tomando seu precioso rum. A música estava alta e animada, bêbados cantavam desafinadamente, outros bêbados gritavam e quebravam mesas e garrafas, ou ainda estavam aos beijos com as prostituas locais. Era uma típica festa de piratas, ladrões e mercenários. O bar era escuro, iluminado fracamente por luzes vermelhas e pela lua alta daquela noite quente de verão. Toda a tripulação do “Queen Anne’s Revenge” ocupava o bar, todos alegres pela vitória daquele dia contra Long John Silver, com quem tiveram um pequeno confronto em altar mar, a quem Barba Negra odiava com todas as forças.

A disputa entre os dois piratas era de anos, seja por um navio, seja por uma donzela, seja pelo porto de alguma cidade. Entretanto daquela vez era algo mais sério. A disputa era por um precioso mapa, tão antigo quanto os deuses, que indicava o caminho para um grande tesouro perdido e escondido em alguma ilha do Caribe. Era um tesouro incomum, que não dava só riqueza para o possuidor, mas também uma espécie de poder sobre os sete mares... A única parte ruim da lenda desse tesouro era o chamado sacrifício de um semideus para o possuidor conseguir o poder que tanto deseja, além de descobrir com quem está o mapa. Barba Negra expulsou esses pensamentos sombrios da mente. Pensaria nesses problemas depois, naquele instante só queria beber seu precioso rum e encontrar um corpo quente de uma donzela para relaxar.

Lembrou-se da visita de um jovem semideus naquele mesmo dia, logo que desembarcou no porto de Tortuga e sorriu. O rapaz conseguiu uma audiência privada com o pirata, algo sobre aliar-se a um poderoso titã, ajudando-o a chegar ao poder no Monte Olimpo, e em troca teria total liberdade e autonomia sobre o mar, sem nenhum Poseidon para ditar regras. Ele, Barba Negra, seria o senhor supremo dos mares, tudo o que ele almejava há anos. Obviamente que suspeitou da oferta, afinal era só um moleque que dizia aquilo, mas no final das contas o rapaz o convenceu após o pirata ter ouvido a promessa feita a ele pelo próprio Senhor Titã, em sonho.

Ficou em transe por alguns minutos que pareceram horas e deve ter adormecido, pois quando acordou estava esparramado numa cadeira de um dos quartos de estalagem daquele bar. Sonhou que estava debruçado sobre um enorme abismo que irradiava fogo e quentura, em algum lugar obscuro. Tinha certeza que estava no Mundo Inferior debruçado sobre a entrada do Tártaro, onde lá uma voz fria e demoníaca conversava calmamente com ele repetindo tudo o que o rapaz havia dito ao pirata, minutos antes. Acordou num salto, com o coração quase saindo pela boca. Eram poucas coisas que deixavam Barba Negra assustado, e pode ter certeza uma delas era o Tártaro. No fim aceitou a oferta do mensageiro do Senhor Titã, juntamente com um juramento de sangue efetuado entre ele e o rapaz, garantindo a lealdade do pirata com o titã e a promessa do mesmo.

A felicidade de Barba Negra foi perturbada fracamente, pois não pensou o que o seu pai, Ares iria fazer se soubesse da aliança, porque logicamente, ele era um olimpiano, inimigo do titã. Logo deixou esse pensamento de lado, pois não devia nenhuma satisfação ao pai. Conversou com ele poucas vezes e nessas poucas vezes, Ares quase o esfolou vivo pela língua afiada do pirata. Não devia nada a ele, nada pessoal. E continuou com sua alegria.
Mas não durou muito.

Um belo homem, vestido de forma cordial e elegante, com uma blusa de linho branco de pregas e mangas longas, calças escuras e botas de couro, sentou—se na cadeira em frente ao pirata. Tinhas cabelos escuros e rebeldes e olhos verde-mar. Era realmente atraente, pois algumas mulheres se insinuaram para ele quando entrou, mas ele as dispensou educadamente. Barba Negra não precisou pensar muito para descobrir quem ele era, por mais que ele não seja rápido no quesito inteligência.
- Edward Teach.
- Poseidon.

Os dois se encararam. O deus com um olhar mortal, enquanto o pirata pousava a garrafa de rum calmamente sobre a mesa, tentando disfarçar o nervosismo. Não gostaria de demonstrar fraqueza diante do Deus do Mar.

- Você sabe muito bem o motivo de eu ter vindo aqui, Edward – Poseidon olhou em volta franzindo o nariz, murmurando – Esse lugar é repugnante – cravou o olhar novamente em Barba Negra – Não tenho muito tempo, meu caro pirata, portanto vou direto ao assunto. Já suportei demais todas as suas trapalhadas, brigas e confusões, Edward, no entanto uma traição é imperdoável. Não interessa como eu soube. Você abusou da minha bondade com você e com o seu barquinho...

- Senhor, sejamos racionais – começou Barba Negra – a oferta a mim oferecida era boa demais, não havia como recusar. Aliás, minhas condições são precárias. Estou sem o mapa que tanto desejo, até fui atrás de Silver para saber se ele foi o último portador do objeto, mas o canalha não quis revelar nada, por isso o ataquei deixando o “Hatred Of The Sultan*” caindo aos pedaços, mas não fique zangado, aquele velho gagá perna de pau conserta aquela velharia mais rápido que terminar uma garrafa de rum, e com as promessas do titã conseguirei o meu objetivo, a não ser que o senhor esteja propenso a me ajudar a encontrar o mapa, daí poderei repensar a minha decisão.

Barba Negra sabia que estava sendo mais do que arrogante com o deus, mesmo assim ele iria tentar tirar vantagem daquela situação difícil. Afinal ele era um pirata. Só mais tarde foi perceber o quão estúpido ele foi, em dizer aquilo, porque nem que ele, Barba Negra virasse padre, que Poseidon iria ajudá-lo a encontrar um mapa que levava a um tesouro, que dava poder supremo sobre o mar.

Por um momento deteve a esperança que Poseidon iria aceitar o acordo, porém a expressão de puro ódio no rosto do deus deixou aflorar o medo no pirata, fazendo a mão que estava apoiada próxima à garrafa tremer, engolindo em seco.

- Sem acordos ou chantagens, Edward – cuspiu Poseidon entre dentes – Minha paciência com você acabou. Agora você e o seu barquinho irão sentir a fúria do Deus do Mar toda vez que você e sua embarcação estiverem a bordo.
O deus agarrou o punho do pirata, que estava apoiado na mesa perto da garrafa, abrindo a mão áspera dele à força.

- Ao contrário de você, eu cumpro minhas palavras, pirata, e você vai ter um encontro com um dos meus bichinhos. Seu tempo acabou. – Poseidon deu tapa na palma da mão de Barba Negra com força. Levantou-se com um estrondo, dirigindo-se a porta do bar. Antes de sair completamente para os becos movimentados de Tortuga, disparou: - Espero que você desfrute da companhia dele quando encontrá-lo.

E desapareceu.

Grudado na cadeira, de olhos arregalados, Barba Negra levantou a mão que recebeu o tapa, temendo o que veria. Fechou os olhos, depois os abriu e encarou.

Gelou.

Na palma da mão se formava uma horrível mancha escura, estendendo-se até a metade dos dedos.

- O Kraken – sussurrou numa voz de túmulo.


Barba Negra voltou à realidade com uma sacudida brusca do navio, quase derrubando os candelabros do teto. Encarou a mão com a mancha, seu decreto de morte. O Kraken perseguiria aquele que carregasse a Mancha Negra.

Poseidon o condenou a uma morte terrível.

O pirata não tinha mais escolha. Sua única chance de verdade era em se unir ao Senhor Titã e derrotar o Olimpo.

As coisas só começaram a melhorar quando chegou uma Mensagem de Íris do moleque do tal de um Acampamento Meio-Sangue. O pivete pedia para ele, Barba Negra, seqüestrar um semideus que estava chegando ao acampamento nos próximos dias ao lado de um jovem sátiro, mantendo-o prisioneiro no navio, aportando o “Queen Anne’s Revenge” na costa leste, na Califórnia e esperasse a ordem final, em que levaria este semideus até o Tártaro, pois o Senhor Titã desejava conhecê-lo. Óbvio que Barba Negra não gostou nenhum um pouquinho de receber ordens, porém mudou de idéia quando o moleque mencionou que o reconheceria pelo nome do garoto e por uma mancha pequenina no punho dele em forma de um tridente, deixando escapar que o pirata deveria seqüestrar “o filho de Poseidon e levá-lo sem problemas até a Califórnia e aguardar”.

Barba Negra aceitou o dever a ele incumbido, contudo possuía outros planos para o filho de Poseidon.

A porta da cabine se abriu violentamente, e uma bela mulher vestida propriamente como uma pirata exclamou:

- Capitão, estamos esperando suas ordens!

Barba Negra se virou e a fitou sarcasticamente.

- Vamos mudar de rota, Mary, e navegar sempre no raso. Iremos seguir para o norte até Virgínia, no EUA. De lá iremos para Nova Iorque, onde mais um tripulante será adicionado a nossa humilde embarcação. Estamos procurando um garoto chamado Perseu Jackson.

N/A: “Queen Anne’s Revenge” é “O Vingança da Rainha Anna” em português e esse navio, de acordo com as minhas pesquisas, realmente pertenceu um pirata que atendia pelo nome de Barba Negra, ou Blackbeard, em inglês. “Hatred Of The Sultan”, ou “O Ódio do Sultão” é um nome de navio pirata que eu inventei, porém Long John Silver é um pirata que pertence ao escritor Robert Louis Stevenson, no seu livro “A Ilha do Tesouro”.


E aí, o que me dizem? bounce
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O Filho dos Mares Empty Capítulo I - Notícia e Devaneio

Mensagem por Lieh Dom Dez 11, 2011 6:57 pm

Avisinho: a fic está pronta até capítulo 4, mas por hoje, só vou postar o primeiro. Comentem!

Annabeth

Acordei assustada naquele início de manhã. Eu sabia, pois ainda não havia amanhecido totalmente, e meus irmãos continuavam dormindo nos beliches próximas, porém havia pequenos raios de sol saindo pelas frestas da janela, que ficava próxima a minha cama.

Encarei o teto sem piscar, com medo de fechar os olhos e voltar a ter aquele sonho esquisito.

É comum, nós semideuses, termos sonhos bizarros, mas aquele sonho parecia muito real. E assustador.

E sempre o mesmo sonho. Não era a primeira vez que eu sonhava que estava numa espécie de calabouço, trancada numa cela com grossas grades de ferro. Eu sempre ficava em pé em frente às grades, e na minha direção havia outra cela, a de um garoto que estava amarrado por correntes nas mãos e nos pés preso à parede. Ele me encarava suplicante pedindo para ajudá-lo a se libertar, o problema era que eu estava tão presa quanto ele, mesmo não estando acorrentada. Eu forçava as barras, tentava abrir o cadeado com um grampo de cabelo, em vão. O garoto suspirava tristemente, me encarando em seguida com um olhar... Carinhoso. E dizia sempre

-Estou muito feliz de ter conhecido você, Annabeth. Obrigado.

E eu sempre acordava.

Eu tentei de todas as formas quando sonhei da primeira vez voltar ao sonho para ver se eu descobria o que aconteceria comigo e com o garoto. Tá legal, não adianta mentir, eu tentava voltar ao sonho por dois motivos: primeiro eu tinha a impressão que o conhecia, e segundo... Err prefiro deixar para lá, eu não sou nenhuma filha de Afrodite para ficar pensando nessas coisas. Eu sou Annabeth Chase, filha de Atena a Deusa da Sabedoria. E o mais sábio que eu concluí naquele momento era que eu não desejava mais voltar a dormir.

Mesmo sendo ainda muito cedo, me levantei, fui ao banheiro, tomei um gostoso banho matinal, vesti meus velhos jeans e minha puída camiseta do Acampamento Meio – Sangue, e meu idoso Converse, e saí tentando fazer o mínimo de barulho possível para não acordar os meus irmãos que dormiam a sono alto.

Lá fora estava um clima gostoso de verão. Ainda não estava quente para fazer suar, mas também não estava frio. Era um clima ameno e equilibrado naquela manhã, e já estava quase amanhecendo. Resolvi dar um passeio até o lago da canoagem e esperar o sinal para o café-da-manhã.

Chegando ao lago, sentei-me na beirada, e encarei as águas limpas. Fazia anos que eu estava no acampamento, quase dez anos. Eu cheguei por volta dos sete anos e eu já tinha quase dezesseis. Meu cabelo loiro estava mal amarrado, deixando sair uns fios rebeldes, parecendo que eu acabei de levar um choque, meu rosto estava pálido e sem cor, e meus olhos estavam cansados.

Tanto tempo treinando, aprendendo e ensinando os calouros que chegavam ao acampamento, e eu não fiz nada mais do que isso. Nunca recebi uma missão, nenhumazinha. Muitos meio-sangues que chegaram ao acampamento na mesma época que eu já havia enfrentado o mundo lá fora o suficiente para escrever um livro. Todos, menos eu. Até Luke, um dos meus melhores amigos já recebeu várias missões, algumas até bobas, mas recebeu. Ele já teve várias oportunidades de se provar, e colocar a teoria na prática, saber se ele realmente valia para alguma coisa. Não que ele não valesse... Você me entendeu.

Luke, filho de Hermes, eu e Thalia, filha de Zeus e Grover outro grande amigo, sendo ele um sátiro, viajamos juntos até o acampamento há quase dez anos atrás fugindo de monstros. Encontrei os dois alguns dias depois que eu, com sete anos, fugi de casa, e logo depois Grover nos achou. Acontece que eu era motivo de muitas brigas entre meu pai e minha madrasta, ela que não ia muito com a minha cara por atrair monstros, e meu pai... Por simplesmente não gostar de mim e achar que eu um fardo para ele.

Desde então o Acampamento Meio-Sangue é o meu lar, no entanto um alto preço foi pago para eu estar aqui, que foi o sacrifício de Thalia para salvar a mim Luke e Grover. Voltei o olhar para as colinas na entrada do acampamento. Lá havia um grande pinheiro. Olhar para ele sempre apertava meu coração, pois era o pinheiro de Thalia transformada pelo seu pai.

Voltei a fitar as águas. Eu precisava de uma missão. Eu precisava saber se eu não era uma inútil, uma fracassada, se que tudo o que eu aprendi ia servir para alguma coisa. Era esse o meu objetivo, além de ser tornar uma grande arquiteta, construindo um monumento de duraria séculos.

Mas só depois que eu receber uma missão. Eu estava tão desesperada que aceitaria qualquer coisa. Qualquer coisa mesmo.

A trombeta para o café-da-manhã soou. Levantei tomando um susto, pois não percebi que fiquei bastante tempo parada a beira do lago. Dirigi-me até o pavilhão do refeitório para iniciar mais um dia da minha rotina. Um dia que eu esperava que fosse igual aos outros.

Como eu estava enganada.


Estava tomando meu café normalmente com os meus irmãos do chalé 6. Ainda estava com os mesmos pensamentos da beira do lago, e no sonho daquela manhã. Por isso não notei os burburinhos que os campistas fizeram quando Quíron sentou-se a mesa junto com o senhor D.

Olhei em volta e vi duas garotas cochichando freneticamente olhando para Quíron. Estavam as duas do meu lado, e como a curiosidade dos filhos de Atena é tanta que chega a doer, eu também queria saber qual era o motivo de tanta fofoca.

Cutuquei a garota que estava sentada ao meu lado.

- Ei, Carol, o que está havendo?

Ela me fitou um pouco contrariada. É porque eu a impedi de mordiscar seus biscoitos com geléia.

- Você não soube Annabeth?

-Não soube de quê?

- É aquele sátiro, o Grover – disse ela voltando a se concentrar no seu café, esperando que eu tivesse entendido o que ela quis dizer. Veja bem, eu sou uma filha de Atena que possui como qualidade destacável a inteligência, não sou adivinha. Essa tarefa é do Oráculo.

- O que tem o Grover?

Sinceramente eu estava preocupada. Eu não via Grover há dias.

Carol revirou os olhos.

- Francamente Annabeth, que mundo você vive? Não tem outra coisa que o acampamento inteiro não esteja falando. Grover saiu em missão e Quíron o acompanhou, lembra? Por Zeus, você não estava sabendo?

Confesso que eu estava me sentindo muito idiota naquele momento, a ponto de querer bater a minha cabeça na mesa ou numa pedra pela minha estupidez.

Óbvio que Quíron acompanhar uma missão de um sátiro, era algo raro. Só acontecia quando se tratava de um meio-sangue muito importante, ou poderoso.

Alguma coisa não estava bem, pois quando fitei Quíron conversando com o senhor D, parecia muito mais velho e cansado. O cabelo juba de leão estava desgrenhado mais do que o habitual e seu rosto sem expressão. Procurei Grover em todo o pavilhão, não o encontrando em lugar nenhum.

Voltei a olhar para Carol que ria histericamente com a amiga sentado ao lado.

-Hã... Carol?

Ela se virou com uma careta para mim.

- O que foi?

-Quem é o meio-sangue que chegou?

- Ele não chegou – suspirou frustrada. Não entendi se foi pela minha pergunta ou pelo fato do novato não ter chegado. – É isso que queremos saber. Era para Grover tê-lo trazido para cá ontem à noite, mas alguma coisa o impediu. Só o sátiro retornou quase morto, estatelado abaixo de uma das colinas da entrada do acampamento. Ele está na Casa Grande agora sendo tratado, porém ninguém sabe o que houve com o novato, e é por isso que Quíron está tão preocupado.

Assenti compreendendo e Carol se virou novamente para sua vizinha me ignorando. É, não sou a mais querida e popular do acampamento.
Voltei novamente à atenção para o meu café-da-manhã pensando sobre o que Carol contou. Eu iria tentar ver Grover depois da aula de Arco e Flecha naquela tarde, e ver se eu conseguiria saber mais detalhes do que aconteceu, como eu disse, a curiosidade dos filhos de Atena é difícil de saciar (se eu não disse, digo agora).

Naquela tarde caminhei depois da aula até a Casa Grande. Não sei explicar, mas um frio na minha barriga e uma ansiedade me acompanhou até lá. Eu precisava saber os detalhes do fracasso da missão de Grover e o que Quíron iria fazer daqui em diante. Óbvio que ele tentaria trazer o meio-sangue sumido para o acampamento, isso não havia dúvidas. E óbvio também que Grover não iria sozinho dessa vez. Com certeza o Conselho dos Anciãos do Casco Fendido não está nada contente com ele agora, e provavelmente outro semideus o acompanharia para ajudar...

Resumindo: Quíron vai convocar uma reunião no acampamento a qualquer hora e oferecer esta missão, e pode apostar que eu vou aceitar.

Só espero que ninguém também queira assumir a responsabilidade, do contrário as coisas vão ficar complicadas para o meu lado.

É difícil dois meio-sangues quererem a mesma missão, assim como é difícil o próprio Quíron oferecer uma. Poucas coisas haviam perturbado o Olimpo e o nosso mundo nos últimos anos, então missões se restringiam a coisas pequenas e específicas como arrumar a bagunça que os filhos de Hermes causaram em algum lugar de grande movimentação de mortais, seja numa estação de metrô ou numa loja (roubos aqui, roubos ali, algum monstrengo inofensivo assustando um mortal graças aos nossos adorados encrenqueiros), algum espelho favorito de Afrodite que sumiu (bom, essa é uma dessas missões que muitos querem assumir, menos eu: As filhas e filhos da deusa, por ficarem horrorizadas e querer a ajudar a mãe, e meio-sangues de outros chalés apenas para conhecer a Deusa do Amor... Se é que você me entendeu), e outras besteirinhas que não incluem risco de vida, uso da inteligência ou da força e perigo.

Nada que me interessasse.

Eu pressentia que trazer um meio-sangue que desapareceu misteriosamente ao acampamento, estudado pelo próprio Quíron, deve ser bem mais emocionante. Claro, eu não esperava nada de mais, talvez o garoto esteja perdido em Nova Iorque ou em algum outro lugar. O problema vai ser descobrir como ele se desencontrou com Grover, e como o sátiro apareceu desmaiado na colina. Eu ainda não havia chegado a uma explicação lógica.

Assim, absorta em pensamentos cheguei a Casa Grande e peguei o meu boné do Yankees que me deixava invisível, presente de minha mãe. Eu tinha o pressentimento que eu precisaria dele.

Adentrei a casa, sem encontrar ninguém, o que eu já esperava. Na verdade eu me sentia uma verdadeira bisbilhoteira. O que eu estava pensando?

Decidi acabar com isso de uma vez e procurar o Grover. Perguntaria a ele o que aconteceu, o confortaria e depois eu voltaria aos meus afazeres. Nada de idéias loucas sobre missão.

Isso, eu ia fazer exatamente o que era mais correto: não me meter...

É, grande porcaria, quem disse que consigo mentir para mim mesma?

Não sei se você já percebeu, mas tenho tendências a me perder na minha própria cabeça devido ao meu Fluxo de Pensamentos Constantes (FPC). Esse era um pequeno problema que os filhos de Atena têm que lidar, além dos problemas eventuais de todo meio-sangue como a dislexia e o déficit de atenção, inclua também o FPC, e teremos um semideus problemático. Até demais. É nessas horas que o meu FPC ataca de forma absurda que só o meu déficit de atenção trabalha a meu favor, como aconteceu naquela hora em que eu ouvi vozes na varanda, despertando-me. Estava tão perdida que nem percebi que estava parada na porta desde a hora que cheguei.

Isso, Annabeth continue fazendo papel de louca que muito em breve você vai conseguir uma participação na novela das oito...

Expulsei todas as idiotices que invadiam minha mente, coloquei o meu boné e fui até a varanda, já sabendo de quem eram as vozes. Não preciso dizer que era Quíron e Grover, né? Você já deve ter deduzido isso sozinho (a). Ou deveria...

Em fim, não importa.

A porta que dava para a varanda, como já era de se esperar estava aberta. Encostei-me lá casualmente, como se também eu fosse uma convidada para o bate-papo. Deitado numa espécie de cama estava meu velho amigo sátiro, com o braço esquerdo enfaixado numa tipóia, os cascos com pequenas bandanas, assim como a cabeça. O rosto estava com pequenos arranhões, e demonstrava cansaço. Quíron estava em sua cadeira de rodas, o disfarce que usava quando queria se passar por humano, e ouvia atentamente o que Grover dizia.

-Estou dizendo Quíron: já era! Dancei, game over, fim! Depois do desastre dessa missão, nunca vou conseguir minha licença de Buscador, nem hoje e nem se o senhor D entrasse num regime.

- EU OUVI ISSO, FILHOTE DE CAVALO! – gritou o senhor D de onde quer que esteja.

- Foi mal! – replicou Grover – Como eu dizia Quíron, eu não tenho a mínima chance de trazer Percy de volta. Olha o que aconteceu comigo quando tentei brigar com aqueles feiosos – ele apontou para o braço enfaixado, suspirando – Acabou. Não vamos vê-lo tão cedo...

- Ora, pare com isso Grover. Vamos sim trazer o garoto para o acampamento, mas é você quem tem que fazer isso, Grover, e você sabe disso. Você precisa convencer o Conselho a lhe dar mais uma oportunidade, e completar a missão, só assim você vai conseguir sua licença de Buscador. Obviamente que você não irá sozinho, porque você vai precisar de ajuda para encontrar Percy Jackson, ainda mais se ele estiver a bordo do “Queen Anne’s Revenge”...

Grover estremeceu, fazendo uma careta, enquanto Quíron franzia a testa. Como eu captei a metade da conversa, fiquei confusa também. Então, o meio-sangue foi seqüestrado? E o que tem a ver esse tal de “Queen Anne’s Revenge”? Não é um navio lendário?

-Por enquanto, eu acho que devemos esperar a decisão do Conselho hoje à noite, Grover, antes de tomar qualquer atitude...

- Quíron, não vá me dizer que você vai convocar uma reunião? Fala sério, isso vai ser humilhante demais!

- Grover, você quer ou não sua licença de Buscador? – indagou Quíron parecendo irritado com o chilique do sátiro.

- Sim, mas...

- E claro que para trazer Percy Jackson para o acampamento você vai precisar enfrentar piratas sanguinários, risco de morrer afogado, ou com a sua sorte, morrer em alguns dos confrontos que essa raça maligna causa em alto mar.
- Também, mas Quíron...

- Então, não temos mais nada a discutir até a noite, meu caro sátiro. Na reunião do Conselho vou interceder por você, e caso tenhamos sucesso, convocarei uma reunião com todos os líderes dos chalés e contar o caso. Acho que teremos uma missão... E espero sinceramente que dê tudo certo.

Quíron sorriu solidário para Grover, este com uma carranca enorme. Eu não o culpava. Eu entendia bem o sentimento de se sentir um inútil, o que eu tenho certeza que era como Grover estava se sentindo. Essa é um das poucas coisas que eu e ele temos em comum, essa idéia de sempre querer se por à prova. Desde o que aconteceu com Thalia, mesmo que já faz anos, Grover ainda não superou o fracasso, mesmo que só parcial, porque Luke e eu sobrevivemos dos monstros para contar a história, pois ele ainda se sente culpado e um perdedor.

- Bom, vou deixar você descansar... Porém eu acho que você ainda vai ter companhia, não é Annabeth?

Estaquei no meu lugar. De alguma maneira Quíron sabia que eu estava presente, mesmo estando invisível. E isso significa que ele sabe que eu estava espionando!

Oh meus deuses! Eu estava morrendo de vergonha, eu até podia sentir meu rosto queimando.

- Annabeth? – replicou Grover – Ela está aqui?

Quíron se virou para onde eu estava parada olhando diretamente para mim. Como sou tola, querer enganar um centauro que treinou vários meio-sangues! Ele já viu de tudo quanto é truques e disfarces, e não ia ser um boné da invisibilidade que o enganaria, além dos seus sentidos aguçados de centauro.

- Não se preocupe Annabeth – ele sorriu para mim – Eu sabia que você viria mais cedo ou mais tarde. Bem, vou deixar você conversar com Grover à vontade. – Virou-se de novo para o meu amigo – Cuide-se meu caro sátiro, e fique preparado para hoje à noite.

Ele arrastou a cadeira de rodas para a porta onde eu estava. Dei passagem a ele, e posso jurar pelo Rio Estige que ele estava rindo da minha cara de boba.

Humpf! Ótimo! Todo mundo gosta de tirar sarro da Annabeth. Acho que ao invés de eu ganhar um papel na novela das oito pela minha loucura (sério, esses escritores de novela estão com sérios problemas em criar personagens. Eu hein, cada um mais sem noção que o outro...), vou ganhar também um emprego num circo, aí todo mundo vai poder rir de mim à vontade...

Foco, Annabeth, foco, controla esse seu FPC.

Tirei meu boné, materializando-me diante de Grover, que por sinal levou um susto. Agora foi minha vez de rir.

- Olá, Grover.

- Ei, Annabeth, odeio quando você faz isso...

- Desculpe – dei uma risadinha – Mas sua cara foi engraçada.

Ele sorriu fracamente. Foi por pouco tempo, pois logo sua expressão murchou. Preocupado, percebi. Envergonhado também entra na classificação no olhar que meu velho amigo dirigiu a mim.

- Você ouviu tudo, né?

- Não tudo – sentei-me em uma cadeira em frente a ele – Só a parte de você enfrentar piratas sanguinários e o “Queen Anne’s Revenge”.
Grover reprimiu um balido de agonia.

- É a culpa é minha, eu não devia ter inventado de querer trazer o Percy durante a noite e sozinhos. Eu deveria ter esperado e pedido reforços a Quíron... Mas fui arrogante, eu pensei que eu daria conta sozinho. Estúpido demais, depois do Minotauro eu me desesperei...

- Vocês enfrentaram o Minotauro? Pode contar tudo desde o começo, eu quero saber o que aconteceu! – exclamei morrendo de curiosidade.

Grover respirou fundo e continuou:

- Percy enfrentou o Minotauro, eu só o ajudei como pude, não sei lutar muito bem. Foi assim que eu contei a ele sobre ele ser meio-sangue, etc. Estávamos voltando da escola, e como era ainda claro resolvemos dar um passei no parque. Agora que eu penso, foi realmente idiota. Quando vi o monstro farejando entrei em pânico. A sorte nossa foi que Quíron apareceu e deu a Percy Anaklusmos, do contrário...

Meus olhos brilharam de espanto. O garoto enfrentou o Minotauro sozinho! Claro, Quíron ajudou dando uma espada a ele, mas mesmo assim... Impressionante.

- Mas deu tudo certo, não é?

- Sim, Percy destruiu o bicho ficando com o chifre como prêmio, mas depois disso Quíron me advertiu a levá-lo de volta para casa, explicar tudo a mãe dele e partir para o acampamento no dia seguinte, que seria hoje. Esse foi o meu erro. Eu convenci Percy e Sally Jackson que ele deveria partir durante a noite, que eu o levaria em segurança. Por Zeus! – ele baliu de frustração – O que eu vou dizer a mãe dele? E eu já achava que estava encrencado o suficiente. O que eu podia fazer depois do que eu vi? Cruzes!

-Você se refere ao Minotauro?

- Não... Eu vi outra coisa... Ou melhor, pessoa espreitando na casa dos Jackson naquela mesma tarde. Foi por isso que eu parti com Percy durante a noite. Sally queria nos levar de carro, mas era muito perigoso, então ela nos pagou um táxi até Long Island... Mas deu tudo errado! Eu não cogitei a possibilidade dele estar nos seguindo, por pura burrice minha.

Eu já estava roendo as unhas de curiosidade e ansiedade àquela altura.

- Ele quem, Grover? Quem você viu espionando o tal do Percy?

- Ele, Annabeth... O capitão do “Queen Anne’s Revenge” – ele se inclinou olhando para os lados como se temesse o que iria dizer, sussurrando – Barba Negra, filho de Ares, juntamente com sua tripulação horrorosa – ele tremeu – Quando estávamos chegando ao pinheiro de Thalia, aqueles piratas fedorentos nos atacaram. Eram centenas deles. Barba Negra gritava para pegarem Percy, mas você sabe como é os piratas, não se contentarem em só amordaçar o coitado, ele tentou lutar, mas eram muitos e... – Grover engoliu em seco – Você sabe a maldição da tripulação do Barba Negra, não é?

- Sim, são todos zumbis feiosos durante a noite – respondi.

- Então... Eles queriam se divertir às minhas custas, provavelmente querendo fazer um churrasco de sátiro. Eles me pegaram e jogaram colina a baixo, rindo histericamente de mim. Bem que eu tentei lutar, o que não deu muito certo. Quando acordei, todo doído por sinal, Percy e os piratas haviam desaparecido.

Assenti, em silêncio. Grover deu um béé-e de frustração, pegando uma lata de refrigerante do chão, comendo a tampa. Enquanto eu estava digerindo toda a história que ele havia me contado.

Então realmente haveria uma missão. Quíron não ia deixar Grover ir atrás do Percy Jackson sozinho pelo fato dele ser prisioneiros de piratas.

É nessas horas que o meu FPC é muito útil. Havia um detalhe naqueles fatos que não fazia sentido.

- Grover?

Ele mastigou um grande pedaço de aço antes de responder.

- Sim?

- Tem uma coisa esquisita nisso tudo. Porque Barba Negra seqüestrou esse Percy Jackson? O que ele quer com esse garoto?

Meu velho amigo olhou para baixo indeciso, olhando de volta para mim. Comeu mais um pedaço da lata de refrigerante, soltando em seguida:

-Ah Annabeth... É porque Percy Jackson é filho de Poseidon, o Deus do Mar. Quíron e eu suspeitávamos há um tempo, mas depois do que aconteceu é certeza.

Foi naquela hora que eu queria bater minha cabeça na parede e ter seguido aquele velho plano de saber e deixar para lá. Não me meter ou querer a missão. Minha boca foi ao chão.

Não! Só pode ser uma piada!

Eu estava cogitando a possibilidade de salvar o filho do Deus do Mar, a quem a minha mãe Atena mais detesta!

Alguém, por favor, me leve para fazer companhia a Hades, eu seria uma ótima ajudante para Perséfone e seu jardim, porque qualquer coisa antes de irritar minha mãe se ela descobrisse o que eu queria fazer! Parece que não foi só Zeus quem quebrou a promessa de não ter mais filhos...

Porque nem se o próprio Poseidon implorasse que eu iria salvar o filho dele!

Não, essa missão não era para mim. Eu não estava tão desesperada assim a tal ponto de querer me rebaixar. Eu ainda tenho o meu orgulho, ok?

O problema era que eu queria a missão. Mais do que tudo.

Por hoje é só! Bjos!
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O Filho dos Mares Empty Re: O Filho dos Mares

Mensagem por Clara Lockwood Seg Dez 12, 2011 5:47 pm

Gostei muito desse cap.
Gosto muito de mitologia por isso estou gostando tanto dessa sua história , vc escreve muito bem,parabéns gostei muito.
E estou ansiosa por mais cap.
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O Filho dos Mares Empty Re: O Filho dos Mares

Mensagem por Lieh Seg Dez 12, 2011 8:36 pm

Clara, fico muito contente que vc esteja gostando. Logo posto os outros capítulos já prontos! Very Happy
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O Filho dos Mares Empty Capítulo II - Annabeth VS. Annabeth

Mensagem por Lieh Ter Dez 13, 2011 9:45 am

Já era fim de tarde. Eu estava sentada na porta do meu chalé, ainda com os pensamentos vidrados no que Grover havia me contado.

Não vou dizer que eu não estava ansiosa para a noite, onde tudo seria decidido. Mas eu também estava numa verdadeira luta interna, literalmente falando.

De um lado, estava a Annabeth que se orgulha de si mesma; a que pensa pela lógica e vê soluções simples para os problemas que a outra
Annabeth transforma no monstro mais indestrutível.

Senhoras e Senhores, na arena de combate Annie Racional!

Combatendo do outro lado da minha mente, está a Annie que só enxerga aquilo que deseja sem se importar com nada, que faz tempestade em copo d’água, e o mais grave para uma filha de Atena: toma atitudes sem pensar.

Apresento a vocês, Annie Sem Noção.

E lá vamos nós ao primeiro round da briga dessas duas pessoas que ao mesmo tempo são uma, que acabaram por resolver se dividir e transformar minha mente num ringue de boxe. E eu era a juíza.

Annie Racional se posicionava para os primeiros golpes. Avançou para Annie Sem Noção com um gancho de direita pronto para acertar bem no meio da cara dela berrando:

“Annabeth Chase, me escute! É ridículo essa sua preocupação com esta missão. Você não é obrigada a aceitar, não é da sua conta. Nossa mãe não vai apoiar você nessa empreitada. E mais: Você parou para pensar que como filha de Atena, se você for inventar de entrar num barco, Poseidon vai transformá-la em espuma do mar?! Pense Annabeth, e não deixe essa louca dentro de você domar suas atitudes. Você vai se arrepender desta missão guarde minhas palavras. Outras oportunidades virão, tenha paciência. Você esperou tanto tempo, então você pode esperar muito mais. Não seja precipitada e tola!”.

Com isso, Annie Racional concluiu seu gancho de direita, derrubando Annie Sem Noção no ringue. Ela se levantou em posição defensiva dos golpes de Annie Racional. Desviou dos socos da adversária, abaixou-se pronta para dar um uppercut*, desferindo:

“Annabeth, não dê ouvidos a ela! Essa é a sua chance, você não vai ter outra oportunidade como essa na sua infeliz vida! E daí que você tem que salvar um filho de Poseidon?! Grande cocozinho! Salve o idiota do semideus que se perdeu e prove que você não é uma inútil! Assim você terá mais chances de conseguir outras missões, sua boba! Não foi assim com Luke e Clarisse? Os dois começaram com missões insignificantes como essa! Em se tratando de nossa mãe, ela não vai ser cruel a ponto de atrapalhar sua vida, tudo pode ser negociado no diálogo. Você vai convencê-la!”

Enquanto terminou de falar, Annie Sem Noção desferiu o uppercut acertando em cheio o queixo de Annie Racional que tentou desviar, fracassando. Ela caiu de cara no chão praguejando os piores xingamentos em grego, e estou fazendo um grande favor a você em não repeti-los aqui.

Não precisei fazer aquele negócio de contar o tempo, pois Annie Racional se levantou e se posicionou novamente. O gongo soou e as duas voltaram a desferir socos, golpes e todas as demonstrações de carinho e amor que vemos numa luta de boxe.


Estava um caos! Uma dor de cabeça infernal se apoderou da minha mente, latejando e girando junto com a briga de Annie VS. Annie. Eu estava pirando.

- Argh, parem com isso! – gritei frustrada, batendo o pé e segurando a cabeça.

- Annabeth? – uma voz maravilhosamente conhecida me chamou.

Ah, deuses, agora que eu quero ir para o Mundo Inferior! Já falei que eu posso ser útil a Perséfone?

Senti meu rosto esquentar quando olhei para cima e dei de cara com um par de olhos castanhos claros, quentes e aconchegantes me encarando.

-Ah... Oi Luke.

Devo estar parecendo muito estúpida ou muito louca, porque Luke franziu as sobrancelhas para mim. Claro, tirando o fato de que eu estava gritando comigo mesma, ninguém ia pensar que eu enlouqueci. Hum-Hum.

- Você está bem, Annie? Parece cansada...

- Não é nada, só uma dor de cabeça passageira.

Ótima desculpa a minha. Luke já está acostumado em ouvir isso de mim, ele até brinca dizendo que eu penso demais e deveria dar férias ao meu cérebro. Naquele momento era o que eu mais queria.

Luke deu um sorriso de compreensão. E francamente falando, mesmo não sendo um sorriso de todos os dentes à mostra, foi o suficiente para fazer o meu coração disparar. Conheço-o há muitos anos, e desde pequena sempre o achei bonito, não vou mentir. Mas antes disso, eu o admiro muito.

Eu sempre quis ser corajosa, e tão boa espadachim como ele. Praticamente tudo o que eu sei de luta eu aprendi com Luke. Além disso, ele me protegeu e cuidou de mim quando eu era criança.

O sol estava se pondo e refletindo-se no cabelo cor de areia do meu amigo, deixando-o levemente dourado. Era um rapaz alto e atlético por treinar bastante. A única coisa que poderia ser considerada assustadora nele era a singular cicatriz branca que ia embaixo do olho direito até o queixo, como um corte de faca.

Luke se sentou ao meu lado no batente do chalé, observando os últimos raios de sol se esconder nas nuvens. A vista do acampamento era realmente linda, pois lá no horizonte era possível ver as águas do mar da praia do estreito de Long Island, e mais a frente, as colinas, misturando-se ao barulho do riacho e o cheiro da plantação de morangos.

Estava perfeito. Eu desejava do fundo do meu coração que aquele momento durasse para sempre. Luke sempre perto de mim, nós dois apreciando, juntos, aquela bela paisagem coroada pela inspiração de Apolo.

Suspirei de contentamento. Luke, que tinha os olhos fixos no horizonte, se virou para me encarar, feliz por compartilhar comigo aquele momento só nosso.

No entanto, sua expressão de repente ficou franzina, obscura. Ele passou a me fitar com um olhar penetrante.

- Luke? – o chamei.

- Annabeth, você gostaria que tudo isso durasse para sempre?

Não entendi o porquê daquela pergunta. Tive a leve impressão que ele sabia o que eu estava pensando.

- Você sabe Luke que por mim, certas coisas não mudariam – corei, esperando sinceramente que ele não tenha percebido – É difícil para mim, aceitar mudanças. Não sei dizer se isso é algo louvável ou um defeito meu... – Parei, olhando novamente para o horizonte escurecido. De alguma forma, eu não estava gostando do rumo daquela conversa. Algo em mim dizia que as coisas iam mudar. O problema é que eu nunca estarei preparada para mudanças.

Eu sabia que era covardia da minha parte querer que tudo durasse para sempre. Eu sabia que as pessoas mudam, o mundo muda constantemente, e que somos nós que temos que nos adequar a vida.

Eu sabia disso, entretanto, nunca compreendi e aceitei.

Porque eu tenho medo.

Essa é a grande verdade que eu jamais admitiria para Luke ou qualquer pessoa. Eu tenho medo de não conseguir me adequar ao mundo e suas mudanças, de não conseguir me encaixar, de me encontrar. Tudo iria evoluir melhorar, enquanto eu iria permanecer do jeito que estou: fraca.

Estremeci com esses pensamentos, estes os mais sombrios da minha mente, que eu fazia questão de empurrá-los para o canto mais obscuro tentando ao máximo não pensar neles.

Encarei Luke que olhava fixamente para o chão, ainda com aquela expressão sombria. Seja lá o que estivesse pensando, eram tão animadores quanto os meus FPC instigantes.

- Algumas mudanças são para melhor, Annie – começou ele olhando para mim dessa vez com um semblante mais suave – Às vezes é tão fácil se adequar quanto respirar, porque você nem percebe que alguma coisa mudou. Sua vida continua a mesma, assim como os seus sonhos e desejos. Nem todas as mudanças são ruins... – Ele suspirou olhando de forma distante para o horizonte – Algumas são necessárias... Mas não ruins.

Mordi o lábio inferior encarando o perfil de Luke. Definitivamente eu não estava gostando daquela conversa, porque senti um arrepio na espinha nada agradável, fazendo os pêlos dos meus braços eriçarem.

Nunca senti receio ou algo próximo do medo na presença dele, mas aquele silêncio aterrador foi uma exceção. Mesmo com a brisa quente de verão, anunciando a chegada da noite, ainda sim senti um frio anormal.

Levantei-me suspirando.

- Acho que é melhor nós irmos nos aprontar para o jantar... – declarei.

A expressão de Luke suavizou com aquele seu sorriso compreensivo... Porém, não era natural, era quase forçada.

- Pense no que eu disse Annabeth. Um dia você vai entender e verá que tenho razão. Até daqui a pouco.

Assim, meu grande amigo se retirou para o chalé de Hermes, deixando-me estática no meu lugar encarando suas costas.

Novamente o frio anormal e o arrepio na espinha se manifestaram.


Como líder do chalé de Atena, eleita por unanimidade mesmo eu não sendo a mais querida, porém a campista com mais verões, eu tinha como tarefa organizar os meus irmãos para nos dirigirmos para o pavilhão do refeitório. Nessa hora do dia, ou melhor, da noite, quando todos se encontram após um dia inteiro de atividades, é que aproveitamos para deixar o chalé em ordem. Falando assim até parece que nós campistas no geral somos muito organizados...

Doce engano seu.

Praticamente todos os chalés, com uma exceção talvez do chalé de Afrodite, estão sempre uma verdadeira bagunça. Quando eu digo bagunça, é uma bagunça mesmo. E pode ter certeza que eu e os meus outros irmãos estamos na lista de bagunceiros do acampamento, não no título de campeões, pois o chalé de Hermes detém a fama de bagunceiros desde sempre.

Mas posso dizer que a bagunça do meu chalé tinha um justificativa plausível: não era uma bagunça qualquer, era uma bagunça organizada!

Além do mais, eram coisas muito úteis e interessantes que ficavam espalhados pelo cômodo em que todos partilhavam, podendo ser chamado de uma espécie de sala bem ampla. Talvez os dormitórios fossem os únicos que seguiam os padrões de bagunça comum.

Então, antes do jantar, aproveitávamos o intervalo para deixar tudo bonitinho, mas é claro que eu vou dizer que cooperávamos uns com os outros e não brigávamos durante a arrumação.

Outro engano seu.

Meus irmãos discutem. Bastante. E eu, particularmente por ser a líder era a que mais discutia.

Provavelmente foi por isso que Grover se assustou um pouco quando chegou à porta do chalé e me encontrou tendo uma conversa agradável com meu querido irmão, Malcom.

- Eu já falei, e eu não vou repetir: esses mapas têm que ficar em cima das prateleiras! Se ficar em cima das mesas vai criar sujeira!

- Mas Annabeth – argumentava Malcom – Toda vez que nós precisarmos desses mapas vai bagunçar as prateleiras mexendo neles! Os mapas têm que ficar nas mesas! É muito mais fácil de alcançar...

Mesmo zangada com meu irmão, não pude deixar de rir com seu argumento. É que o coitadinho não foi abençoado com o pó de crescimento...

- Olha Malcom, me escuta: você não quer que algum bicho entre aqui no chalé e faça desses montes de mapa um ninho, ou coisa pior, né?

Meu irmão franziu as sobrancelhas com uma careta. No chalé de Atena é regra é essa: quem tem melhor argumento tem suas vontades correspondidas. Não era só por ser a mais velha que eu era a líder.

Grover pigarreou chamando minha atenção. Malcom continuava com a cara de quem comeu e não gostou, saindo então para terminar a faxina.

Dirigi-me a porta e cumprimentei meu amigo sátiro.

- Ei, menino-bode! Vejo que já está melhor.

A aparência de Grover estava bem melhor do que da última vez que eu o vi naquela tarde. Os arranhões no rosto não passavam de finas cicatrizes, os cascos estavam sem as bandanas. Só o braço que continuava enfaixado.

- É já estou melhorando... Eu vim perguntar Annabeth se você não quer me acompanhar na reunião do Conselho agora. – Ele engoliu em seco, me encarando de forma suplicante. Senti pena dele. E claro que eu iria acompanhá-lo, não ia o deixar passar por isso sozinho.

- Claro, Grover, eu só me pergunto se vão me deixar assistir a audiência.

- Ah, deixam sim, você é minha amiga, não se preocupe.

Grover olhou ansioso para a floresta mexendo no braço machucado. Respirei fundo dando um sorriso de encorajamento para ele.

- Espere só um minuto que nós já vamos está bem?

Ele assentiu, enquanto eu entrava novamente no meu chalé. Procurei Malcom e o avisei para continuarem a faxina que eu iria resolver uns problemas. Não lhe dei detalhes, mesmo que meu irmão tenha ficado se roendo de curiosidade. Alguns dos meus companheiros me olharam feio quando me viram abandonar a arrumação. Dane-se, Grover era mais importante naquele momento, depois eu me entenderia com os meus irmãos.

Juntei-me ao meu amigo sátiro nos dirigindo para a floresta. O percurso não era longo, mas pareceu que foram horas, porque nós dois ficamos num silêncio tenso. Já havia escurecido há um tempinho, o que deixava o clima bem assustador. Ao longe era possível ouvir o barulho dos grilos e da correnteza do riacho, mas mesmo essa demonstração de vida não me deixou mais tranqüila.

Entramos numa pequena trilha de folhas secas, cortada bem no meio de densas árvores. Lá na frente um conjunto de folhas formava um portal para a entrada de uma pequena clareia, e como eu vivia há muito tempo no acampamento eu sabia que atrás daquela clareia era possível chegar ao rio.

Adentramos, já com todos os participantes da audiência presentes, incluindo os três anciãos sátiros, Quíron e o Senhor D. Algumas dríades e naíades também estavam presentes.

Os anciãos olharam para Grover quando ele entrou no campo de visão deles. O ancião do meio não parecia contente com o que via.

- Está atrasado há dez minutos, Sr. Underwood.

As orelhas de Grover ficaram vermelhas.

- Desculpe senhor.

- O que esta meio-sangue faz aqui? – perguntou o sátiro da direita. Eu não me recordava os seus nomes, pois eu sempre fazia confusão. Eles eram muito parecidos.

-Estou o apoiando, senhor. Grover é meu amigo – respondi de forma corajosa, encarando os três sátiros firmemente.

- Que seja, vamos começar logo com isso porque eu quero jantar.

Adivinhem quem disse isso? Se você disse senhor D acertou!

Hoje e como sempre ele continuava com as suas vestes havaianas com estampas de tigre, bermudas e sandálias, sentado, ou melhor, esparramado numa cadeira de praia, deixando sua volumosa barriga em destaque. O senhor D seria um ótimo garoto propaganda de marca de sandálias, tipo as Havaianas ou alguma cerveja.

A imagem que me veio à mente era hilária e precisei de todo o meu autocontrole para segurar o riso: Dionísio num comercial de TV da Brahma, no meio de uma roda de pagode na praia, cheia de mulheres de biquíni, com ele levantando uma garrafa dizendo: “Brahma, resfreca até pensamento!”
Que horror!

Já pode parar Annabeth, eu deixo.

Ok.

- Sr. Underwood, aproxime-se.

Grover olhou para mim e eu tentei lhe transmitir o melhor sorriso de encorajamento, murmurando “Boa sorte”.

Meu amigo foi até o que parecia ser o centro da clareia, se posicionado em frente aos anciãos do Conselho seguidos Quíron e o senhor D, ficando de costas para mim. Quanto a mim, fiquei um pouco atrás dele, próximo a uma bela dríade que olhava fixamente para a cena que se desenrolaria a seguir.

O sátiro do meio, que eu acabei lembrando que se chamava Sileno, dirigiu-se a Grover:

- Sr. Underwood, explique-se sobre o fracasso de sua missão e o porquê do meio-sangue que lhe foi designado a proteger e escoltar até o acampamento não estar presente.

Grover estremeceu nervosamente, iniciando sua narrativa, os mesmos fatos que contou a mim naquela tarde. Não vou dizer que vê-lo tão aflito e nervoso não me deixou no mesmo estado. Porém a dríade que estava próxima a mim parecia que ia desmaiar a qualquer momento.

Após alguns minutos, Grover concluiu a sua história. O silêncio que se instaurou foi tenso, antecipando as palavras dos conselheiros. Os três sátiros estavam sussurrando freneticamente. Ficaram assim por mais alguns minutos o que me deixou muito impaciente e mais nervosa.

Em dado momento, Quíron também entrou na conversa, mas por mais que eu apurasse meus ouvidos não era possível entender o que diziam, e eu temia me aproximar mais. Achariam que eu já estava abusando, já que não era nem para eu estar presente. Dionísio continuava esparramado na cadeira parecendo entediado só prestando atenção na conversa.

As dríades e naíades também estavam tendo sua assembléia particular, discutindo sobre o que Grover havia contado. Elas não falavam de forma baixa como os outros. Meu velho amigo sátiro parecia entender a discussão do conselho, pois ele estava mexendo novamente no seu braço enfaixado, significando que não era algo de bom. Eu conhecia Grover o suficiente para saber que quando ele está nervoso tende a ter tics.

Passado alguns instantes que pareceram horas, o conselho encerrou a assembléia particular, dirigindo-se novamente para Grover. Dessa vez o sátiro da direita que perguntou o que eu estava fazendo lá, Leneu, dirigiu-se:

- Sr. Underwood, o senhor tem consciência que essa foi a sua segunda chance, em decorrência do fracasso total de sua última missão. – Ele parou olhando para mim, deixando-me constrangida e com raiva. Ele estava falando de Thalia, Luke e eu, claro. – Portanto, o correto seria que nós não o deixássemos receber nenhuma missão por um longo tempo, ficando o senhor confinado no acampamento por tempo indeterminado, sendo decidido posteriormente a carreira que o senhor iria seguir o que já deixo bem claro que não seria a de Buscador de Pã.

Grover baliu nervoso, apoiando-se de um casco para outro. A dríade ao meu lado soltou um soluço alto, fazendo meu amigo se virar para ela.

Ele disse alguma coisa quase inaudível, e pela leitura de seus lábios percebi que ele disse “Júniper”. Ela por sua vez sufocou outro soluço. Não entendi.

Leneu olhou desdenhoso para a dríade que parecia se chamar Júniper, fazendo-a se encolher, continuando:
- Contudo, e o senhor tem que dar graças aos deuses por isso, Quíron convenceu o conselho a lhe dar uma última chance. E essa é a última mesmo, Sr. Underwood. Fracasse e as chances de você conseguir sua licença de Buscador será zero. Para isso, o senhor terá que trazer o meio-sangue perdido sã e salvo para o acampamento, podendo pedir ajuda a algum campista...

O sátiro da frente, Sileno riu de forma irônica. O sátiro da esquerda, que eu me lembrei que se chamava Maron, parecia entediado. Minha raiva era tanta que eu já estava enxergando tudo vermelho. Vamos ver se ele continuaria com esse sorrisinho irônico se eu o colocasse num espeto!

Se bem que carne de sátiro não deve ter um gosto muito bom...

Eca! Eu não ia querer comer esse burro!

- Por fim, Sr. Underwood – continuou Leneu – Termine sua missão de forma satisfatória. O senhor não tem um histórico muito bom. Então aproveite essa oportunidade. O senhor pode partir amanhã. Essa reunião está encerrada.

- Graças aos deuses! – exclamou o senhor D levantando-se e indo em direção ao bosque levando sua cadeira de praia.

Quíron sorriu para Grover de forma encorajadora. Não sei qual foi a resposta dele, porque não vi sua expressão. Ele se virou para onde eu estava juntamente com a dríade chamada Júniper, que parecia bem mais calma, porém seu semblante ainda demonstrava preocupação.

- Bom, não é tão ruim – comentei com ele, nós dois já próximos – Além do mais você pode pedir ajuda...

- Sim, Annabeth, mas que campista vai aceitar essa missão junto comigo?

Olhei de forma nervosa para as árvores. Eu ainda estava em conflito comigo mesma sobre aquela missão, mas eu ainda não havia cogitado a possibilidade de Grover me querer como companhia. Mas era o que estava parecendo porque ele olhou de forma muito significativa para mim.

Júniper aproximou-se mais chamando por Grover. Os dois se dirigiram para um canto mais afastado da clareia, conversando rapidamente.

Levantei uma sombrancelha. Estava acontecendo alguma coisa entre esses dois que eu não estava sabendo.

Já estava me retirando em direção ao bosque perto da trilha, quando Quíron aproximou-se de mim trotando ao meu lado.

- Vejo que é um resultado já esperado – começou ele – Grover vai se sair bem se tiver as companhias certas. Apenas dois campistas, obviamente, com um deles liderando – Ele olhou de esguelha para mim fazendo o meu estômago dar voltas. – Após o jantar vou convocar uma reunião com os líderes do chalé e oferecer a missão. E eu espero sinceramente, Annabeth que você aceite.

Eu parei de caminhar bem no meio da trilha de folhas secas, com Quíron na minha frente, fitando-me.

- Quíron, eu desejo a missão, você sabe disso. Mas...

- Mas?

- Eu não posso – suspirei frustrada – Não posso me aventurar em alto mar e ainda por cima salvar um filho de Poseidon.

- Ora que isso, Annabeth. Não deixe os conflitos entre sua mãe e o Deus do Mar influenciar sua decisão. Esses problemas se restringem aos dois, os filhos de ambos não têm nada a ver com isso. Em relação ao seu temor ao mar, acho que pode ser resolvido com uma pequena oferta a Poseidon – Continuamos a andar dessa vez em silêncio.

Quando já estávamos chegando à área dos chalés, Quíron voltou-se novamente para mim:

- Pense nisso, Annabeth. E não tema o que Lady Atena vai achar. Tudo pode ser resolvido no diálogo. – Ele piscou de forma marota e continuou andando me deixando sozinha com os meus pensamentos.

Suspirei em frustração. A briga dentro de mim, entre os meus eu só ficou pior. Annie Racional VS Annie Sem Noção gritavam e se batiam dentro de mim.

Enquanto a minha decisão final ficava cada vez mais confusa.

Mas eu não tinha tempo. Eu precisava terminar a faxina do meu chalé, meus irmãos não estavam nada contentes em eu tê-los deixado, enquanto a reunião de Quíron seria dali a pouco, depois do jantar.

Eu tinha que decidir, e uma vez decidida eu não ia voltar atrás.

Algo dentro de mim já dizia a resposta para aquele conflito. Resolvi ouvi-lo e seguir seus conselhos.

Então me decidi.

A Annie Perdedora caiu no ringue com um belo cruzado de direita, enquanto a Annie Vencedora pulava em vitória.

*N/A Uppercut: golpe desferido de baixo para cima visando atingir o queixo do oponente.

Comentem, comentem!!! pirat bounce
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O Filho dos Mares Empty Capítulo III - Nadando

Mensagem por Lieh Ter Dez 13, 2011 10:23 am

Não vou dizer que os olhares de cumprimento dos meus amigos de acampamento estavam resolvendo o problema do meu estômago que dava milhares de voltas, ou das minhas mãos suadas. Também não vou dizer que eu estava confiante com a minha decisão e que pensamentos como “Tudo vai dar certo”, ou “Eles vão te apoiar” estavam preenchendo minha mente.

Nem um pouquinho de nada disso. Minha cabeça estava vazia como uma bexiga que foi estourada ficando só a borracha murcha. É nessas horas que eu percebo o quão covarde eu sou, ou então questiono a minha sanidade mental.

Estávamos todos reunidos ainda no pavilhão do refeitório, naquele momento apenas ocupado pelos representantes de cada chalé. Formando um círculo meio irregular, sentados nos bancos de pedra, a minha esquerda estava Silena Beauregard do chalé de Afrodite. Mesmo nunca admitindo isso em voz alta, minha colega tem uma beleza de dar inveja: cabelos escuros ondulados, rosto angelical cheio de covinhas, alta e de olhos negros. Definitivamente a rainha da beleza.

Do lado de Silena estava Charles Beckendorf líder do chalé de Hefesto, que faria qualquer monstro correr gritando pela mamãe de tal intimidador que ele é. Afroamericano, alto, corpulento e de uma força absurda de tanto trabalhar nas forjas. Quando olhei para ele, era um dos únicos que não pareciam ansiosos com a chegada de Quíron para começar a reunião, como era o meu caso e dos outros companheiros, porque Charles estava muito distraído com os cabelos de Silena. Abafei um riso pela cara de bobo dele, que ficava mais cômica por ele ser carinhosamente um grandalhão.

Na minha frente estava Katie Gardner do chalé de Deméter que também parecia muito tranqüila, brincando com seus anéis. Ela não era tão exageradamente bonita como as filhas de Afrodite, mas tinha uma beleza natural, mais próxima da minha realidade: cabelos castanhos claros repicados até a nuca, estatura mediana, magra e bronzeada. Olhar para ela por alguns minutos me deixou até com um pouco de inveja, porque eu queria ter o autocontrole e a tranqüilidade que Katie consegue passar em situações tensas.

Ao lado de Katie, olhando para algum ponto fixo distante, estava Luke. Evitei olhar para ele, pois assim, eu não me lembraria da nossa conversa estranha que estava guardada bem lá no fundo dos meus pensamentos ainda me assombrando... Teria tempo para enfrentá-los depois.

Quase na extremidade direita do círculo estava Michael Yew, líder do chalé de Apolo, sendo ele muito parecido com meu irmão Malcom na altura. O rostinho de fuinha estava franzino, porque o coitado do Michael chegou um pouco tarde para jantar, logo ele não teve tempo de comer decentemente. Abafei outro riso pela expressão dele.

A última componente do círculo era Clarisse, filha de Ares, que de uns anos para cá, mesmo que ainda todos no acampamento estranhem, virou uma amiga. Clarisse era quase tão alta quanto Charles, possuindo grande força, isso só de perceber na largura dos braços branquelos, sendo tão intimidadora quanto, ainda mais pelo rosto de expressão feroz e feições duras, quase masculinas. O cabelo era mais curto que o de Katie, entretanto não eram muito bem cuidados, porque ficavam sempre amarrados num rabo de cavalo mal feito. Naquele momento Clarisse estava tão impaciente quanto eu, pelos braços cruzados e os pés batendo no chão.

Minha amizade com Clarisse é uma daquelas coisas inexplicáveis. Até hoje eu ainda não compreendo como duas pessoas tão diferentes conseguiram desenvolver uma amizade. Ela chegou alguns anos antes de mim, sendo uma das campistas mais antigas do acampamento, além de uma das mais velhas. Quando eu cheguei, logo nos meus primeiros dias fui surpreendida por ela que veio me dar às “boas-vindas” ao acampamento nos meus sete anos de idade...

Cansada, suja, precisando de um longo banho, andei pelo acampamento procurando Luke para saber onde ficava o chalé de Hermes para onde eu seria mandada por enquanto. O acampamento era enorme, o sol estava a pino, empapando minhas roupas já imundas de suor, e eu já estava quase entrando em desespero e pronta para abrir um belo berreiro, para ver se alguém me dava atenção, quando ouvi passos em minha direção.

Eu estava próxima a um lago bem bonito, com vários barquinhos flutuando. A água parecia estar bem deliciosa, me dando uma vontade de nadar. Será que teria peixinhos? Ou o Monstro do Lago Ness? Sempre quis conhecer o Monstro do Lago Ness, por causa de um filme bem legal que eu tinha assistido... Foi aí que eu funguei porque eu me lembrei da minha casa. Lembrei do meu pai que não gostava de mim e que me achava uma aberração, e da minha madrasta que sempre me culpava por tudo.
Não percebi por estar tão distraída (como sempre!) que os passos ficaram mais próximos. Olhando como eu estava para o chão, vi dois pés parados na minha frente. Olhei para cima e dei de cara com a menina mais feia que eu já vi. Era bem mais velha do que eu, só pelo tamanho dava para saber, e a cara feiosa estava arreganhada num sorriso sinistro.

- Olá, piolho – ela disse para mim – Está perdida? Quer ajuda? Ou um refresco, hein?
Minha cara foi do medo a confusão em segundos. Ela estava me querendo me ajudar? E ainda por cima me dar um refresco? Uau que garota legal, eu bem que queria uma Coca-Cola!

- Estou sim, e aceito sua ajuda.

Ela deu mais um daquele sorriso sinistro, o que me deixou um pouquinho desconfiada.
Minha desconfiança foi para certeza de que ela não ia me ajudar quando a feiosa me levantou do chão pelo pescoço como se eu fosse uma daquelas bonecas de pano que eu tinha visto numa loja de coisas velhas. Gritei de raiva e medo, pois ela estava me levando para o lago bonito.

- Aqui está o refresco, nanica!
Com isso a Grandalhona Feiosa me jogou no lago com toda a força.

A água estava muito refrescante, mas eu não sabia nadar, então afundei me debatendo inutilmente. Eu estava engolindo muita água. Eu não tinha forças nas pernas o suficiente para subir de volta, mesmo o lago não sendo fundo como eu pensei e nem havendo um sinal do Monstro do Lago Ness. Pensar nele só piorou as coisas. Ele era um cetáceo, mais conhecido como cavalo d’água, que eu sempre imaginei estar em todos os lugares com água o suficiente. E na situação ruim que eu estava como eu ia dizer para o Monstro que eu era uma boa menina e não ia machucá-lo?

Fiquei histérica. Eu engolia mais água a cada um segundo, que também entrava no meu nariz e ouvidos. Ia morrer.

Quando eu achava que eu partir dessa para melhor (ou pior), senti uma mão grande me puxando pelos cabelos, me fazendo soltar grandes bolhas pelo meu grito subaquático de dor. Dei por mim e já estava na superfície, respirando e engasgando, sentada na margem do lago.

A Grandalhona Feiosa foi quem me puxou. Ainda sim não fiquei agradecida. Por culpa dela eu ia morrer afogada ou virar comida do Monstro do Lago Ness, por não conseguir me comunicar com ele por linguagem de sinais!

Tossi e cuspi, voltando a tossir e engasgar, expulsando a água que eu tinha engolido. A Grandalhona Feiosa me olhava de forma divertida, mas percebi que era falso, porque ela respirava de forma engraçada e parecia tremer.

Olhei raivosa para ela, colocando-me de pé rapidamente. Eu não sei como eu consegui fazer aquilo, só sei que eu dei um belo chute na barriga da Grandalhona que foi pega de surpresa, caindo para trás direto no lago.

Ha! Toma essa feiosa!

Nem foi tão divertido porque ela sabia nadar ao contrário de mim, então ela logo saiu da água.

A cara da Grandalhona teria feito qualquer outra pessoa sair correndo, no entanto eu estava tomada de grande coragem vinda de não sei da onde. Eu era bem pequena e mais magra, o que me daria vantagem numa corrida ou na hora de se esconder. Ela não tinha cara de quem usava com freqüência o cérebro.

Ela ficou bastante irritada, cuspindo água na minha cara (eca!):

- Piolho irritante! É assim que você me agradece por ter salvado sua vida?!

- Salvou minha vida coisa nenhuma! – gritei de volta – Eu quase morri afogada por sua culpa!

- Eu tenho culpa de você não saber nadar?!

Minha cara deve ter demonstrado que ela havia me pegado, porque ela deu um sorrisinho satisfeito.

Eu realmente não sabia nadar. Queria muito ter aprendido ou alguém que tivesse me ensinado. Se eu soubesse nadar eu não precisaria ficar devendo um favor a Grandalhona Feiosa.

- Vamos fazer o seguinte – disse a ela – Você vai me ensinar a nadar.

- Por que eu faria isso, nanica? – ela arqueou uma sobrancelha torcendo a blusa molhada nas mãos.

- Porque teoricamente falando você nunca teria descoberto que eu não sabia nadar se você não me tivesse jogado na água, enquanto eu nunca teria vontade de aprender a nadar como eu tenho agora. Você quase me matou, mas acabou me tirando da água, ainda sim eu joguei você também no lago, o que se confirma que você está parecendo uma porca que rolou demais na lama. E pelo que vejo da sua personalidade você não é tipo de pessoa que gostaria de ser conhecida no acampamento por um apelido desses, não é?
Tudo isso eu falei rápido o suficiente para não dar tempo de ela me cortar ou querer torcer meu pescoço por tê-la chamado de porca imunda que rolou na lama.

Ela me fitou com uma expressão confusa.

- Garota, a única coisa que eu entendi desse monte de lorota que você falou, é que você fala demais. Qual é o seu nome?

- Annabeth Chase, indeterminada. E você seria...?

- Não é da sua conta – ela me respondeu carinhosamente.

- Mas como é que eu vou chamar você? Uma aluna precisa conhecer sua professora...

- Quê?! – A Grandalhona fez uma expressão muito engraçada.

- A minha professora de natação é claro - respondi simplesmente como se ela fosse uma débil mental – A não ser que você queira que todo mundo saiba que eu lhe dei um belo banho!

Ela arreganhou os dentes para mim, torcendo a blusa com mais força do que o habitual.

- Você nem vai ser louca de contar isso por aí, piolho, se não eu faço picadinho de você!

- Então me ensine a nadar que eu farei questão de armazenar esse nosso encontro na minha mente de forma alterada, sem você tomando um banho.

Ela suspirou de raiva o que eu interpretei como uma concordância.

Grandalhona Feiosa 1 X Annabeth 2!

- Está bem! – ela resmungou me fazendo abrir o maior sorriso – Eu te ensino a nadar pingo de gente, mas vou logo avisando: não vou ter pena de você!

- Ah não se preocupe comigo, eu sei muito bem me cuidar! – minha voz que deveria ter saído calma, acabou ficando um pouco debochada.

A menina começou a tomar o caminho por onde ela tinha vindo resmungando coisas sobre fazer uma empada de Annabeth.

Acabei me lembrando de que eu não sabia o nome da minha professora de natação.

- Ei! – gritei e ela se virou – Você não me disse seu nome!

-Clarisse, filha de Ares! – ela gritou de volta ainda com a voz demonstrando irritação, porém seu rosto ficou por um instante maligno – Espero que isso lhe sirva de aviso, piolho.

E ela continuou caminhando para longe de mim.

Mesmo sabendo que ela era uma filha de Ares vingativa e que faria picadinho de mim numa luta, eu com certeza era bem mais esperta do que ela, por isso não fiquei com medo, pelo contrário: eu havia conseguido, além de uma aula de natação, possivelmente uma amiga no futuro.


Dessa vez eu não consegui segurar minha risada com aquela memória. Todos olharam para mim pensando que eu tinha enlouquecido de vez.

Não me importei. Aquela com certeza eram uma das melhores lembranças que eu tinha, sem excluir as aulas de natação que eu tive depois, em que Clarisse mais me fazia afogar do que nadar de fato, mas acabei aprendendo no fim das contas.

E desde aquele dia que a filha de Ares se tornou praticamente a minha melhor amiga.

Voltei à realidade mesmo que a contragosto com a chegada de Quíron e Grover, logo atrás dele. Novamente fui tomada pela sensação de nervosismo.

Com toda a atenção no centauro, Quíron narrou novamente a história que Grover havia me contado, incluindo a decisão do Conselho. Com a narrativa terminada, um silêncio tenso se instaurou.

- Bom... Acho que teremos uma missão, não é Quíron?

- De fato, Srta. Gardner – respondeu ele – Grover não pode ir sozinho, então a missão está oferecida.

Percebi que aquele momento era a minha deixa. Respirei fundo e soltei:

- Eu aceito.

Todos os presentes me encaram. Os únicos que pareciam contentes eram Quíron e Grover, que estava bem aliviado. Os outros eram difícil entender suas expressões.

Katie me fitava com uma sombra de dúvida, Clarisse me analisava cogitando se eu estava bem de saúde, Silena parecia preocupada, Michael estava confuso, Charles demonstrava desconfiança... E Luke...

Raiva.

Raiva, só podia ser essa a interpretação da expressão dele. A testa franzina, o maxilar duro e os olhos apertados já eram comuns para mim quando eu o via com raiva de alguma coisa. Infelizmente ele só podia estar com raiva de mim.

Meu estômago estava tão cheio de borboletas que a qualquer momento eu ia colocar todo o meu jantar para fora.

Quíron pigarreou chamando a atenção.

- Então, alguém discorda da disposição de Annabeth em assumir a missão?

- Annabeth você só pode estar louca! – rugiu Luke em minha direção.

- Por quê? – discordei – Qual é o problema em eu assumir a missão?

- Err... Annabeth – intrometeu-se Silena – Eu não sei se você se lembra, mas sua mãe, Atena, e Poseidon não são os melhores amigos do mundo...

- Bom, se você está disposta a virar bolha do mar... – comentou Michael.

- Então, a Princesa já quer sair do castelo tão cedo? – mencionou irônica Clarisse.

- Isso é uma surpresa – emendou Katie.

- Eu não entendo vocês! Eu estou esperando uma missão há anos, e quando surge ninguém concorda!

A verdade é que eu já estava com raiva de todo aquele drama. Caramba, eu já estava decidida e ninguém ia me fazer voltar atrás! A sorte era que o Senhor D não quis estar presente na reunião, do contrário ele não ia pestanejar em não me deixar assumir a missão.

Cruzei os braços bufando de frustração.

- Acalmem-se todos – instruiu Quíron – E em minha opinião sincera, eu também não compreendo todo esse alvoroço. Em se tratando da rixa entre Atena e Poseidon eu compartilho da opinião que o problema entre esses dois deuses se restringe somente a eles. Seus filhos não são obrigados a se meter ou tomar partido. Se só for essa a discordância entre vocês, acho que já temos uma liderança, não é?

Olhei em agradecimento para Quíron. Ele sorriu e piscou para mim. Nunca em todos os anos que eu viver eu vou ser capaz de dizer a ele o quanto eu sou grata.

Meus companheiros de acampamento pareciam todos mais relaxados. Todos menos Luke.

Ele continuava a me dirigir aquela expressão raivosa, o que sinceramente me deixou com medo.

Eu não entendi o porquê daquela raiva. Eu pensei que Luke iria ficar feliz por mim, que ele iria me apoiar! Mas vejo que eu havia me enganado...

- Uma coisa eu não compreendo em relação a esse seqüestro – comecei expulsando a sensação ruim do olhar de Luke – É óbvio que esse garoto deve ser muito poderoso, ou como Quíron suspeita ser filho do Deus do Mar, porém o que será que esse tal de Barba Negra quer com ele?

- Sei lá, coisa boa não deve ser! Se esse Percy Jackson for mesmo filho de Poseidon provavelmente vão fazer dele um prisioneiro para usar os poderes dele, é óbvio – Pela primeira vez eu via Clarisse fazendo um comentário tão inteligente. É a convivência comigo, claro...

- Faz sentido, Clarisse – concordou Quíron – Eu também havia cogitado essa possibilidade... Porém eu não acho que seja só isso. Outra coisa que me incomoda é como Barba Negra descobriu sobre o Percy, inclusive quando ele ia chegar ao acampamento, pegando-nos de surpresa.

- Alguém informou a ele – respondeu Michael

- Um espião, só pode ser. Alguém muito próximo de Percy deve ter mantido Barba Negra informado – completou Charles.

Os olhares se voltaram para Grover, mesmo que involuntariamente.

- Epa! Nem olhe para mim! Eu não seria capaz de fazer isso!

- Claro que não Grover – acalmou Silena – Eu não acho que seja alguém próximo do Percy, talvez seja alguém do acampamento...
Eu não sei se foi sábio Silena ter comentado aquilo, visto que todos voltaram a ficar tensos novamente, inclusive eu.

- Ok, temos um espião entre nós. – concluiu Katie.

Se as coisas já não estavam boas, agora ficaram péssimas. Um espião no acampamento? Mantendo piratas sanguinários informados? Alguma coisa não fazia sentido.

Eu tinha a sensação nada boa de que havia bem mais naquela história do que se podia cogitar. Por mais que eu analisasse não sabia dizer o que era.

- Não vamos nos prender a esse detalhe no momento – Quíron encerrou a discussão – A missão será dada a Annabeth, todos concordam?

Olhei ansiosa para os meus companheiros. Eles pareciam concordar, exceto Luke que continuava calado, dessa vez fitando o chão.

- Sr. Castellan?

Ele levantou a cabeça olhando diretamente para mim. Temi o que encontraria na sua expressão. Não era um olhar de raiva, aquele era um olhar de apelo. Um apelo silencioso para eu não fazer o que eu estava prestes a fazer.

- Eu não concordo.

Suspirei tristemente. A aprovação de Luke me deixaria mais segura, mais certa do que eu iria fazer. Não ter ele me apoiando me fazia por um instante pensar que eu estava sendo realmente tola em assumir aquela missão. Logo eu expulsei aqueles pensamentos.

- Bem... A maioria votou a favor, então minha querida – Quíron voltou-se para mim – Está na hora de você visitar o Oráculo.


Meu andar de volta ao pavilhão do refeitório era lento devido as minhas pernas bambas. As palavras do Oráculo ainda estavam penetradas na minha mente como navalhas. Meu coração estava tão disparado que poderia ser escutado há milhas de distância, enquanto a minha respiração era descompassada.

Quando adentrei o campo de visão de todos, os olhares dirigiam-se a mim, ansiosos. Já era noite alta, e só os grilos cantavam alegres na floresta, e ao longe algumas corujas se juntavam a eles.

Estava cansada, tanto fisicamente como mentalmente. Eu não queria estar ali, eu queria estar na minha confortável cama dormindo num sono profundo. Era a única maneira de não pensar nas palavras do Oráculo.

- Recebi a missão – disse simplesmente.

Meus colegas sorriram para mim felizes. Tentei sorrir também, mas saiu apenas uma careta.

- As palavras do Oráculo, querida – Quíron disse para mim – Elas são importantes.

Engoli em seco. Ouvir já era bem ruim, agora repetir tornava tudo pior.

- Tu navegarás pelos mares infinitos... – comecei

- Isso é lógico! – exclamou Clarisse

- O navio amaldiçoado será reerguido...

- O navio amaldiçoado reerguido? Será que é o navio do Barba Negra?

- Não sabemos Srta. Beauregard, continue Annabeth – encerrou Quíron.

- Aquele que tem o poder do mar... - parei tentando acalmar meus nervos – Seus dias irão encerrar.

- Isso não parece ser boa coisa – falou Michael

- O filho dos mares tu encontrarás...

- Até que em fim algo de bom! – exclamou Grover – Isso significa que nós vamos encontrar o Percy, de um jeito ou de outro.

- Mais alguma coisa querida? A profecia não parece completa...

Olhei tensa para Quíron. Aquele último verso seria meu pesadelo eterno, não queria relembrá-lo, por isso menti:

- Nada, é só isso.

Óbvio que nem todos pareciam convencidos, até mesmo Luke. Quíron me fitou franzino a testa.

- Tudo bem então. Já temos um campista e um sátiro em missão, precisamos de mais um para completar três. Alguém se candidata?

- Eu vou.

Olhei pasma para o dono daquela voz, não só eu, mas todos os presentes. Eu não podia acreditar que depois de não ter concordado, Luke iria se candidatar a ser o segundo campista.

Lá no fundo eu fiquei feliz por pelo menos ele querer me acompanhar, porém alguma coisa dentro de mim dizia que não era certo...

Não, Annabeth. Ele não.

Assustei-me com aquele pensamento Definitivamente não era nenhum dos meus eu que falava comigo. Eu conhecia aquela voz.

Era minha mãe.

Minha mãe, Deusa da Sabedoria, me aconselhava a não escolher Luke. Por quê?

Se havia uma coisa que eu faria sem hesitar era seguir os conselhos de minha mãe. Eu desde sempre os escutei, desde o dia que eu fugi de casa com um bando de monstros no meu encalço. Minha mãe sempre me ajudou e me guiou nos meus momentos difíceis, de dúvida e de dificuldades.

Por isso, mesmo que não compreendendo as razões dela em me aconselhar a não escolher Luke para a missão, segui o conselho de minha mãe mesmo assim.

O problema seria como eu ia dizer isso a ele.

Não precisei passar por uma situação embaraçosa, porque graças aos deuses, Clarisse se ofereceu:

- Não, garoto, deixa que eu vá. Annie é inexperiente com missões, e você Luke é muito bonzinho com ela quando a Princesa faz algo de errado. Eu não. Ela vai ganhar experiência nem que para isso eu lhe dê uma boa surra.

Todos riram do comentário carinhoso de Clarisse. É claro que ela não está falando sério... Eu acho... Eu espero...

- Além do mais – continuou ela – Barba Negra, mesmo eu não gostando disso... Bom, ele é meu meio irmão...

Realmente ninguém havia percebido isso. Clarisse meia irmã de Barba Negra... Talvez fosse de alguma utilidade.

- Clarisse, eu vou! – Luke olhou com aquela sua expressão raivosa para minha amiga.

- Sinceramente moleque, eu não entendo porque você quer ir! –rebateu a filha de Ares.

- Já chega! Quem deve decidir é Annabeth – disse Quíron.

Os presentes me fitaram esperando a minha decisão. Oh, deuses! Que dia fatídico!

- Sinto muito Luke – disse eu suavemente – Mas talvez Clarisse seja mais apita para essa missão.

- Então é isso! Eu não sou bom o suficiente para te acompanhar, Annabeth? – disse ele exasperado.

Eu tentei ficar calma para não gritar com ele. Luke só estava complicando as coisas para mim.

- Não é isso, você sabe muito bem... – respondi controlando a voz – Porém eu sinto que Clarisse deve estar nessa missão, e ponto final.

Talvez eu fui um pouco grossa com ele, mas ainda sim eu estava no meu direito. Essa missão é de quem a afinal?

Quíron pigarreou. Eu não tinha percebido que eu e Luke estávamos fazendo uma cena, enquanto nossos colegas assistiam de boca aberta.

- Então está tudo em ordem – começou ele – Annabeth, Grover e Clarisse. Vocês partem amanhã depois do café. A reunião está encerrada.
Todos direto para os seus respectivos chalés.

Os campistas se levantaram arrastando bancos e fazendo barulho, e por um momento não parecia que estávamos discutindo. Levantei-me rapidamente querendo fugir para o meu chalé para não ser obrigada a conversar com Luke. Ao contrário do que eu pensava, ele não veio até mim, o que confesso me deixou chateada. Quem se aproximou foi Grover e Clarisse.

- Ei, Annie – Clarisse me chamou – Hã... Valeu por ter me escolhido. Eu já estava ficando entediada de só ficar treinando...

- Por nada, Grandalhona. E acredite eu conheço a sensação.

- Eu só não entendi o porquê de Luke ter agido tão estranho...

Engoli em seco. Eu não queria pensar nas razões de Luke seja ela qual for.

- Eu realmente não sei Clarisse. Falando sério, não quero descobrir...

- Bom, acho melhor irmos descansar. Eu preciso preparar as latas extras para a viagem – comentou Grover – Vejo vocês amanhã.

Despedimo-nos e cada um se dirigiu para o chalé, no caso de Grover, ele foi para a floresta.

Enquanto eu caminhava para o chalé de Atena só ouvi Clarisse gritando para mim:

- Não se atrase Princesa! Se não eu vou te afogar no lago com você dormindo!

Eu ri da ameaça. Se bem que eu deveria levar a sério em se tratando dela. Porém graças a Clarisse, agora eu sabia nadar, então não haveria problema de afogamento, ou até mesmo com o Monstro do Lago Ness.

É legal ter amigos bacanas para te apoiar nessas horas. Grover e Clarisse prometiam ser uma boa companhia apesar de tudo.

No fundo eu sabia que Luke deveria ter sido incluso nessa questão de amizade. Mas o comportamento dele estava me assustando. Eu continuava chateada com a atitude mesquinha que ele teve com Clarisse. Mas eu não queria pensar nisso. Não mesmo.

Tomei um demorado banho, vesti meu pijama e cai na cama, dormindo profundamente. Amanhã ia ser um dia tão cheio quanto foi hoje e eu precisava estar descansada e preparada.

Afinal eu iria aprender como é estar em missão, que pode ser tão perigoso ou emocionante quanto aprender a nadar. Eu só não esperava que todos os monstros fossem bonzinhos como o Monstro do Lago Ness.
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O Filho dos Mares Empty Capítulo IV - El "Karaboudjan"

Mensagem por Lieh Ter Dez 13, 2011 11:24 am

A fic está pronta até este capítulo.

A manhã chegou tão rápida parecendo que eu havia deitado há minutos, não horas. Despertei, espreguiçando-me calmamente. Um silêncio reconfortante pairava no chalé. Ao longe era possível ouvir os passarinhos cantando, e até mesmo o barulho do vento balançando a relva das copas das árvores. Tudo estava numa paz e tranquilidade tão grande que a única coisa que eu queria fazer era voltar a dormir.

Provavelmente era bem cedo, pensei. Ainda dava tempo de eu dormir mais um pouco.

Estava decidida a fazer isso, quando o barulho de uma porta sendo aberta violentamente me deu uma belo de um susto, fazendo-me pular da cama. Meus irmãos só podem estar brigando de novo, não era possível. Resolvi deixar para lá, já me virando para tirar um gostoso cochilo.

Porém quando dei por mim estava descoberta caindo no chão duro, enquanto uma voz raivosa gritava comigo:

- O QUE EU FALEI SOBRE SE ATRASAR, PRINCESA?!

Com mil demônios! - Xinguei mentalmente.

Clarisse me fitava tentando parecer brava, mas na verdade ela estava se segurando para não rir da situação ridícula que eu me encontrava.

Claro, se você estiver com uma blusinha e shortinho de ursinho, caída no chão, com os cabelos espetados para todos os lados e com cara de sono, faria qualquer um rir.

- Precisava me acordar com toda essa delicadeza, Clarisse? – repreendi minha amiga, levantando-me.

- Você está atrasada, Princesa. Muito atrasada. O café da manhã já está quase terminando.

- Não brinca?! – exclamei assustada – Inferno! Dormi demais!

- Sério? Nem percebi – continuou ela – Anda, vai se arrumar que eu trago algo para você comer. E não volte a dormir! Se não vou cumprir minha promessa de lhe dar um banho!

Clarisse saiu pisando duro, deixando-me com uma promessa reconfortante. Concluí que era melhor eu tentar consertar a besteira que eu fiz de dormir demais.

Que raiva! Logo na minha primeira missão eu já me atraso!

Xingando e praguejando, fui direto para o banho.


Com uma pesada mochila nas costas, com fome e a cara lavada, corri para o pavilhão do refeitório. Para o meu azar, o café já tinha terminado. Sentei-me sozinha no banco da mesa de Atena tentando conter minha respiração. Meu dia já começou muito bem, por favor, deixe pior.

Não fiquei sozinha por muito tempo, pois logo Clarisse apareceu com uma bandeja de café da manhã completo só para mim. Que Zeus a abençoe!

- Não se acostume, ouviu? Sua vida de princesa vai acabar logo, logo.

Sorri agradecida, atacando os pãezinhos e o leite quente. Não tinha percebido o quanto eu estava com fome.

Clarisse permaneceu quieta enquanto eu devorava o meu café da manhã, mas ela também tinha déficit de atenção como todo semideus, então não demorou muito para ela começar a andar de um lado para outro. Mesmo concentrada em comer, eu percebi que ela estava agitada e preocupada com alguma coisa.

- O que foi Clarisse?

- Eu estava pensando... – ela começou

- O que é algo raro – completei ganhando um olhar fulminante dela – Continue.

- Eu estava me perguntando por onde vamos começar a procurar o navio de Barba Negra...

Aquele era um problema que eu não havia pensado. Naquela hora, o famoso “Queen Anne’s Revenge” poderia estar a quilômetros de distância da costa de Long Island. Íamos ter mais trabalhado em encontrar o navio do que libertar Percy Jackson.

- Eu realmente não havia pensando nisso, Clarisse – respondi – Mas acho que começando a investigar no porto de Nova Iorque seria apropriado.

- Ainda sim vai ser complicado, Annie – ela suspirou – Esse navio é muito rápido e não temos ideia de qual será o curso que ele deve estar seguindo.

Arriei os ombros desconfortavelmente. Eu havia dormido demais, estava com a aparência de um espantalho, e ainda por cima não tinha bolado nenhuma estratégia para a missão. Palmas para a Annabeth!

- Não temos um plano melhor, Clarisse. Vamos pedir a Argos que nos leve até o porto de Nova Iorque, ok? Sei lá, um cruzeiro para o Caribe seria bom. É o único plano que temos.

Tentei soar corajosa e confiante, mesmo eu estando tão preocupada quanto ela.

Enquanto eu pensava no que ela me dizia, lembrei-me que eu deveria fazer uma oferenda para Poseidon. Normalmente as oferendas são feitas durante o jantar, mas isso não impedia de acendermos uma fogueira a qualquer hora. Então fiz exatamente isso.

Levantei-me sobre o olhar de Clarisse, carregando comigo alguns pãezinhos na manteiga intactos, e saí do pavilhão contornando as mesas.
A
trás da estrutura do pavilhão, havia um trecho de mata que seguia para o bosque. Lá encontrei alguns galhos secos e toras. Não percebi a aproximação de Clarisse até vê-la ao meu lado, me ajudando em acender a fogueira, em silêncio. Quando juntamos uma pilha de gravetos e folhas, ela tirou do bolso da calça um isqueiro de prata, aproximou-se da pilha e o fogo se alastrou.

Peguei o meu café da manhã da bandeja e joguei os pãezinhos na fogueira, deferindo em voz alta:

- Ó grande Poseidon, Deus dos Mares, dos Terremotos e Portador dos Cavalos, aceite esta oferenda em nome de uma filha de Atena e uma filha de Ares. Em troca nos proteja em seus domínios.

E não me transforme em plâncton, pensei.

Observamos enquanto os pãezinhos viraram uma bela fumaça azul que subia até o céu, com um delicioso cheiro de manteiga.

Ficamos em silêncio por alguns minutos observando a fogueira.

- Vamos? – Clarisse olhou para mim quebrando o silêncio.

- Vamos procurar o Grover - suspirei em frustração. Algo me dizia que as coisas só iam piorar quando de fato estivéssemos por nossa própria conta.


Encontramos Grover na Casa Grande conversando com Quíron e o Senhor D. Quando adentramos no campo de visão ele olhou para mim e para Clarisse de forma crítica.

- Então, espero que essas duas aí sejam úteis – disse ele para Quíron continuando uma conversa – Porque vamos ser francos, o bode é muito lerdo, a Carlota é muito esquentada, e a Annabell...

- Annabeth – corrigi. Já fazia anos que eu estava no acampamento, ainda sim ele insistia em dizer meu nome errado.

- Que seja. A queridinha do acampamento nunca saiu em missão. Não ponho fé nesse trio dinâmico.

Tentei ao máximo ficar calma e não falar nenhuma besteira para não inflamar a ira de Dionísio. Porém eu não estava tendo muito sucesso.

Clarisse não fez tanto esforço, olhando diabolicamente para ele. Grover se encolheu.

- Não sejamos precipitados, senhor D – respondeu Quíron – Tenho plena certeza que esta missão vai ser um sucesso.

Ele sorriu para nós três encorajando-nos, mas ainda sim não apagou a minha raiva do Deus do Vinho.

- Agora vão, já está ficando tarde.

Pegamos nossos pertences e nos dirigimos para o topo da Colina Meio-Sangue. Durante o trajeto, muitos companheiros acenaram e vieram se despedir de nós, inclusive a dríade chamada Juníper, o que deixou Grover bem sem graça. Eu esperava que Luke também viesse se despedir de mim, porém ele não veio.

Óbvio que fiquei chateada. Meu dia não tinha começado muito bem, ao menos eu queria ter uma lembrança agradável dele antes de partir, no entanto eu teria que enfrentar o mundo lá fora com a terrível sensação que Luke estava com raiva de mim por simplesmente ter aceitado a missão.

Olhei carinhosamente para o pinheiro de Thalia como uma prece silenciosa. Seria tão bom se ela estivesse comigo...

E com esses pensamentos felizes, nós partimos sem ter a certeza de quando veria o acampamento de novo.


Argos, assim como nós havíamos pedido, estava nos levando para o porto de Nova Iorque. Expliquei a Grover que esse deveria ser o primeiro lugar para começar, afinal não íamos nos deslocar por terra.

Tirando essa nossa pequena conversa, o caminho inteiro foi dominado por um silêncio assustador. Clarisse que estava sentada do lado da janela esquerda, seguida por Grover no meio de nós duas, e eu sentada do lado da janela direita, estava muito concentrada na paisagem da cidade que passava. Grover se encontrava comendo uma lata, com dó de acabar com ela. Ele havia colocado o boné rastafári para esconder os pequenos chifres e os pés falsos e tênis para esconder os cascos.

Quanto a mim, eu tentava acalmar os batimentos cardíacos do meu coração frenético e esconder minhas mãos que suavam. Não estava tão quente como nos dias anteriores. O sol estava escondido numa densa camada de nuvens negras já anunciando chuva. Mesmo assim, o dia estava abafado.

Encostei a cabeça no banco e fechei os olhos. Eu havia dormido muito mal, pois eu ainda estava com muito sono. A viagem iria demorar, nem no centro da cidade estávamos ainda, então resolvi que tirar um cochilo não faria mal algum.

Adormeci e tive um sonho perturbador.


No sonho eu não estava mais na cela trancafiada. O lugar era um amplo quarto apenas com uma cama, um candelabro no teto, uma escrivaninha e no extremo oposto, uma larga porta de madeira onde eu me encontrava parada. As velas pendidas do teto balançavam de um lado para outro devido ao movimento do lugar.

Sentado na cama de solteiro estava o garoto que eu havia tentado ajudar, agora sem correntes nos pés e nas mãos. Ele estava de cabeça baixa olhando para o chão e não havia percebido minha presença intrometida. Seus largos ombros estavam nus, meio caídos demonstrando preocupação.

O garoto levantou a cabeça fazendo o fogo das velas mostrarem metade de seu rosto, enquanto a outra metade ficou oculta nas sombras. Sem falar nada ele se levantou e deu dois passos na minha direção, o que encurtou a distância entre nós.

Ele era bem mais alto que eu, de porte atlético, vestido apenas com uma calça jeans. O peito largo muito bem esculpido iluminou-se fracamente pelas luzes das velas. Assim como os seus cabelos negros, bagunçados para todos os lados.

Mas não foi só a sua presença tão próxima de mim que me deixou sem graça e com o coração aos pulos. A intensidade daquele par de olhos verdes em chamas deixaria qualquer um desconfortável. O semblante parecia cansado e perturbado, mas de alguma forma que eu não sei explicar ele parecia me reconhecer e estar feliz por eu estar a ali.

- Desculpe – gaguejei – Isso é um sonho?

Ele sorriu de forma consoladora para mim, fazendo meu estômago dar voltas. Eu não conseguia desviar o olhar, porém alguma força do além me fez fitar o peito dele.

- Talvez – ele respondeu de forma divertida – E sinceramente eu preferiria continuar dormindo.

Essa última frase foi dita de forma um pouco melancólica com um quê a mais que eu não detectei a razão.

Ele percebeu o meu olhar indiscreto para ele, porque ele levantou uma sobrancelha e abaixou a cabeça. Posso jurar que vi um pouco de cor preencher suas bochechas mesmo na meia luz.

Limpei a garganta quebrando o clima desconfortável desviando o olhar dele mesmo que relutante. Olhei em volta.

- Que lugar é esse?

- Minha prisão em alto mar. Este é o navio de Barba Negra – respondeu ele.

- Então você é quem eu estou tentando salvar.

Ele ponderou por um momento essa última informação. De repente ele sorriu.

- Você está tentando me salvar? – ele parecia se divertir.

- Sim algum problema? – Querendo ou não fiquei com raiva, então minha pergunta saiu de forma áspera.

- Não entendo porque se dá ao trabalho... – O sorriso dele vacilou um pouco.

Eu tinha a minha resposta ensaiada e na ponta da língua, porém ficou entalado na garganta por causa da volta daquele sorriso dele e do olhar em chamas. Alguma coisa que ele viu em mim parecia agradar a ele, o que não ajudou no meu estômago cheio de borboletas e no meu rosto corado.

- Eu tenho os meus motivos – respondi simplesmente.

E que motivos.

Opa!

O sorriso dele só alargou mais o que me fez pensar como é que a pele do rosto dele não doía.

-Bom, um dia eu vou querer saber os seus motivos.


Acordei com o coração aos pulos. A van estava parada num sinal de trânsito. Estávamos quase chegando ao porto, já dava para ver o rio ao longe e alguns barcos que estavam partindo.

Olhei para a janela pensando no estranho sonho que tive. Dei graças a Zeus por ninguém ali ter a capacidade de ler mentes, porque seria muito constrangedor ter os meus pensamentos expostos naquela hora.
Um calor que não tinha nada a ver com o clima do dia se apoderou do meu corpo quando me recordei do garoto do sonho, ou melhor, o garoto que eu estava indo salvar, Percy Jackson. Era ele, isso é certeza.

E que gato!

Cala a boca!

Mandei os meus eus ficarem quietos porque definitivamente isso era constrangedor demais. Eu nunca havia pensado dessa forma tão indiscreta sobre qualquer garoto e não seria agora...

Por Zeus! Era só um sonho idiota!

Suspirei aliviada por estar finalmente saindo daquela van apertada.

Eu nunca tinha ido ao porto de Nova Iorque antes, o que explica a minha surpresa pela beleza do lugar. Ao longe era possível ver a Estátua da Liberdade na ilha da Liberdade, grande e imponente. Era de uma arquitetura incrível e muito bem feita, projetada por Bartholdi, um filho de Atena, que leva os créditos pela bela estrutura. O rio Hudson brilhava apesar das suas águas escuras, onde alguns poucos navios de carga estavam ancorados no cais, que era uma grade estrutura de concreto e ferros paralelos ao rio. Alguns marinheiros andavam para lá e para cá com caixotes se dirigindo para as avenidas próximas com caminhões esperando. Havia muitos turistas também que pareciam ter chegado à cidade recentemente, alguns com malas procurando algum táxi, outros parados conversando e tirando fotos da paisagem.

Argos já havia partido nos fitando por bastante tempo devido aos seus muitos olhos até o perdermos de vista.
Estávamos sozinhos, no meio do movimentado porto da cidade de Nova Iorque, com alguma comida, dinheiro de mortais, dracmas de ouro e a sorte dos deuses.

- Então? O que vamos fazer? – perguntou Clarisse.

Ponderei por um momento olhando atentamente por todo o cais. Um navio de carga me chamou a atenção, há bem uns duzentos metros de distância da plataforma. Tinha um formato irregular quase na forma de um triângulo, com o casco pintado de vermelho e alguns trechos em verde. A Ponte de Comando* se erguia imponente seguida pela chaminé logo atrás. O navio parecia estar abandonado, porque era o único que não tinha nenhum marinheiro entrando e saindo.

Sem olhar para os meus companheiros, caminhei até o navio. Já próxima dele, percebi o quão grande ele era mesmo para um navio de carga geral que não eram mais tão utilizados como os imensos navios petrolíferos. (Sim, eu havia feito um esforço com a dislexia e li tudo a respeito de navegação e tipos de navio, inclusive até tinha colocado alguns livros na mochila).

- Ei, o que estamos fazendo aqui? – interrogou Grover.

- Eu também gostaria de saber – completou Clarisse.

De repente eu tive um plano ao mesmo tempo idiota e perigoso, típico de semideuses.

- Vamos viajar neste navio – anuncie para os meus amigos como se eu fosse uma guia turística – Ele está deserto e se entrarmos ninguém vai nos ver. Podemos nos esconder no porão junto com a carga.

- Bem, entrar vai ser fácil, o difícil vai ser sair – ponderou Clarisse – E não sabemos qual é o destino dele.

- “Karaboudjan” * – falei.

- Quê? – perguntou Grover achando que eu tinha ficado doida.

- O nome do navio, é “Karaboudjan”. – apontei para a proa* onde estava escrito o nome em letras brancas, um pouco descascadas.

Clarisse resmungou:

- Urgh, não consigo ler este nome bizarro. Francamente eu não sei como você consegue ler, Annabeth.

- Prática – respondi orgulhosa – Minha dislexia não me atrapalha tanto, apesar de eu levar mais tempo para ler um livro sem ser em grego do que o normal, mas eu consigo.

Grover olhou para o “Karaboudjan” em dúvida.

- Não sei não. Esse navio me parece suspeito.

- Não temos muito tempo – encerrei a questão – É um navio de carga, e mesmo se o destino dele for muito longínquo, uma hora ou outra ele
vai precisar ancorar para reabastecer os motores. E a tripulação não deve ser muita.

Parei olhando para uma pilha de caixotes que eu não havia percebido antes, chamando-me a atenção. Aproximei-me, lendo as inscrições logo acima deles. Era em uma língua esquisita, provavelmente sendo o espanhol em tinta vermelha, o que era péssimo de ler para quem era disléxico:

Carga Perecedera
Mantenerse alejado
Transporte de los Estados Unidos em el Caribe
Unitego Industries LTD

- Caribe? – perguntou Clarisse. – O navio está partindo para o Caribe?

- Mas isso é perfeito, podíamos começar a investigar por lá. – comentei satisfeita.

Confesso que eu estava muito feliz pela nossa sorte. Na região caribenha as chances de sabermos informações de Barba Negra seriam maiores.

Clarisse e Grover olhavam para mim e para o navio a nossa frente, nervosos. Não vou negar que o meu plano era muito arriscado. As chances de sermos descobertos como passageiros clandestinos eram enormes. Era um verdadeiro tiro no escuro.

- Pensem comigo – comecei – O Caribe é uma região muito movimentada por navios, principalmente os piratas, porque é praticamente é uma terra sem lei. Podíamos começar procurando por lá...

- Não parece ruim – disse Clarisse – Só não me agrada viajar num porão de navio cheio de ratos.

- Não temos escolha. Todos a bordo! – falei. Meus amigos resmungaram um pouco, mesmo assim me seguiram.

Subimos a escada de embarque chegando ao convés. Não havia me ocorrido naquela hora que tudo estava ocorrendo fácil demais. Esse pensamento só viria bem mais tarde quando já estávamos enrascados.

A Ponte de Comando, onde se encontrava a cabine de controle, estava vazia como todo o resto do navio. Era muita irresponsabilidade, pensei, deixar um navio largado daquele jeito num porto movimentado como o de Nova Iorque, permitindo qualquer um embarcar clandestinamente, como nós. Os tripulantes pareciam ter confiança que ninguém iria fazer isso, só poderia ser essa a justificativa. Motivo? Não sei se era bom saber.

O navio não era muito grande na sua extensão superior. Fomos para a popa* que era onde ficava a abertura do convés quadrangular, logo atrás da chaminé, que levava até os deques, onde ficava a tripulação e o porão.

Um ruído e passos nos informou que os donos do navio estavam embarcando. A abertura do convés só permitia a passagem de uma pessoa por vez. A sorte nossa que a chaminé nos escondia da vista da proa.

Numa assembleia relâmpago, com os corações aos pulos, Grover foi descendo a escada da abertura, seguido por mim e Clarisse logo atrás.

A parte inferior do navio era muito escura cheirando a mofo. A única luz que vinha era da abertura do convés por onde tínhamos descido e pelas pequenas janelinhas circulares nas laterais da embarcação.

O deque onde estávamos seria onde os marinheiros dormiam pelas redes penduradas. Num sinal falei para seguirmos em frente. Um pequeno corredor escuro se abriu diante de nós seguindo para os outros deques. Lá em cima, os passos aumentaram denotando mais gente embarcando. Eu respirava tentando acalmar o meu coração. O silêncio era tenso enquanto atravessávamos o corredor. O único barulho era das nossas respirações descompassadas.

Parecia que o corredor não tinha fim e que tínhamos levado anos para atravessá-lo. Cada vez mais o escuro se intensificava, enquanto o corredor estreitava. Para quem tem certa fobia por lugares fechados eu sinceramente não recomendo. Ou para você que já sonhou que estava preso numa caixa que a cada segundo diminuía a ponto de esmagar você até a morte.

Nada agradável.

Eu estava pensando nisso quando num passo infalso, senti a ponta do meu pé esquerdo sem apoio. Se Clarisse não tivesse me segurado a tempo, eu teria dado o meu último passo, e adeus vida cruel. Eu iria rolar aquela escada enorme que se abria bater a cabeça e morrer. Já podia até ouvir a marcha fúnebre.

Meu coração foi até a garganta e voltou quando eu olhei para a altura que seria a minha morte. A escada era bem mais larga e extensa do que a do convés, onde levava para a parte mais baixa do navio, incluindo o porão.

- Obrigada – cochichei para Clarisse.

- Dispunha. Ultimamente eu só venho salvado sua pele. Você está me devendo.

Sorri mesmo no escuro de breu, agradecida pela amiga que eu tinha.

Tentando fazer o mínimo de barulho possível, mesmo que lá em cima no convés ninguém iria nos ouvir mesmo se gritássemos, fomos prudentes o suficiente (Ei, somos cuidadosos, tá? Tudo bem, não havíamos provado isso até agora, mas somos...), em não fazer tanto barulho.

Descemos e chegamos num amplo espaço, bem maior do que o deque superior dos marinheiros, cheio de caixotes cobertos por lonas.
Provavelmente eram os mesmos que vimos no cais.

Um pensamento horrível me ocorreu naquela hora.

- Os caixotes!

- Sim Annabeth, já sabemos que são caixotes – disse Grover gesticulando.

- Não Grover, os caixotes que estão lá fora! Eles podem trazer para o porão!

Clarisse engoliu em seco, Grover baliu nervoso e eu dei um belo tapa na testa. Eu queria me bater e chutar pela minha ideia estúpida, mas não havia como nós voltarmos naquela altura do campeonato.

Numa prece silenciosa, rezei para minha mãe que aquela possibilidade terrível não acontecesse.

Esperamos que a qualquer instante algum marinheiro viesse ao porão conferir a carga ou trazer aquela que estava no cais, nos metendo numa grande encrenca.

No entanto, nada aconteceu.

Ainda sim estávamos apreensivos. Tudo estava muito quieto, o que só me deixava mais nervosa. Por fim, cansados nos acomodamos no chão esperando o navio zarpar.

Não demorou muito e ouvimos o barulho da âncora sendo erguida e o motor sendo ligado. O navio oscilou um pouco quando se desprendeu, me fazendo cair meio de lado e Clarisse praquejar por ter batido a cabeça num caixote. Grover e eu não seguramos os risos, deixando a filha de Ares bem mais irritada.

No segundo seguinte, sentimos o navio deslizar pelas águas do rio Hudson. Aproximei-me de uma das janelinhas laterais. Suavemente o navio se afastava do porto indo em direção ao mar deixando Nova Iorque e meu confortável chalé lá no acampamento para trás.



Cinco desvantagens de se viajar num porão de navio
Por Annabeth Chase, Clarisse La Rue e Grover Underwood.


5. Você balança de um lado para o outro a cada manobra do navio, levando a carga junto ou ganhando um belo galo na cabeça;

4. Faça dia ou noite, mas você continua no escuro de breu. A única luz proveniente era da pequena janelinha, sendo totalmente inútil durante a noite, porque o escuro aumenta duas vezes, a não ser que tenha lua. (Grover que o diga);

3. Calor sufocante, espaço desconfortável, e todos os seus amigos fedendo a peixe podre;

2. Podemos fazer barulho, mas nós não recomendamos isso para que os tripulantes não pensem que sejam ratos e venham querer conferir a carga.

Sim, tivemos que nos esconder em baixo da lona, em cima dos caixotes quando dois marinheiros entraram no porão algumas horas depois que havíamos partido justamente trazendo a carga que vimos no cais, deixando num canto afastado. Não preciso mencionar o desconforto em dobro, ou em eu ter quase estrangulado Grover por fazer barulho com os cascos, ou pior ainda todo o peso de Clarisse caindo em cima de mim assim que os tripulantes saíram. Eu juro que ficou um hematoma no meu cotovelo por ter apoiado todo o peso do meu corpo e do dela na queda.

Di Immortales que sorte! Ou eles eram muito burros ou muito cegos por não terem percebido uma carga a mais.

E no primeiro lugar:

1. Você precisar escapulir durante a noite para os banheiros dos deques superiores enquanto todos dormem e para completar ter pouca comida e muito stress.

Tirando tudo isso, foi um cruzeiro bem agradável.

Percebemos que a tripulação eram todos estrangeiros, pois de vez ou outra nós conseguíamos os ouvir conversando acima de nós em espanhol.

O pouco contato que tivemos com eles só foi naquele dia tenso em que quase nos pegaram e a durante a noite quando subíamos para o deque superior fazer as necessidades físicas. Graças a Zeus nós havíamos trazido comida nas nossas mochilas, mesmo sendo apenas salgadinhos e refrigerantes, o problema era que até a comida estava acabando. Eu não imaginava que o Caribe fosse tão distante da costa norte-americana, mas era uma viagem em um navio e ele não era lá muito rápido.

Calculei que provavelmente estávamos navegando por quase uma semana. Era um alívio poder olhar as águas do oceano Atlântico se movimentando a cada avanço do navio e também por eu ter trago livros na mochila, do contrário eu já teria ficado doida confinada naquele lugar.

Por fora eu era a calma em pessoa, mas por dentro eu estava assim:

Ah! Eu quero uma comida decente que não seja Cheetos, quero minha cama, quero o meu ursinho Teddy e um banho! E cadê o Percy nessas horas para me consolar em sonho? Hein?!

É cadê o Percy, e toda a sua saúde para nos consolar?


Tudo isso era o que eu estava sentido e gritando por dentro (menos essa última parte... Tá, também essa última parte, feliz agora?), porém eu engolia esses meus protestos, abria um livro e deixava o tempo passar, ora lendo ora perdida nos meus FPCs.

Há! Autocontrole é uma coisa que eu sei fazer muito bem, obrigada. Eu deveria ganhar um prêmio por ser a garota com melhor autocontrole que existe.

Clarisse e Grover não estavam lhe dando muito bem com a situação como eu. Era visível na carranca deles e nas palavras carinhosas que trocavam.

- Grover, afasta esses malditos cascos para lá. Estão quase em cima de mim! – uivou uma Clarisse raivosa.

- Não enche Clarisse!

- Que diabos, eu quero deitar, minhas costas estão doendo de tanto ficar sentada!

- Pois deita, oras!

Grover estava com os cascos sem o tênis, esticado no chão do porão direto para Clarisse.

- Eu me deitaria se esse monte de pêlos de jumento não estivesse na minha cara!

- Ei, jumento é a vovozinha! – Grover agitou os cascos bem na cara da filha de Ares. Vi o cheiro de briga assim que olhei para ela. O olhar era puro ódio e posso apostar minha vida que ela iria partir para cima do sátiro, só que ele não estava ajudando provocando-a daquele jeito.

Apoiei o meu livro no colo, suspirando frustrada.

- Parem vocês dois! Isso não ajuda em nada na nossa situação – Fitei Grover em desaprovação – Você bem que podia tirar essa sua pata de
Clarisse, e você – Olhei para a minha amiga – Pare de agir feito uma criança. Os dois!

Recebi dois olhares raivosos em resposta, mas pelo menos Grover deu espaço para a Clarisse deitar. Era difícil a acomodação devido ao monte de caixotes empilhados. Eu havia arranjado um canto não muito grande para o meu tamanho na lateral do navio, na janela, enquanto os outros dois ficarão do outro lado, separados por caixotes e lonas.

Durante os primeiros dias tivemos uma grande discussão devido a uma descoberta que fizemos sobre a carga daquele navio.

Sem querer Grover desastrado do jeito que é, deixou cair um caixote que estava bem no alto de uma pilha provocando um barulho escandaloso. De dentro do caixote tubos cilíndricos escuros se esparramaram para todo o lado. Enquanto Clarisse ralhava com Grover, eu peguei um dos estranhos objetos. Era leve feito de um material vindo da madeira, eu tinha certeza. Cheirei e fiz uma careta.

Era tabaco. Vários charutos cubanos estavam naqueles caixotes. Eu sabia por causa das inscrições talhadas em cada lateral do charuto, no estilo Made In China, no caso, Made In Cuba.

Alguma coisa me dizia que a nossa situação só iria piorar com aquela informação.

Mandei meus dois companheiros calarem a boca e mostrei a eles os charutos.

- Sim, e daí? – perguntou Clarisse.

- E daí que eu acho esquisito um navio transportando charutos cubanos dos Estados Unidos.

- São se são cubanos, são de Cuba, certo? – disse Grover – Os charutos podem estar sendo distribuídos de Cuba para os outros países.

- Sério Grover? Que brilhante!

- Menos Clarisse – repreendi – O que eu acho esquisito é a troca com os Estados Unidos. Que eu saiba os dois países não se dão muito bem.

- Que seja. Não vejo no que isso vá nos ajudar...

- Você pode ter razão, Clarisse – franzi a testa, me calando.

Nos dias que se seguiram não consegui tirar aquilo da cabeça.

Eu desejei mentalmente que aportássemos logo em qualquer lugar. Eu não ia mais aguentar nenhuma dia naquele maldito navio como passageiros clandestinos tendo como companhia uma filha de Ares a beira de soltar fogo pelas narinas e um sátiro irritado, e muito provavelmente (eu esperava que eu estivesse errada!), uma tripulação de bandidos que faziam comércio marítimo ilegal.

Minhas preces foram atendidas.

A parte boa, iríamos sair do navio.

A parte ruim era que seria pulando dele, com vários tripulantes raivosos atrás de nós.

Aconteceu naquela noite. Ninguém estava conseguindo dormir por causa do calor e do balanço excessivo da embarcação, me deixando bem enjoada por sinal.

Nossos sentidos aguçados perceberam a aproximação de alguma coisa mesmo que essa coisa ou alguém não quisesse ser descoberto. Fiquei em pé imediatamente, com a mochila já nas costas seguida por Clarisse que também havia pegado a dela, e um Grover resmungando sobre enchiladas jogando a mochila dele nas costas também e calçando os tênis. Se precisássemos fazer uma fuga rápida não seríamos burros de deixar nossas coisas no navio. Havíamos combinado aquilo desde que embarcamos. Qualquer aproximação pegue tudo e caia fora. Como? Improviso, meu caro.

A escuridão só não era total pela janelinha, o que não era um consolo muito grande.

Por um momento eu achei que eu tinha imaginado o barulho, mas não tivemos tempo para nos esconder como na primeira vez.

Três silhuetas estavam na entrada do porão, paradas. Uma delas era a maior tendo um formato engraçado na cabeça. Só foi quando ela se aproximou de nós e da luz prateada da janela foi que eu consegui vê-la.

Complicando ainda mais as coisas.

Era o capitão do navio e a coisa engraçada na cabeça era o chapéu. Era um homem alto e queimado pelo sol, com um sorriso desdentado e sinistro para nós. Atrás dele estava um comparsa, bem mais baixo, forte e careca e quando se aproximou vimos uma horrível tatuagem de caveira no braço direito refletida pela luz da janela. O outro era um palmo mais baixo que o capitão, mas tão forte quanto o outro companheiro.

O capitão sem tirar o sorriso feioso da cara cumprimentou-nos:

- Así que aqui son los niños.

Tinha uma voz grave e um hálito que cheirava a cerveja de segunda linha. Gesticulando para os companheiros ele falou alguma coisa rápido demais para captar naquela língua horrível de entender. Eu tinha o básico em espanhol, mas não estava ajudando naquele momento.

Um comparsa, aquele que tinha a tatuagem, se aproximou do capitão, com algo brilhando na mão esquerda. Clarisse engasgou enquanto eu
sufoquei um grito.

Era um pé-de-cabra.

Imediatamente levei a mão a minha faca de bronze celestial no bolso da calça. Se eles fossem mortais não seria uma arma letal. Clarisse olhou sugestivamente para a mochila no chão onde estava a sua lança elétrica. Grover se encolheu. Corajoso, ele não?

No meio daquele falatório deles, captei algumas palavras como ladrones, jefe, e morir, essa última sendo a pior de todas. Eu não sei seria inteligente enfrenta-los naquele momento, visto que um deles estava armado.

O capitão se virou para nós sorrindo como se fossemos passageiros de um belo cruzeiro.

- Usted, ahora se levantan.

Ele sabia que não entendíamos muito bem o que ele dizia, porque naquela hora um comparsa agarrou Clarisse por um braço enquanto o outro pegava Grover. O capitão agarrou o meu braço assim como estavam fazendo com Clarisse num aperto de morte. Íamos para o convés.

O caminho foi difícil devido à escuridão e o aperto no meu braço. O capitão praticamente me arrastava pelas escadas. Era incrível a sua força, como que em alguns momentos ele me levantava só com uma mão. Durante o caminho os outros tripulantes nos observavam alguns curiosos, outros demonstrando irritação, e tinha ainda aqueles que sabiam que teriam diversão na certa.

Engoli em seco. Seja lá o que eles iriam fazer com nós três eu não queria saber.

Era uma noite quente no meio do oceano. A lua estava bem alta banhando todo o convés do navio com a luz prateada. Ao longe era possível ver pequenos cumes rochosos. Provavelmente era uma ilha. Ainda sim não fiquei mais calma.

Naquela altura, todos os tripulantes estavam próximos o suficiente para ver o desenrolar da cena.

Ainda estávamos sendo arrastados pelos comparsas e o capitão. Ouvi risadas roucas ao longe. Aproximamo-nos da Ponte de Comando onde tínhamos uma vista ampla da embarcação.

O capitão como se fosse um apresentador de TV se dirigiu aos tripulantes:

- Clandestino em nuestro barco – ele gesticulou para nós sorrindo – Probablemente espías estadunidenses...

Muitos grunhidos de raiva foram ecoados. Eu me esforçava para tentar entender o que diabos o capitão dizia. Clarisse fazia uma careta bem feia pelo aperto no braço, enquanto Grover resmungava.

-Así que amigos – continuou o capitão – Lo que hacemos com los espías ilegales?

- Muerte! – gritaram os marinheiros.

Olhei para os meus amigos que pareciam chocados. Não precisávamos de intérprete para saber o que significava.

Só tínhamos uma coisa em mente: fugir. Eles querem nos matar, certo? Mas isso não significa que vai ser fácil!

O meu olhar para os meus amigos deixava bem claro o que eu queria fazer.

E assim fizemos num milésimo de segundo depois. Nem ao menos os marinheiros tinham terminado de gritar, eu já dei um chute bem dado nas partes baixas do capitão que uivou de dor. Clarisse deu uma cotovelada na cara do comparsa que a segurava, este cambaleando segurando o rosto, enquanto Grover deu um coice na canela do marinheiro que perdeu o equilíbrio e o soltou. Quando dei por mim, Clarisse já estava com a sua lança elétrica na mão (e eu não sei como ela conseguiu abrir a mochila e pegá-la tão rápido), avançando para cima dos outros bandidos que já estavam prontos para brigar, só esperando as ordens do capitão-mor.

Grover e eu a ajudamos batendo nos marinheiros mais apressadinhos. O capitão estava ajoelhado segurando o “amiguinho” que eu havia machucado feio. Ele cuspiu no chão olhando com ódio para nós. Não havia nenhum vestígio do seu sorrisinho cínico de antes. Era pura raiva.

- Mátalos! – gritou ele – Matar a todos!

Naquele momento foi um verdadeiro caos no navio. Aqueles tripulantes que aguardavam as ordens do capitão se juntaram aos outros que já estavam em cima de nós. Eram muitos, não íamos dar conta de todos eles. Nem mesmo Clarisse com sua lança conseguiria acertar todos. Fiquei intrigada com o fato da arma dela também ferir mortais, mas como estamos falando do Deus da Guerra eu não deveria ficar surpresa. Eu brigava com os próprios punhos dando socos, chutes e nocauteando qualquer um que aparecesse no meu caminho. Grover dava coices e pontapés com seus cascos, tendo a vantagem de ter calçado os tênis e nenhum dos tripulantes perceberem que havia um garoto meio bode a bordo.

Já estávamos no meio da embarcação, perdendo já a briga. Não havia jeito, teríamos que sair dali. Aos pulos.

- Vamos para a popa! Temos que sair do navio! – gritei para os meus companheiros.

- O quê?! Você ficou louca?! – Clarisse eletrocutava dois bandidos de uma vez incluindo aquele que tinha o pé-de-cabra.

- A não, água salgada! – reclamou Grover.

- Não temos escolha! Vamos! – comandei nocauteando um tripulante feioso.

Corremos derrubando qualquer marinheiro que se colocavam no nosso caminho.

Na popa tivemos a sorte de não ter ninguém lá, porém não por muito tempo. Da Ponte de Comando até onde estávamos não era longe para atravessar contornando a chaminé, então não demoraria a toda uma tripulação raivosa de bandidos nos encurralarem.

Apreensiva, e morrendo de medo, subi na ponta da popa, uma mínima plataforma de ferro que mal dava para ficarem com os dois pés apoiados. Olhei para baixo. E voltei a olhar para cima, rapidinho. A altura era enorme do navio a água.

- Annabeth! – Grover apontou – Eles estão vindo!

- Venham os dois, se equilibrem na ponta da popa!
E que Poseidon nos proteja! Implorei.

Logo, nós três parecíamos trapezista de circo, meio agachados na ponta da popa, tentando se equilibrar. Respirando fundo, não olhando para baixo gritei:

- No três, pulamos! Um... Dois... – Clarisse lutava para se manter em pé. Grover nem tentou, do contrário cairia de volta para o navio – TRÊS!

Então, nós três pulamos num verdadeiro mergulho para a morte. Só tive tempo de fechar os olhos, enquanto eu ouvia o grito de raiva do capitão e dos tripulantes, perdendo os sentidos assim que eu atingi a água. Não vi mais nada depois disso.

Nosso cruzeiro em alto mar para o Caribe havia terminado.

*N/A: Proa: Frente do navio;
Popa: traseira do navio;
Ponte de Comando: centro de comando da navegação;
“Karaboudjan”: Peguei esse nome emprestado dos quadrinhos adaptados para desenho animado, “As Aventuras de Tintim e o Caranguejo das Tenazes de Ouro” do autor belga Hergé. Quem leu ou assistiu a esse episódio vai perceber que é um pouco parecido com este capítulo.

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